Entrevista:O Estado inteligente

domingo, março 18, 2007

Giannetti: EUA acertam em manter tarifa do etanol


Sonia Racy

O trader Roberto Giannetti da Fonseca defende a manutenção da taxa de importação americana para o etanol. “Isso desestabilizaria os dois maiores produtores do mundo, Brasil e EUA”, explica o futuro novo produtor de etanol na Nigéria.

O país africano, tropical, vai produzir etanol substituindo parcialmente a importação de gasolina, somando 10% de álcool à gasolina local. E foi neste filão que entrou Giannetti da Fonseca, unindo-se a sócios nigerianos, criando a Ethanol Industries of Nigeria. Vão construir duas plantas de etanol para produzir 100 mil litros/dia, cada uma, a partir de 2010. Enquanto isso, o Brasil vai exportar etanol para lá estruturando um mercado de 10 bilhões de litros de gasolina por ano.

Aqui vão trechos da sua entrevista:

O mundo hoje fala sobre o etanol. Foi o Brasil que inventou a tecnologia. Se não nos cuidarmos, os países de Terceiro Mundo vão passar a nossa frente?

O Brasil é o único país que tem produzido e utilizado o etanol nos últimos 30 anos de maneira intensa. Assim, alcançamos enorme vantagem comparativa. É claro que, com o reconhecimento, pelos EUA, do valor do etanol como combustível renovável prioritário, temos urgência em avançar na pesquisa tecnológica do etanol de segunda geração, o etanol celulósico, se não quisermos perder a liderança. A princípio, ele poderá ser produzido daqui a 5 ou 10 anos, a partir de qualquer biomassa orgânica disponível, como restos de madeira, bagaço de cana, folhagens, excremento de animais, e até lixo orgânico, portanto em grande volume e baixo custo. Será uma verdadeira revolução energética.

A resistência dos EUA em baixar a tarifa de importação do etanol para o Brasil atrapalha?

Em tese toda tarifa excessiva e ilegítima deve ser combatida, mas em alguns casos o pragmatismo sugere exceções, como é o caso. Produzir etanol a partir do milho é extremamente ineficiente em todos os aspectos, mas o mal está feito, e agora se torna um mal necessário, pelo menos por algum tempo. Explico: o consumo americano de etanol hoje é algo como 20 bilhões de litros devendo superar 30 bilhões até 2010. A produção local cresce simultaneamente ao consumo, havendo eventuais déficits de produção de até 15% ao ano. No Brasil, produziremos em 2007 cerca de 20 bilhões de litros. Ou seja, o equivalente ao atual consumo americano. Caso esta tarifa fosse eliminada agora, com os preços do etanol nos EUA bem superiores aos brasileiros, em tese, haveria um súbito surto de exportação para lá e um desabastecimento significativo do mercado brasileiro, até que os preços de ambos os mercados se tornassem equivalentes. Isto seria um caos para a recém-criada indústria do etanol, desestabilizando os dois maiores mercados mundiais que produzem hoje 70% do etanol no mundo. Vamos ter que conviver, por algum tempo, com esta tarifa de US$ 0,54 nos EUA, até que ajustes competitivos sejam feitos nos EUA e que as novas tecnologias de segunda geração comecem a ser implantadas por lá e por aqui. O máximo que podemos esperar no momento é o surgimento de uma cota tarifária zero, adicional para algum volume de etanol a ser importado pelos EUA para abastecer eventuais déficits de produção local resultantes do galopante aumento de consumo do mercado americano. Desestruturar o emergente mercado internacional de etanol a esta altura seria um desastre de grandes proporções.

O Proálcool afundou por falta de produção, não vai acontecer o mesmo agora? Como fazer para garantir o escoamento? A Petrobrás promete um duto gigante, de US$ 1 bilhão. A iniciativa privada se sente à vontade em ficar nas mãos da Petrobrás que terá o monopólio do transporte?

O investimento em dutos, terminais de estocagem e de embarque é absolutamente necessário para garantir nosso fluxo competitivo. Reconhecidamente, a Petrobrás é a única empresa brasileira que dispõe de larga experiência na movimentação de grandes volumes de granéis líquidos. Mas o modelo ideal é uma parceria entre os produtores, tradings brasileiras especializadas e a Petrobrás. Estaríamos potencializando nossa capacidade de investimento e de gestão e assegurando às partes envolvidas um equilíbrio institucional na operação logística, sem privilégios nem monopólios. Creio que o bom senso vai prevalecer e em breve estaremos assistindo à criação desses empreendimentos logísticos.

Qual o papel das tradings neste processo?

O setor sucroalcooleiro, com mais de 350 produtores, é extremamente disperso. Portanto, organizar a oferta exportadora, oferecendo soluções logísticas, financeiras, e comerciais, é uma função essencial para o bom desempenho do setor. Esta função poderá ser exercida alternativamente pela Petrobrás, tradings multinacionais ou brasileiras. Para o País e para a economia de mercado, a alternativa das tradings brasileiras seria a melhor, possivelmente em parceria com a Petrobrás quando se mostrar necessário, como no caso do fornecimento ao Japão e à Nigéria, por exemplo.

E-mail: sonia.racy@grupoestado.com.br

Arquivo do blog