artigo -José Pastore |
O Estado de S. Paulo |
20/3/2007 |
O Brasil tem sido assolado por uma avalanche de greves no setor público. Entre 2003 e 2006 ocorreram mais de 500 paralisações, a maioria afetando serviços essenciais e pondo em risco a sobrevivência, a saúde e a segurança das pessoas, além de causar graves prejuízos econômicos. A paralisação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), em 2006, provocou uma perda estimada em US$ 700 milhões e impediu a distribuição de medicamentos de uso contínuo. A greve da Receita Federal, de 30 dias, acarretou um prejuízo de US$ 750 milhões para a Zona Franca de Manaus. A paralisação dos funcionários do INSS, por 74 dias, deixou aposentados, pensionistas, gestantes e pessoas doentes à míngua. A greve dos auditores da Receita Federal contra a “Super-Receita” impediu a liberação de quase 300 mil pedidos de certidão negativa, bloqueando negócios em todo o País. A greve da Polícia Federal, em 2004, provocou graves transtornos para a obtenção de passaportes, embarque internacional, liberação de bagagens, etc. - sem falar nas greves dos portos, médicos, enfermeiros, serventuários da Justiça e outras. As greves do setor público têm sido tratadas com grande complacência. Em geral, os grevistas recebem os dias parados, não repõem as horas não trabalhadas e não respondem por nenhum prejuízo. Em 2006, o ministério Público de São Paulo estipulou uma multa de R$ 70 milhões aos metroviários, que, ao fazerem uma greve política, causaram grandes danos aos 3 milhões usuários, sem contar o congestionamento do trânsito na cidade de São Paulo de 200 quilômetros. Ao que consta, a multa nunca foi paga. A Constituição Federal (artigo 37) prevê uma lei especial para disciplinar tais greves. dormem na Comissão do Trabalho da Câmara dos Deputados dezenas de projetos de lei nesse campo. Em 2001, depois de uma prolongada greve no INSS e nas universidades federais, o presidente Fernando Henrique Cardoso enviou ao Congresso Nacional um projeto para disciplinar a greve no setor público, que foi bombardeado e engavetado pelo Partido dos Trabalhadores (PT).Agora o PT é governo e o ministério do planejamento se apronta para abrir a discussão sobre esse assunto. Isso é o que fizeram há muito tempo as sociedades democráticas. Se, de um lado, não se pode obrigar as pessoas a trabalharem contra a sua vontade, de outro, é inadmissível que elas causem impunemente prejuízos irreparáveis à economia e à comunidade. No mundo inteiro, tais greves são regidas por procedimentos especiais nos seguintes serviços: 1) tratamento e abastecimento de água; 2) produção e distribuição de energia elétrica, gás e combustíveis; 3) atendimento ambulatorial de emergência e assistência médico-hospitalar; 4) distribuição e comercialização de medicamentos e alimentos; 5) funerários; 6) transporte coletivo; 7) captação e tratamento de esgoto e lixo; 8) telecomunicações; 9) guarda, uso e controle de substâncias radioativas, equipamentos e materiais nucleares; 10) processamento de dados ligados a serviços essenciais; 11) controle de tráfego aéreo; e 12) compensação bancária. Essas atividades nunca param totalmente. Exigem-se serviços mínimos. A discussão da matéria envolverá várias questões importantes, dentre as quais, destaco: 1) quem vai decretar e assumir a responsabilidade da greve - o sindicato ou os trabalhadores?; 2) a votação nas assembléias sindicais será por voto secreto ou na base do grito?; 3) quais serão os quóruns mínimos?; 4) funcionários não filiados ao sindicato poderão participar e votar?; 5) qual é a antecedência que será dada à comunidade e às autoridades?; 6) quem vai se responsabilizar por manter os serviços mínimos?; 7) o que fazer quando isso não for cumprido?; 8) os órgãos públicos poderão contratar pessoal para garantir os serviços mínimos?; 9) e quando não existir funcionários especializados?; 10) a violação das regras será de responsabilidade do sindicato ou dos grevistas?; 11) quem julgará e aplicará as sanções? No Brasil, há que se resolver ainda a questão da negociação coletiva no setor público. Por força de orçamentos aprovados pelas casas legislativas e da Lei de Responsabilidade Fiscal, os governantes não podem conceder o que não têm. Como fazer os funcionários entenderem que, para eles, os limites de concessão são mais estreitos do que no setor privado? Será uma discussão e tanto e que já devia ter ocorrido há 50 anos. Mas tudo bem. Antes tarde do que nunca.
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Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, março 20, 2007
Greves no setor público - o que fazer?
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