O arquiteto mexicano Ricardo Legorreta
espalha pelo mundo uma obra inspirada
na cultura e nos valores de seu país
Thomaz Souto Corrêa
Jose Ignacio Gonzales Manterola | Rafa Rivas/AFP |
CONJUNTO PLAZA JUAREZ No novo centro histórico da Cidade do México, Legorreta fez o monumental conjunto que inclui um parque atrás de um antigo convento, hoje Templo de Corpus Christi |
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Talvez nenhum outro grande arquiteto contemporâneo tenha uma obra tão inconfundível quanto a de Ricardo Legorreta, porque ninguém usa tanto a cultura de um povo como referência para criar. As cores vivas das casas dos pueblos, a grandiosidade das ruínas maias e astecas e a amplidão geográfica são constantes na obra de um arquiteto que define a própria profissão como sendo a de "fazedor de sonhos". Os elementos principais na obra de Legorreta são o muro e a parede, não só porque protegem, mas porque delimitam e definem o espaço; as proporções, no contraste dos grandes espaços com os pequenos cantos; e a luz. "Minha obra é inteiramente repleta de luz", diz ele. "Esses são os elementos físicos. Os outros são a emoção e o mistério. Arquitetura sem emoção não é arquitetura. Arquitetura não se define com palavras, transmite-se com emoções. Um espaço pode ser lindo, mas, se não ilumina o espírito, não é arquitetura. Eu adoro o mistério, não só na arquitetura, mas na vida. Gosto de descobrir. Ir a algum lugar sem saber o que vou fazer ou o que esperar daquele lugar. Não existe uma arquitetura genuína sem o mistério de descobrir os espaços pouco a pouco, de vê-los cada vez de uma maneira diferente."
Lourdes Legorret |
CAMPUS DA UNIVERSIDADE DE SÃO FRANCISCO O átrio do centro de convívio da universidade californiana tem o teto transparente, que deixa passar luz natural para formar um ambiente agradável bem no centro do campus. Dali são acessados os outros edifícios do conjunto universitário |
Ricardo Legorreta tem 76 anos e vive na Cidade do México. Está no Brasil para palestras e lançamento na Bienal do Livro no Rio de Janeiro e em São Paulo da obra Ricardo Legorreta – Sonhos Construídos (coleção Educação do Olhar; Be Editora; 61 páginas; 47,50 reais). Filho de banqueiro, Legorreta nem sempre soube que queria ser arquiteto. Acha hoje que foram as viagens feitas com o pai pelo interior do México, vendo os pequenos pueblos, as haciendas de tradição espanhola, as cidades históricas e as ruínas dos templos pré-colombianos, que despertaram nele a vocação que o levou à Universidade Nacional Autônoma do México, para estudar arquitetura. Do pai aprendeu também noções de disciplina pessoal e de responsabilidade social. Reconhece outras duas influências relevantes em sua carreira, dois arquitetos modernistas mexicanos. Um é José Villagrán, introdutor do modernismo na arquitetura mexicana, com quem Legorreta trabalhou durante doze anos e de quem chegou a ser sócio. Dele, assimilou o rigor na construção de uma obra, a disciplina, a pontualidade e a ética, valores – segundo ele – não muito comuns no México daquele tempo.
A outra influência forte veio de Luis Barragán, até então o grande mestre da combinação de luz e espaço, "a inspiração para a privacidade, o humanismo, o mistério e a cor", lembra Legorreta. Seu primeiro contato com o mestre foi quando perguntou a ele o que achava de um projeto que acabava de inaugurar. "A arquitetura é linda", disse Barragán, "mas o paisagismo é lamentável". A partir desse momento, a natureza passou a ser parte integral das obras de Legorreta. É mais um dos elementos que tornaram sua arquitetura tão rica. O verde aparece sempre, seja ampliando a vista de janelas, portas e terraços, seja nos recortes que faz nos muros com o fim explícito de mostrar jardins floridos, gramados e árvores, que funcionam como esculturas, plantadas em cantos inesperados, cercados de paredes sempre pintadas de cores muito fortes e muito vivas.
Fotos Reprodução |
HOTEL CAMINO REAL Primeira obra de relevo do arquiteto, o hotel foi pensado para ter pátios abertos com fontes e espelhos-d'água ligando as amplas áreas públicas |
Sua primeira obra de impacto data de 1968, quando projetou o Hotel Camino Real em um terreno de 30.000 metros quadrados, em pleno centro da Cidade do México. Indo contra a convenção da época, de que os hotéis tinham de ser verticais, Legorreta fez um projeto horizontal. "A extensão de terra é uma característica mexicana. Queríamos fazer um hotel revolucionário, que mostrasse os espaços, as cores, a luz e o romantismo mexicano." Hoje, entre casas, fábricas, museus, universidades, escritórios, escolas, hotéis e praças públicas, suas obras estão – além de no México – em nove países de três continentes. É membro honorário de diversos conselhos de instituições ligadas às artes, como o do Museu de Arte Moderna de Nova York. Participa de júris de prêmios internacionais, tendo sido jurado do Prêmio Pritzker, considerado o Oscar da arquitetura. Premiado mais de trinta vezes no mundo inteiro, especula-se que seria um dos próximos ganhadores do Pritzker.
CASA DE RICARDO MONTALBÁN O ator queria uma casa em Los Angeles que mostrasse aos americanos os valores da cultura mexicana. Foi a obra que projetou Legorreta nos EUA |
CASA EM SANTA FÉ Muita luz natural e aberturas para integrar a casa à paisagem foram os traços marcantes nessa obra. A água é, como sempre, elemento indispensável |