Editorial |
O Estado de S. Paulo |
9/11/2006 |
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva pretende manter Henrique Meirelles na presidência do Banco Central (BC), mudar diretores da instituição e evitar qualquer virada brusca na economia, informou em Brasília uma fonte ligada ao governo. Em outras palavras, pretende quebrar alguns ovos, mas não quer fazer omelete. A notícia, além de estranha, é preocupante. O presidente do BC, Henrique Meirelles, só não ficará no posto se não aceitar a mudança, acrescentou o informante. A notícia nos parece estranha porque, para começar, omite um dado fundamental: qualquer alteração na cúpula do BC, por iniciativa do Ministério da Fazenda ou do Palácio do Planalto, seria uma quebra da autoridade do presidente da instituição. Seria uma interferência legal, porque o banco ainda é subordinado ao governo, mas seria também uma negação da política que o presidente Lula seguiu até agora e promete continuar seguindo. Além disso, qual seria a justificativa da mudança? O objetivo, segundo a fonte, seria afastar diretores muito “burocráticos”. É uma explicação inconvincente. O presidente da República seria um ingênuo - e isso ele não é - se assumisse o risco de intervir na diretoria do BC apenas para isso. Além do mais, o que é um diretor “burocrático”? Evidentemente, não seria por questão de burocracia que se trocaria um diretor. Trocar diretores do banco é mexer no Copom, responsável pelas ações de combate à inflação, a começar pela definição da taxa básica de juros. Quem apontaria os substitutos? O ministro da Fazenda? A ministra-chefe da Casa Civil? O ministro de Relações Institucionais, arauto da era pós-Palocci e crítico da “preocupação neurótica com a inflação”? Segundo Henrique Meirelles, a informação sobre mudanças não passa de “especulação natural”. Só se cuidará de alterações, acrescentou, quando houver definições sobre a composição do governo. “Veremos com os diretores quais são os planos de cada um.” O presidente do BC foi apenas cauteloso. Não lhe convém alimentar uma polêmica sobre o assunto. Mas ele foi claro quanto a um ponto: montado o novo governo, cada um dos diretores terá a iniciativa de escolher seu próximo passo. Essa ressalva só tem sentido, naturalmente, com base numa hipótese: o próprio Meirelles será mantido e não pretende aceitar menos autonomia do que teve até agora. Sem isso, poria em risco a credibilidade acumulada em quatro anos de trabalho. Essa credibilidade é um ativo importante não só para ele, mas também para o presidente Lula. Comandado por Henrique Meirelles, o BC ofereceu ao presidente da República um dos trunfos mais importantes para sua reeleição. O controle da inflação permitiu a milhões de famílias um aumento real de renda. Graças a isso, puderam não apenas manter, mas elevar seu padrão de consumo, pois dispuseram de folga orçamentária para diversificar suas compras. O próprio Meirelles chamou a atenção, numa entrevista ao Estado, para o alcance da política antiinflacionária. Mantido na chefia do BC, Henrique Meirelles terá o papel, para começar, de um avalista do presidente reeleito. Este prometeu manter o controle da inflação e evitar aventuras. Seu compromisso é promover o crescimento econômico, nos próximos quatro anos, sem renunciar às condições de estabilidade conseguidas no primeiro mandato. Se dispensar Meirelles, terá de reconstruir as bases de sua credibilidade. Essa deve ser a perspectiva de Lula, mas não é, necessariamente, a de seus auxiliares e conselheiros mais próximos. Não é, com certeza, a de uma boa parte de seus aliados políticos, nem dos empresários mais ansiosos por uma política monetária mais frouxa. Por isso, o presidente continuará pressionado para mexer na diretoria do BC, abrir o Conselho Monetário Nacional a empresários e sindicalistas e adotar metas de inflação menos ambiciosas, como se disso dependesse a aceleração do crescimento da economia. Os boatos sobre mudanças na diretoria do BC podem conter uma dose de especulação, mas sem dúvida refletem as ambições desses grupos. Não são, portanto, irrelevantes. É preciso levá-los a sério e discutir com clareza as conseqüências de uma intervenção política no BC. O preço da mudança pode ser muito alto. |
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, novembro 09, 2006
Jogo perigoso contra o BC
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