folha de s paulo
O ataque do terror em Londres fez centenas de vítimas, mas não abalou uma cidade que já amargou mais de 15 mil mortes durante os bombardeios nazistas na Segunda Guerra. Os mercados financeiros são medrosos, mas parecem acostumados à guerra terrorista. A Bolsa de Londres fechou ontem no mesmo nível do dia anterior aos atentados.
Enquanto isso, no Brasil novas bombas agravaram a crise política interna, aumentando as apostas em relação aos cenários para a crise política e suas conseqüências sobre a política econômica.
É possível vislumbrar três cenários. O primeiro é o da virada política do governo Lula. A maioria dos analistas subestima os recursos de que o governo ainda dispõe. Uma reforma ministerial abrangente que sinalizasse administração mais técnica e enxuta aliada a mudança profunda na direção do PT teria impacto positivo.
Tais ações permitiriam ao governo retomar a iniciativa e construir alguma base de apoio. Mesmo neste cenário, seria difícil imaginar uma coalizão política capaz de sustentar a proposta de déficit nominal zero. De qualquer forma, não haveria risco de guinada na política macroeconômica e prevaleceria um sinal de maior austeridade fiscal.
No entanto, os sinais recentes indicam na direção contrária. A entrega dos ministérios da Saúde, de Minas e Energia e da Comunicação para o PMDB e do Trabalho para o presidente da CUT não caracterizam mudança substantiva. Convém esperar para verificar o que se pretende fazer no chamado "choque de gestão" a ser anunciado na próxima semana. Mas o que se viu até agora foi uma despetização limitada quando o que se exige é o fim do loteamento político. Assim, o cenário de virada política parece improvável.
Igualmente improvável é um segundo cenário de crise institucional que termine no afastamento do presidente. As próximas pesquisas de opinião deverão apontar queda sensível de popularidade e até mesmo a possibilidade de derrota em segundo turno. Isso pode ser um tiro de morte no projeto de reeleição, mas não precisa representar o fim do governo.
O elemento novo da atual conjuntura comparativamente àquela que prevalecia há poucas semanas é a existência deste cenário. Embora altamente improvável, a crise institucional não pode ser descartada. Nesse contexto, seria plausível imaginar uma guinada da política econômica, uma espécie de Plano B que refletiria uma volta às origens do PT em matéria de política econômica. Ou, ainda, o crescimento de candidaturas populistas para 2006. Tais conjecturas já têm algum efeito sobre a formação das expectativas nos mercados financeiros e na economia real.
Diante da pequena probabilidade dos dois cenários anteriores, o mais provável é que prevaleça um terceiro cenário de desgaste crescente do governo sem contudo resultar em descontinuidade do mandato presidencial. Neste caso, não seria razoável supor uma mudança significativa da política econômica. Pelo contrário, seria recomendável evitar qualquer tipo de mudança súbita na área econômica.
Isso não quer dizer que a política econômica deveria permanecer exatamente como está. Uma queda gradual na taxa de juros, o aperfeiçoamento do sistema de metas acompanhado pela autonomia do Banco Central, a implementação das propostas de limite de gastos e de carga tributária contidas na Lei de Diretrizes Orçamentárias e a priorização de reformas microeconômicas que não enfrentam oposição político-partidária constituem os principais componentes da agenda positiva que tanto se procura.
Um programa de ação deste tipo não é espetacular nem é suficiente para um projeto ambicioso de retomada do crescimento sustentado. Mas é aquilo que pode ser feito em conjuntura de grave crise política. Se for bem feito, pode até mesmo preparar o terreno para a superação das dificuldades atuais e permitir melhor desempenho do país a partir de 2007.
Entrevista:O Estado inteligente
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