Ontem, o secretário do Tesouro americano, Henry Paulson, avisou que uma intervenção para puxar o dólar para cima "não está descartada".
Também ontem, o Wall Street Journal, principal diário de Economia e Finanças do mundo, publicou matéria mostrando que, de dezembro de 2002 até hoje, o dólar perdeu nada menos que 36% do seu valor diante do euro (veja gráfico). Se os Estados Unidos impusessem uma tarifa alfandegária de 50% sobre as importações do resto do mundo, seria um pandemônio político, pois seria entendido como protecionismo comercial inaceitável. No entanto, a desvalorização do dólar provoca distorção equivalente.
E essa não é a única. Um dólar fraco aumenta em dólares os preços dos produtos importados pelos americanos e tende a provocar compensações de alta nas cotações das commodities - a começar pelas do petróleo -, e a produzir inflação nos Estados Unidos.
Essa situação encoraja a troca de moeda como reserva de valor. Não foi só a top model Gisele Bündchen que tratou de defender seus contratos fixando-os em euros. Até mesmo os bancos centrais, que estocam reservas, já fazem o mesmo, o que acentua a fragilidade da moeda americana.
A idéia de uma intervenção coordenada de grandes bancos centrais para resgatar o valor do dólar é lembrada sempre. Mas aí está uma operação difícil de levar adiante. Seriam necessárias compras gigantescas de dólares pelos bancos centrais, num mercado que negocia trilhões por dia. Por isso, essas megaoperações têm mais de retórica do que de possibilidade prática.
A questão de fundo é a desordem monetária cujo processo começou em 1971, quando o presidente americano Richard Nixon acabou com a paridade entre o dólar e o ouro acertada em Bretton Woods (1944), que definiu a nova ordem monetária global. E tem a ver com a indisciplina fiscal dos Estados Unidos.
Com flutuações dessa magnitude, as transferências de valor e de renda são enormes e ficam imprevisíveis as decisões de longo prazo, que não atingem apenas governos e grandes corporações, mas também o patrimônio trilionário dos fundos de pensão.
A necessidade de um reequacionamento da ordem monetária global é discussão que engrossa ano a ano. O Prêmio Nobel de Economia de 1999, Robert Mundell, uma das maiores autoridades mundiais em Moeda, há anos vem avisando que é inevitável a convergência global para apenas algumas moedas, fato que reduziria substancialmente as flutuações.
Em novembro passado, lembra o Wall Street, Edouard Balladur, primeiro-ministro da França no governo Mitterrand, publicou trabalho em que defende a união monetária entre Estados Unidos e Europa. São projetos que implicam delegação de soberania monetária a um banco central independente e aí é preciso saber até que ponto as forças globais estariam dispostas a topar a empreitada.
Talvez também nessa matéria as coisas precisassem piorar muito para só então começarem a melhorar.
Piorando - Continua se deteriorando a expectativa do mercado sobre a inflação. Há nove semanas, o mercado apostava em inflação de 4,50%. Na semana passada, já elevava as apostas para 5,55%. (Números da Pesquisa Focus, do Banco Central.)
CORREÇÃO
Na coluna de sábado, foi Marcelo Ribeiro, estrategista da Pentágono Asset Management, quem afirmou: "Aqueles que estão inflando a bolha das commodities e do petróleo estão cantando para Bernanke a música de Pat Benatar Hit me with your best shot", e não Marcelo Salomon, do Unibanco.