O Globo |
20/3/2007 |
A escolha desastrada do deputado Odílio BalbinotPublishti para o Ministério da Agricultura teve o dom de desmistificar a um só tempo uma presumida esperteza presidencial a liderar o processo da montagem ministerial, e uma suposta unidade peemedebista que apontava para um futuro mais afirmativo da legenda no jogo político brasileiro. O que pareceu em determinado momento uma ardilosa estratégia do presidente Lula para fazer uma equipe a seu gosto, sem a interferência partidária, se transformou, pelos seus gestos e falas, numa verdadeira denúncia contra a maneira como lida com as coisas do governo. Quando diz que com a Saúde e a Educação não se pode brincar ou partidarizar, permite que se presuma que em outras áreas a partidarização não é séria. E, antes que se diga que essa presunção revela apenas má-vontade com o presidente, é preciso ficar claro que o método de governar em campanha permanente, se o coloca nos holofotes que garantem popularidade, também expõe suas deficiências. Quando diz que os ministros são verdadeiros heróis por aceitarem trabalhar no governo por míseros R$8 mil, está afrontando a grande massa do povo brasileiro, muitos dos quais votaram nele, que vê os políticos se digladiarem por um cargo que deve ter outros atrativos que não o salário. E até que o presidente tem razão, o salário de ministro é indigno de um alto executivo, mas ele finge não saber que a grande maioria dos indicados ou é de milionários, ou de servidores de carreira, que têm outras vantagens. Além disso, muitos fazem parte de conselhos de estatais ou de empresas com participação do governo, e por isso recebem salários de altos executivos. Se, no primeiro governo, Lula criou diversos ministérios apenas para abrigar companheiros derrotados nas eleições, agora ele monta e desmonta secretarias, convida e desconvida ministros, sem que em nenhum momento esteja em discussão um projeto de governo. O apagão aéreo continua atazanando a vida dos brasileiros, e o presidente pensa ora em transferir a Infraero para o Turismo, para fortalecer a pasta que ofereceu à ex-prefeita Marta Suplicy (ou para atrapalhar sua gestão), ora em colocá-la numa secretaria de portos e aeroportos para contentar o PSB de Ciro Gomes. Nesse caso, desagrada aos aliados do PR, que ficarão com as estradas esburacadas do Ministério dos Transportes, mas querem também os aviões atrasados da Infraero por alguma razão que somente uma análise no Orçamento da União e do PAC pode explicar. Quanto ao novo PMDB, na hora das definições volta a ser o velho partido-bonde, onde sempre cabe mais um, com poderes regionais se sobrepondo a um programa nacional, e com critérios de escolha que passam longe de uma ética partidária uniforme. O presidente recém-reeleito, autor dessa mágica besta que mostrou ser a união partidária, abandonou logo no primeiro momento o seu indicado para a Agricultura simplesmente porque não era uma indicação do partido, mas de um governador, Requião, do Paraná. Temer foi logo avisando que o partido tinha uma lista de substitutos para o cargo, lista tão eclética que revela o verdadeiro caráter do partido. Nela cabem tanto o recém-chegado Delfim Netto, que foi ministro da Agricultura no governo Figueiredo, quanto o deputado Waldemir Moka, que na campanha classificou Lula de "a praga da Agricultura". Um presidente que aceita nomear um ministro que só se referia a ele com palavras de baixo calão, como é o caso do deputado Geddel Vieira Lima, e aceita receber uma lista em que está o nome de quem o considera uma praga, não está apenas engolindo sapos para formar uma coalizão digna do nome, como quer parecer. Está desmoralizando o cargo de presidente da República em troca do apoio de um partido que não tem o cuidado de verificar os antecedentes de seus indicados, nem a fidalguia de poupar o presidente de um vexame. Sobre a nova lista, o presidente do PMDB disse candidamente que, antes de apresentá-la ao Planalto, perguntou aos alistados se tinham algum problema com a Justiça "para que não sejamos surpreendidos", atitude básica de quem tem um mínimo de responsabilidade para indicar ministros. Não é à toa que a cada dia surgem mais indicações de que o governador de Minas, Aécio Neves, se é que um dia esteve tentado a mudar de legenda para disputar a Presidência da República em 2010, já não tem mais o PMDB em seu horizonte. Assediado pelo próprio Lula, e sondado pelo presidente do Senado, Renan Calheiros, para ser o candidato de consenso do partido, Aécio já deve ter notado que no PMDB, se até o passado é incerto, o que dizer do futuro? Ontem mesmo, ele falou mais diretamente na possibilidade de ser candidato a presidente: "Se um dia, não sei quando, as circunstâncias políticas construírem um consenso em torno do meu nome, certamente tenho que estar preparado". Mas afastou as especulações de mudança de partido, dizendo-se "absolutamente à vontade" no PSDB. Quase três meses depois da posse, Lula continua sem conseguir montar seu segundo governo que, embora formado por um agrupamento de 11 legendas, mostra-se potencialmente desunido, e será o mais fragmentado de quantos governos já tivemos recentemente. Nunca na história deste país um governo se pareceu tanto com um saco de gatos quanto este que não consegue começar. Por problemas técnicos, a coluna de sábado, dia 17, não foi publicada em parte da edição, e só entrou no Globo Digital depois de meio-dia. Os leitores que quiserem lê-la, muitos dos quais enviaram mensagens, poderão fazê-lo no Globo Digital, marcando a data na seção "outras edições". |
Entrevista:O Estado inteligente
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