Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 23, 2005

INDICE DE ARQUIVOS DE ARTIGOS ETC VEJA Ibope dos depoimentos revela um país maduro


INDICE DE ARQUIVOS DE ARTIGOS ETC


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24 horas de olho neles

O brasileiro vigia a CPI pela TV. A cobertura da
crise é só um exemplo da força da democracia


Eraldo Peres/AP
BIG BROTHER, MAS DO LADO DE CÁ
Cidadão assiste ao depoimento de Delúbio Soares: liberdade e boa audiência


Nunca uma crise política no Brasil foi tão exposta em suas minúcias. Os depoimentos prestados à CPI dos Correios são transmitidos pelos canais de notícias 24 horas – que ainda não existiam, por exemplo, na época do processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Melo, em 1992. É como se a atividade da CPI estivesse sob permanente vigilância, em uma espécie de Big Brother da política – sujeito a momentos de tédio, mas também a formidáveis revelações. Essa programação tem obtido bons índices de audiência: nas duas ocasiões em que Roberto Jefferson depôs – na Comissão de Ética da Câmara e na CPI –, o canal de notícias Globonews foi sintonizado por mais de 1 milhão de pessoas, assumindo a liderança da audiência entre os canais pagos. O Jornal Nacional, o programa jornalístico mais visto do país, tem dedicado quase todos os seus blocos à cobertura do escândalo – e é acompanhado por cerca de 30 milhões de pessoas. Esses números revelam um interesse continuado do público brasileiro pelos desdobramentos do escândalo do mensalão. E mostram o vigor democrático da sociedade brasileira.

Apesar dos escândalos, muitos indicadores de saúde democrática vão bem. Ainda no âmbito da imprensa, hoje é inimaginável que ocorram episódios como a invasão do prédio da Folha de S.Paulo pela Polícia Federal, em 1990 – uma tentativa de intimidar os meios de comunicação quando pipocavam denúncias contra o presidente Collor (o governo petista tentou criar um mecanismo de controle da imprensa, o malfadado Conselho Federal de Jornalismo, mas a idéia foi abatida no nascedouro). Mesmo no aparato estatal, há instituições sólidas e independentes. Desde que viu sua autonomia ampliada pela Constituição de 1988, o Ministério Público tornou-se um órgão importante de combate à corrupção. O mesmo se pode dizer da Polícia Federal. "A verdadeira democracia tem de ser testada. São as crises que permitem constatar o vigor das instituições", diz o historiador Lincoln Penna.

Outras comparações com o período da falência do governo Collor tornam mais claro como o Brasil avançou. Quando Collor foi apeado da Presidência, a inflação batia em 1.000% ao ano. A crise econômica não nasceu com as denúncias contra o presidente, mas viu-se ampliada por elas: a inflação mensal atingiu seu pico no mês do impeachment, setembro de 1992, com 27%. No terremoto atual, a economia se mantém estável. Não se fala em explosão inflacionária, e a confiança do mercado internacional não dá mostras de arrefecer: na semana passada, o Brasil trocou boa parte de seus C-bonds (títulos da dívida externa) por documentos com cláusulas mais favoráveis. Isso é possível porque o governo se mantém firme na rota do ajuste fiscal, mas também pela autonomia que instituições econômicas como o Banco Central têm demonstrado. Nas últimas semanas, por exemplo, o BC negou um empréstimo especial ao Banco Rural, instituição estreitamente ligada ao empresário Marcos Valério, operador do mensalão. Com seu nome associado a um escândalo de corrupção, o banco imaginou que seria possível blindar-se contra uma corrida de saques com um dinheirinho do governo. Se dependesse da cúpula petista, o desejo teria sido atendido. O BC, no entanto, manteve as portas do cofre trancadas.

Uma comparação com nações em estágio de desenvolvimento semelhante ao do Brasil é também eloqüente. Na Argentina, quando a crise econômica levou o presidente Fernando de la Rúa à renúncia, em 2001, houve saques e confrontos de rua em Buenos Aires. Não se vê nada remotamente parecido por aqui. "A democracia brasileira já é capaz de absorver as crises e demandas dentro de um marco institucional", diz o jurista e ex-ministro das Relações Exteriores Celso Lafer. Também é alentadora a comparação do Brasil com países como China e Rússia. A Rússia, assolada por um nível quase endêmico de corrupção, ainda não se libertou da tradição autoritária herdada do comunismo: os canais de televisão, por exemplo, são controlados pelo governo. A China, embora desponte como um gigante econômico, não dá mostras de que algum dia vá instituir um estado de direito.

As atividades da CPI, é claro, também são um índice de força da democracia – ainda mais quando vigiadas pelo eleitor. "Uma CPI bem conduzida ajudará a dissipar a idéia de que os políticos são um bando de gaiatos", diz o cientista político Bolívar Lamounier. Na semana passada, o senador Jefferson Peres (PDT-AM), em artigo no jornal Folha de S.Paulo, citou o Chile como exemplo positivo para o Brasil. Ele lembrava que, no fim da ditadura do general Pinochet, os partidos chilenos firmaram um acordo sobre os pontos da política econômica que deveriam ser mantidos. Nenhum pacto formal do gênero foi firmado pelos partidos brasileiros. Mas a sociedade brasileira chegou, sim, a um pacto tácito sobre os valores básicos que nem a mais grave crise política pode vitimar: estabilidade econômica, instituições democráticas, liberdades civis. Por mais que as investigações da CPI abalem o governo, o Brasil tem todas as chances de sair desse processo ainda mais fortalecido.

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