Panorama Econômico |
O Globo |
14/11/2006 |
Até a Vale anda reclamando do câmbio. E a Vale é a empresa que tem condição de suportar o câmbio baixo, porque o minério de ferro teve forte aumento de preço. O que fazer a respeito? Tudo já foi feito. O câmbio flutua, o Banco Central acumulou reservas, a lei cambial mudou permitindo que parte dos dólares fique no exterior, os juros caíram e as importações aumentaram. Os remédios recomendados por especialistas foram usados. E agora? Para o câmbio baixo do Plano Real, a solução foi deixá-lo flutuar. Isso aconteceu de forma traumática em 1999. Para a queda do dólar dos últimos anos, várias sugestões foram apresentadas. O Banco Central deveria intervir e tirar o dólar excedente do mercado, reduzir dívida externa e acumular reservas. Isso já foi feito. Segundo o economista Luiz Schymura, na Carta do Ibre de novembro, o BC no governo Lula reduziu a dívida externa pública líquida em US$74 bilhões. As reservas esta semana chegarão a US$80 bilhões; estavam US$53,8 bilhões em dezembro do ano passado. Uma solução pedida pelos defensores de um câmbio mais alto foi a de reduzir os juros. Eles continuam altos, mas já caíram seis pontos percentuais, e nada aconteceu. A Fiat disse, no começo de 2005, que tem potencial para exportar 120 mil veículos, mas só exportou 98 mil e, este ano, o resultado será 3% menor, por causa do câmbio. A Vale do Rio Doce aumentou em US$500 milhões seus custos este ano por causa do câmbio. - Nossas receitas são em dólar, mas os custos são em reais e aumentam com a valorização - diz Tito Martins, diretor da Vale . Ele acha que a solução é reduzir mais os juros. A queda dos juros derrubaria o câmbio se o país tivesse muito capital especulativo. Mas o fluxo é pequeno. Schymura diz que a alta do real foi conseqüência da mudança da exportação, e não decorrente da entrada de capital especulativo. O economista Nathan Blanche, da Tendências, especialista em câmbio, diz também que não existe capital especulativo no momento; a abundante oferta de dólares no mercado é basicamente função do comércio exterior. Ou seja, se os juros continuarem a cair, isso não vai afetar a taxa cambial. A Carta do Ibre diz que, de setembro de 2005 a agosto de 2006, houve saída líquida de recursos investidos em renda fixa de US$355 milhões. O Ministério da Fazenda acreditou que a mudança na legislação cambial que permitiu às empresas exportadoras deixar mais dólares no exterior fosse elevar a cotação do dólar. Quando anunciou a medida, o ministro Guido Mantega declarou que o dólar subiria. Não fez diferença. Agora o Ministério da Fazenda emite sinais de que está "preocupado" com o câmbio. Se isso significa que a Fazenda quer fazer algo a respeito, vai se deparar com a dificuldade de encontrar uma medida que mude o quadro cambial brasileiro. - No último ano, houve queda de 7% no número de empresas exportadoras. Era para o Brasil aumentar o número de empresas que exportam e está acontecendo o contrário - diz Joseph Tutundjian, especialista em comércio exterior. O ex-presidente do Banco Central Gustavo Loyola também acha que nada vai alterar a curto prazo o câmbio: - A melhora do Brasil em todos os indicadores externos e o grande nível de liquidez no mercado internacional manterão o dólar baixo. A queda dos juros derruba também o risco-país, o que mantém a atratividade do mercado brasileiro - diz. As empresas acham que o Banco Central deveria manter a política de compra de reservas, mas isso é, na opinião de Nathan Blanche, uma "arapuca cambial": - O Banco Central compra, o dólar sobe, as empresas exportam mais, o Banco Central tem que comprar mais, e assim sucessivamente. Hoje, a relação da dívida externa, pública e privada, com as reservas cambiais é de 1,55; se a conta for feita apenas com a dívida pública, a relação é de 0,8 (ou seja, a dívida é menor que as reservas). O efeito colateral de comprar dólares e aumentar as reservas é o custo de comprar um ativo que rende muito menos que o custo da dívida que tem de ser emitida para o mercado interno. Em resumo: o dólar não subiu apesar da forte compra de dólares pelo BC, da autorização de que exportadores deixem dinheiro no exterior, da queda de seis pontos percentuais nos juros, do aumento de 23% nas importações e até de uma crise política no meio das eleições presidenciais. Fazer o quê, então? Schymura acha que a saída é aumentar a competitividade das empresas brasileiras, reduzindo o enorme custo tributário sobre elas, o que se faz com reformas: trabalhista, tributária e previdenciária. - Nada disso tem efeito imediato, mas é uma forma de reduzir o custo das empresas - acredita ele. - A saída é abrir mais a economia; importar mais - defende Nathan Blanche, solução apontada também pelo colega dele da Tendências, Gustavo Loyola, e por Joseph Tutundjian. Há quem esteja propondo ao governo, o contrário: que aumente as tarifas de importação para proteger setores que estariam sendo afetados pelo aumento das importações devido ao câmbio baixo. Se fizer isso, o tiro sai pela culatra. "O Brasil é um caso de livro-texto, de como proteção a setores com problemas de competitividade tende a piorar sua eficiência, criando bolsões de atraso", diz a Carta do Ibre. Pior que barreiras à importação, só mesmo restrições à entrada de capital. Não há solução fácil para o problema do câmbio brasileiro, e algumas idéias podem dar muito errado. |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, novembro 14, 2006
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