Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, junho 12, 2008

Celso Ming - A inflação assusta



O Estado de S. Paulo
12/6/2008

Os números que medem a inflação vieram devastadores.

O IPCA, que serve de referência para a definição dos juros básicos (Selic), excedeu todas as expectativas. Avançou 0,79% em maio, o que gera uma alta acumulada no ano (até maio) de 2,88% e, em 12 meses, de 5,58%. Só para relembrar, a meta da inflação é 4,50%, com um erro admitido de 2 pontos porcentuais, tanto para cima como para baixo. Esta foi a inflação mensal mais alta desde abril de 2005.

O IPC da Fipe, que mede o custo de vida em São Paulo, foi além. Nas quatro semanas terminadas na semana passada, subiu 1,30%. E, em sua primeira prévia do mês, o IGP-M saltou para 1,97%.

Até mesmo o Banco Central, que por dever de ofício tem de estar sempre em estado de alerta contra a inflação, foi passado para trás nas suas estimativas. Em abril, quando começou a puxar pelos juros, deixara claro que trataria mais de prevenir do que de remediar. Seria um movimento de alta dos juros de ciclo curto, porque a inflação seria ferida de morte ainda no ovo.

A retórica do ministro da Fazenda, Guido Mantega, põe ênfase em que o principal responsável pela escalada é a alta dos preços dos alimentos. E, de fato, o IBGE confirmou ontem que 0,43% desse 0,79% que foi a inflação de maio se deve ao comportamento dos preços no varejo de alimentos. Mas esse é um argumento que puxa para a política do não-há-o-que-fazer, sob a justificativa de que juros altos não alcançam as cotações das bolsas internacionais, onde se formam os preços das commodities.

O problema é que a esticada dos alimentos está contaminando os outros segmentos, principalmente os serviços (veja o Confira). E, mais que tudo, seja qual for a origem ou a classificação, seja ela de oferta ou de demanda, a inflação corrói o orçamento do consumidor, especialmente o do mais pobre, e isso produz outras conseqüências, especialmente políticas.

A despeito de tudo quanto se falou em contrário, o Banco Central continua sozinho no contra-ataque. A elevação do superávit primário de 0,5% do PIB é, de longe, insuficiente para derrubar a inflação. Não houve redução das despesas públicas. Esse superávit extra é apenas uma fração do que o setor público está arrecadando a mais. Isso significa que a gastança continua produzindo mais consumo e mais inflação.

E aí vem a objeção de sempre: se essa inflação provém da alta dos alimentos que, por sua vez, é determinada lá fora, então não se pode dizer que sejam as despesas públicas que a estão produzindo. Ora, isso é o mesmo que dizer que o pneu do carro, que estava careca, furou porque rodou sobre uma superfície de cascalhos pontudos. Enfim, não dá para ignorar a alta dose de inflação de demanda.

No entanto, se é para reverter o jogo devastador dos preços, não basta que o Banco Central aperte ainda mais o torniquete dos juros ou que deixe o dólar perder preço no câmbio interno.

Rever para cima a meta de inflação para que os juros subam menos é tapar o sol com peneira. Não alivia as agruras do orçamento do povão. E, se é para produzir efeitos perceptíveis, será necessário que o governo derrube mais corajosamente suas despesas correntes.

Espalhando - A tabela mostra não só como a inflação está concentrada nos alimentos, mas também como se vai difundindo pelos outros setores que compõem o orçamento familiar.

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