Ao revelar, durante café da manhã com jornalistas na quinta-feira, no Palácio do Planalto, a “inveja” que sentiu da Índia quando soube, em 2004, que o país tinha US$ 100 bilhões em reservas cambiais, e o “orgulho” de termos alcançado a meta este ano, o presidente Lula estava revelando quem é o responsável pelo “conservadorismo” da política econômica, que na verdade é uma decisão política de não arriscar para garantir a estabilidade.
Era a isso que se referia quando disse que a equipe econômica estava “blindada” pelo seu próprio sucesso, no mesmo dia em que os jornais alardeavam o “pibinho” de 2,9% do ano passado.
Estava também ali confirmada a permanência de Henrique Meirelles à frente do Banco Central, responsável pelo que realmente interessa para Lula: a inflação sob controle, que turbina os efeitos de programas assistencialistas e o poder de compra do salário mínimo.
Para quem disse, na mesma entrevista, que a indicação do economista Paulo Nogueira Batista Júnior como representante no FMI tem como objetivo tentar mudar os procedimentos daquele organismo internacional, o presidente Lula estava praticando seu jogo preferido, a incongruência.
O acúmulo tão espetacular de reservas cambiais é uma orientação endossada pelo próprio FMI, e tem nome e sobrenome: a regra de Guidotti-Greenspan, segundo a qual países deveriam ter reservas suficientes para cobrir toda a dívida externa vincenda em 12 meses.
Como a dívida brasileira no próximo ano pode chegar no máximo entre US$ 40 bilhões e US$ 50 bilhões, já estamos com mais que o dobro do necessário. Mas essa cautela do Banco Central, que muitos consideram exagerada, é a norma dos países emergentes.
A China já acumula um nível de reservas cambiais superior a US$ 1 trilhão, e outros países, de economias semelhantes à brasileira em termos de PIB, também acumulam reservas expressivas: Coréia do Sul, com US$ 217 bilhões; Rússia, com US$ 206; e Índia, já com US$ 145 bilhões.
O problema é que o custo dessa política é muito alto.
Para comprar dólares no mercado, o Banco Central obtém recursos com o lançamento de títulos da dívida pública, que normalmente remuneram à base da taxa básica da economia, a Selic, fixada hoje em 13% ao ano. Como nos Estados Unidos o juro está em 5,25%, o chamado “custo de manutenção da dívida” é estimado por economistas em cerca de 0,8% do PIB. O gasto do Tesouro com a manutenção de reservas na casa dos US$ 100 bilhões seria entre US$ 7 bilhões e US$ 8 bilhões.
O economista e professor de Harvard Dani Rodrik, em um texto sobre os custos sociais da acumulação das reservas cambiais, ressalta que, desde os anos 90 do século passado, os países emergentes têm aumentado a acumulação de reservas internacionais em níveis superiores ao padrão internacional, que começou sendo o equivalente a três meses de importações e hoje está baseado na tal regra Guidotti-Greenspan.
O próprio Henrique Meirelles já chamou a atenção para o fato de que o Brasil tem reservas hoje por volta de 10% do seu PIB, e existem países que têm até 30%, o que indicaria que o país ainda pode avançar mais na estratégia de se blindar contra crises externas.
No limite, o Brasil poderia ter reservas de cerca de US$ 300 bilhões.
Mesmo os países africanos, entre os mais pobres do mundo, aderiram de forma incondicional à regra Guidotti-Greespan-FMI, e vêm mantendo reservas em montantes correspondentes a oito meses de importações, ressalta uma análise do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) baseada no estudo do economista Dani Rodrik.
Para ele, o custo social de manutenção dessas reservas internacionais excedentes chega a cerca de 1% do PIB anual do conjunto dos países em desenvolvimento.
Ao afirmar que “as nações em desenvolvimento estão pagando um preço extremamente elevado por jogar conforme as regras da globalização financeira”, o economista de Harvard ressalta que esse gasto representa muito mais do que é investido em programas de combate à pobreza, como no caso do México, que gasta o equivalente a 0,2% do seu PIB.
No caso brasileiro, o principal programa do governo, o Bolsa Família, representa um investimento de cerca de 0,5% do PIB. O economista Dani Rodrik diz que os países emergentes radicalizam na acumulação de divisas porque uma “intervenção no mercado”, na forma de taxação de fluxos de capitais de curto prazo, adquiriu uma péssima reputação no mundo financeiro.
Os que defendem essa política dizem que o seu custo, na verdade, se deve aos altos juros pagos pelos países emergentes, e citam o caso da China, que tem 70% de suas reservas cambiais em dólar e paga juros inferiores aos recebidos pela aplicação das reservas, que são fundamentais para a economia americana.
Mas, paradoxalmente, um nível de reservas alto como o atingido pelo Brasil neste momento pode ajudar na redução das taxas de juros internas, já que protege os países de turbulências do mercado internacional, dando-lhes mais segurança para a formulação das políticas internas. No momento em que esteve mais vulnerável a crises internacionais, o Brasil chegou a ter apenas US$ 16 bilhões de reservas.
A recente queda da Bolsa de Xangai, cujos efeitos ainda se fazem sentir em todo o mundo, mostrou, no entanto, que essa proteção não é inexpugnável. No mesmo momento em que o Brasil alcançava a marca histórica de US$ 100 bilhões de reservas cambiais, o risco-país teve uma subida de quase 9% num dia, devido à crise financeira internacional.
Entrevista:O Estado inteligente
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