Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 16, 2005

VEJA João Paulo: o "mesadão" de Valério

Escondeu mas apareceu

O petista João Paulo, que andava
silencioso, enrola-se com três visitas
de sua mulher ao Rural e gastos
com o publicitário-lobista


Alexandre Oltramari

 

Moacyr Lopes Junior/Folha Imagem
SECRETÁRIA TAMBÉM
O deputado João Paulo: além da esposa, sua secretária também foi à agência do mesadão

Depois de José Dirceu, José Genoíno, Delúbio Soares, Silvio Pereira, Marcelo Sereno, Luiz Gushiken – ufa! –, chegou a vez de outro petista de primeira grandeza fazer sua estréia no escândalo da hora. João Paulo Cunha, o ex-metalúrgico que virou presidente da Câmara em seu terceiro mandato como deputado por São Paulo, está enrolado. A CPI dos Correios descobriu que sua mulher, a jornalista Márcia Regina Milanésio Cunha, esteve na suspeitíssima agência do Banco Rural, em Brasília, a mesma da qual jorrava a dinheirama do publicitário-lobista Marcos Valério para o bolso dos parlamentares brindados com o mensalão petista. Conforme os registros da portaria do prédio, revelados pelo Jornal Nacional, da Rede Globo, Márcia Cunha esteve três vezes na agência do Rural, todas no dia 4 de setembro de 2003. Na primeira vez, às 14h01, ela permaneceu oito minutos no banco. Na segunda, às 15h05, demorou exatamente dezenove minutos. Por fim, na terceira vez, entrou às 16h46 e por lá ficou doze minutos.

O que a mulher do deputado foi fazer no Banco Rural? Márcia Cunha conta que foi resolver o problema de uma conta de sua empresa de TV a cabo, a TVA. O boleto, que vencia no dia 13 de setembro, trazia o valor duplicado – a conta do mês em questão mais a do mês anterior, que, no entanto, já tinha sido paga. Para evitar o pagamento em dobro, a mulher do deputado recorreu ao Rural, instituição encarregada de receber as contas da TVA. "Ela foi ao banco reclamar dessa conta, que estava errada", diz João Paulo. "A conta foi paga alguns dias depois pela minha secretária, a Silvana Japiassú, lá no Banco Rural", arremata. De fato, conforme o registro de ingresso na portaria do prédio onde funciona a agência, a secretária esteve mesmo no banco. Mas não "alguns dias depois", e sim sete meses depois. João Paulo talvez tenha confundido "uns dias" com "uns meses". A secretária Silvana Japiassú fez duas visitas ao Rural. A primeira ocorreu no dia 2 de abril de 2004, às 13h16, e durou seis minutos. A outra foi dias depois, em 16 de abril, às 15h19, e também durou seis minutos.

Epitacio Pessoa/AE
A DÚVIDA DE MÁRCIA
Mulher de João Paulo: saque vultoso ou conta duplicada?


A explicação da conta com valor errado é verossímil, mas há outras mais comprometedoras. Até a semana passada, o deputado João Paulo conseguiu manter em discrição absoluta o fato de que sua mulher aparecia na lista dos clientes do Rural em Brasília. A informação, porém, acabou vindo a público. Agora, além de a visita ter sido noticiada, existe a suspeita de que a mulher do deputado foi à agência para fazer um saque. A suspeita se dissipará ou se confirmará em breve. Na semana passada, a 4ª Vara da Justiça Federal recebeu documentos do Banco Rural em obediência à quebra do sigilo bancário de Marcos Valério. A CPI dos Correios vai receber também cópias da mesma papelada acrescida de mais documentos. Os papéis cobrem os saques e depósitos de Valério e suas empresas nos períodos em que se investiga o favorecimento de petistas em retribuição a contratos de publicidade com órgãos do governo.

Desde que estourou o escândalo do mensalão, João Paulo foi o primeiro, entre os petistas mais estrelados, a reconhecer que tinha relações profissionais com Marcos Valério. Uma agência de publicidade do empresário, a SMPB, fez sua campanha vitoriosa à presidência da Câmara. Depois da eleição, a SMPB ganhou um contrato inicialmente de 9 milhões de reais com a Câmara – contrato que recebeu dois aditivos que, juntos, engordaram a conta em mais 4,6 milhões de reais. Um naco desse dinheiro, 750.000 reais, foi usado por João Paulo para pagar uma pesquisa de opinião encomendada pela agência de Valério ao Instituto Vox Populi, de Belo Horizonte. A pesquisa – paga com dinheiro público – traz perguntas que revelam um evidente interesse no futuro político de João Paulo. Algumas indagam se o eleitor se lembra de seu nome e, também, se é a favor ou contra a reeleição do presidente da Câmara. Além disso, há um nítido descompasso técnico na mostra da pesquisa: quase a metade dos entrevistados mora em São Paulo, reduto eleitoral do deputado. São Paulo, porém, tem 22% dos eleitores do país, e não 50% deles.

 

Os furos na blindagem de Lula

Os parlamentares governistas animaram-se com a divulgação de uma pesquisa da CNT/Sensus. Os dados mostram que houve ligeira melhora na avaliação do governo Lula e na do desempenho pessoal do presidente, apesar das denúncias de corrupção. A variação foi de apenas 0,5 ponto porcentual no primeiro caso e 2,5 no segundo. Ambas as situações estão dentro da margem de erro da pesquisa, mas foram suficientes para que o governo inferisse que a imagem de Lula não foi atingida pelas denúncias de corrupção. É uma conclusão que não tem respaldo nos dados da pesquisa. "O governo não tem o que comemorar. Os dados são um alerta", avisa Ricardo Guedes, da Sensus. A quantidade de pessoas que acham que a corrupção aumentou no governo Lula saltou de 31,2% para 40,3%. Boa parte desse crescimento aconteceu entre os que acreditavam há dois meses que a bandalha havia diminuído na gestão petista. É sinal de que as denúncias arranharam a credibilidade do governo. O instituto perguntou também qual será o critério mais importante na escolha do próximo presidente. O mais citado foi "moralidade pública" – justamente o calcanhar-de-aquiles do governo.

Lula também comemorou os resultados dos cenários elaborados pela CNT/Sensus para a sua sucessão. Pelos números, hoje só haveria segundo turno se o prefeito de São Paulo, José Serra, estivesse na disputa. Foi outra conclusão precipitada. "Na verdade, há grande probabilidade de haver segundo turno em qualquer cenário, porque Lula tem hoje desempenho abaixo do que teve no primeiro turno de 2002", diz Guedes. Naquela ocasião, Lula teve 41,6% dos votos. Segundo a CNT/Sensus, Lula tem, na simulação mais favorável, apenas 39,4%. Além disso, em todos os quadros, a quantidade de indecisos ainda é grande – o que significa que é possível haver uma migração de votos para outros candidatos, provocando o segundo turno. Os resultados da CNT/Sensus corroboram os do instituto Ipsos, divulgados por VEJA na edição passada. Os dois institutos perguntaram se Lula sabia da corrupção em seu governo. A quantidade de eleitores que responderam "sim", segundo o Ipsos, é de 39%. Para a CNT/Sensus, de 33,6%. A discrepância pode ser atribuída às diferenças de metodologia e à margem de erro. Com essas ressalvas, conclui-se também que os institutos chegaram à mesma conclusão sobre a parcela dos eleitores que acreditam que Lula estava envolvido na corrupção (16% para o Ipsos e 12% para a CNT/Sensus). "A pesquisa CNT/Sensus foi boa para o ânimo do presidente, mas, do ponto de vista eleitoral, os números são um desastre", diz um ministro de Lula.

 

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