Artigo - Rolf Kuntz* |
O Estado de S. Paulo |
22/3/2007 |
A maior privatização da história do Brasil, a do governo brasileiro, está sendo mais trabalhosa do que parecia há algumas semanas, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva iniciou o loteamento de cargos entre os partidos da base governista. O beneficiário mais ostensivo, o PMDB, dificultou o leilão, oferecendo ao presidente um nome sem condições de ocupar o Ministério da Agricultura. A transação fracassou não porque houvesse dúvida sobre a competência do indicado. Esse detalhe não foi discutido. O partido simplesmente apresentou o nome, com apoio dos governadores do Paraná e de Mato Grosso do Sul, e o presidente o aceitou, sem sequer verificar sua folha corrida. Só recuou porque surgiram informações inquietantes sobre processos no Supremo Tribunal Federal. E se não houvesse os tais processos? Nesse caso, os brasileiros teriam hoje um ministro da Agricultura escolhido não pelo presidente da República, mas por um grupo de caciques de um partido da base. O chefe de governo simplesmente passou a um grupo aliado a responsabilidade por uma decisão de enorme importância para o País. A claque do presidente poderá contestar esta avaliação: afinal, argumentarão, ninguém seria nomeado sem o seu consentimento. Será uma defesa tão pífia quanto o critério efetivo de nomeação. Se o presidente estivesse de fato empenhado em escolher os melhores, não teria escorregado de forma tão feia nesse episódio. O fato é inegável: o Ministério foi composto, até agora, apenas com base no critério da acomodação de interesses políticos, entendidos, aqui, no sentido menos nobre dessa expressão. Em nenhum momento o presidente da República se mostrou empenhado em descobrir, com a colaboração do PMDB, um nome reconhecido publicamente por suas contribuições ao debate dos grandes temas da política agrícola. O ex-ministro Roberto Rodrigues tinha essa qualificação. Seu sucessor, Luis Carlos Guedes Pinto, é um técnico de boa reputação, com longa experiência na administração pública. Há quem dele discorde ideologicamente, mas todos o respeitam como um interlocutor digno de ser levado a sério. Depois do primeiro tropeço, o presidente manteve o critério. Apenas se preparou, segundo o noticiário dos dias seguintes, para conferir com maior atenção a ficha do próximo indicado. Mantido o critério, a conversa degenerou de uma vez e a bancada ruralista decidiu intervir, cobrando a indicação de um nome de sua preferência. Péssima notícia para quem acompanha as peripécias da agricultura brasileira. Política agrícola, entendida como função de interesse público, nunca foi assunto prioritário para essa bancada. Sua atividade mais notória tem sido, há muito tempo, extrair do governo, periodicamente, a renegociação das dívidas de grandes fazendeiros. Os pequenos e médios acabam levando as migalhas. Entram na história para dar à manobra uma aparência de legitimidade. Privatização é o nome correto para esse loteamento de cargos, porque o seu objetivo principal é a distribuição de benefícios - eleitorais ou de outra ordem - para partidos, grupos e indivíduos. Em nenhum momento se falou na formação de um time com qualificações especiais para executar um plano de governo. Não entrou em pauta nenhuma grande reforma, nenhum objetivo bastante ambicioso e nobre para justificar, por exemplo, uma reorganização da máquina pública. Falou-se em criar uma secretaria de portos, mas apenas para acomodar mais um nome indicado por um partido da base. Isso talvez possa explicar a dificuldade do presidente na busca de um nome para substituir o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Luiz Furlan. Nesse caso, o governo teve a iniciativa de sondar alguns nomes de peso, mas sem sucesso nas primeiras tentativas. Não é fácil encontrar pessoas de bom currículo para embarcar na aventura, quando o governo parece escolher, de forma ostensiva, o caminho da mediocridade. Novos ministros poderão ser anunciados até amanhã, segundo informou ontem o chefe de Gabinete da Presidência da República, Gilberto Carvalho. Com sorte, poderá aparecer algum nome de peso. Se isso ocorrer, não será porque o presidente da República tenha seguido o critério da excelência. Na melhor hipótese, será formado um Ministério muito desigual, com alguma ilha de qualidade num arquipélago de incompetência. O presidente Lula, até agora, age como se isso fosse problema dos aliados, não dele. Governo de coalizão é outra coisa. Mais precisamente, governo é outra coisa.
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Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, março 22, 2007
A privatização do governo
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