Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 23, 2005

Zuenir Ventura O show deve parar

O Globo


Agora que a CPI virou sucesso de público, sendo tema de discussão em jantares e reuniões sociais como se fosse uma novela, vai ser difícil convencer seus integrantes a mudar os métodos de trabalho, passando a dar mais atenção aos fatos do que às versões, privilegiando o que está escrito mais do que o que é falado. Ou seja, atuando mais nos bastidores e menos diante dos holofotes da mídia, lendo e analisando os documentos mais do que ouvindo e fazendo perguntas aos suspeitos.


Interromper o show talvez seja mais produtivo. Ao massacrar durante 14 horas seguidas o ex-tesoureiro do PT, por exemplo, a comissão pode ter ido à forra de um depoimento cínico e mentiroso, aplicando-lhe como castigo a demora. Mas o que isso trouxe de importante para as investigações? Nada, além de reforçar suspeitas, pois muito do perguntado e negado já fora confirmado pelo sigilo bancário de Marcos Valério. Teria sido mais proveitoso se esse tempo fosse gasto lá atrás, longe das câmeras, com a pilha de papéis chegados de várias partes, principalmente dos bancos: extratos e movimentação de contas, saques, sigilos abertos, em suma, as provas.

O problema é que lá na frente estão os 15 minutos de fama (que muitos aproveitam para fazer minicomícios), o jogo de cena, o espetáculo, o folclórico e o pitoresco. Alguns têm papéis definidos. Há o exibicionista, há o que compensa a inconsistência de suas intervenções elevando os decibéis de suas falas, há o irresponsável que manipula a imprensa com listas, há os que não têm o que perguntar, mas perguntam, ou melhor, discursam.

É claro que generalizar seria uma injustiça com aqueles membros da CPI que, independentemente de partidos, levam a tarefa a sério, fazem o dever de casa, informam-se antecipadamente, preparam-se para os interrogatórios. Graças a estes, aliás, é que de vez em quando as investigações avançam, é que surgem uma surpresa e uma ou outra confissão reveladora.

Mas em casos como o de Delúbio e de seu cúmplice Marcos Valério, que depuseram cercados de advogados e protegidos por hábeas-corpus que lhe permitiam só dizer o que queriam, até esse esforço é tempo perdido, como será na terça-feira, se a mulher do publicitário for depor coberta do mesmo manto protetor. Pode vir a ser um espetáculo divertido, ou deprimente como foi o último, mas improdutivo. A temporada de shows serviu para mostrar as vísceras do poder. Agora é mergulhar nos bastidores para seguir o que interessa: os caminhos ocultos do dinheiro.

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