Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 23, 2005

O Supervalério e Mané Biu Gustavo Krause


Se na nossa história política sempre prevaleceu a prática do toma-lá-dá-cá, nem por isto há registro de que a Casa da Moeda tenha entrado no jogo sujo das barganhas

Gustavo Krause

Ex-ministro da Fazenda

Se na nossa história política sempre prevaleceu a prática do toma-lá-dá-cá, nem por isto há registro de que a Casa da Moeda tenha entrado no jogo sujo das barganhas

O senhor Marcos Valério é um portento. Homem de talentos múltiplos; aptidões polivalentes; movimentação ágil; onipresente e espaçoso, o articulado homem-rede, uma verdadeira holding tentacular, bem que poderia confessar qual a palavra mágica que, ao transformá-lo no Supervalério, abria as portas do governo (sésamo?).

Nem que um dilúvio desabe sobre sua cabeça, ele não revela o segredo.

Além da promiscuidade manifesta, explícita, cabal, entre seus negócios, o PT, o governo e as mentiras proclamadas, sob rochosa segurança, no seu depoimento prestado à CPMI, o Supervalério demonstrou que está em todas e manja de tudo: publicidade, finanças, mercado de capitais, sistema bancário, nióbio, tecnologia da informação e da comunicação, marketing político, relações institucionais, espertezas mil e matérias afins.

Eis, no entanto, qual não foi minha surpresa diante da constatação de que o Supervalério, a partir das anotações da agenda da ex-secretária Fernanda Karina, da resposta dada ao deputado Antonio Carlos Magalhães Neto, mantinha relações, relações, digamos, relações... divinas e maravilhosas com o Senhor Manoel Severino dos Santos que vem a ser o Presidente da Casa da Moeda e que confirmou publicamente (entrevista na Band e matéria publicada, em O Globo, na edição de 06/7/05) haver tratado com Valério sobre assuntos políticos, mais especificamente, sobre campanhas eleitorais no Rio de Janeiro (três encontros confessados, em local não revelado).

Sim, senhoras e senhores, a Casa da Moeda! Aquela empresa que ''é uma empresa pública que atua no mercado de segurança gráfica e metalúrgica, onde sua credibilidade e desempenho devem sempre decorrer de ações marcadas pela integridade, dignidade e valorização do empregado'' (Texto introdutório ao Código de Ética da Casa da Moeda de 28 de agosto de 2002).

A Casa da Moeda, isto mesmo, aquela empresa tricentenária (1694) que começou suas atividades fabricando moedas do ouro extraído de nossas minas pelos colonizadores portugueses; moeda, esta criação do gênio humano que substituiu o escambo e se tornou valor de troca no estágio avançado da civilização humana que ensaiara com o sal (salário) e com o gado (''pecus'' em latim, de onde vem pecúnia e, a propósito, peculato) funções idênticas.

Aqui para as bandas do nordeste, este ínclito cidadão, Manoel Severino dos Santos, seria tratado de Mané Biu pela intimidade carinhosa da patota e pelos amigos de fé, conquistados Brasil afora, como o Supervalério, que, no aconchego dos gabinetes oficiais, certamente, dispensariam os pronomes e títulos majestáticos, Vossa Excelência, Senhor Presidente.

Mané Biu é ''companheirão'', inclusive, do Senhor Delúbio Soares. Fez parte do secretariado da Governadora Benedita (Secretário de Articulação Governamental), ao lado de Marcelo Sereno (Chefe de Gabinete) e Waldomiro Diniz (Presidente da Loterj), especializando-se no tema ''recursos para a governabilidade'', matéria que daria, em futuro próximo, não só notoriedade como haverá de garantir à ''troika'' um lugar de destaque na história dos grandes escândalos nacionais.

Esta valiosa experiência deve tê-lo credenciado a assumir a gestão monopolística do Estado de emitir a moeda nacional, a fidúcia; ocupar um lugar de relevo no mercado interno e externo na venda dos produtos da empresa; e administrar a receita decorrente da senhoriagem, antigo vernáculo que expressa o poder do senhorio, no caso, o poder de emitir um dos mais caros símbolos de uma nação.

Se houve um longo tempo na nossa história econômica em que a moeda nacional não valia um tostão furado; se em todos os tempos da nossa história política sempre prevaleceu a prática do toma-lá-dá-cá, nem por isto há registro de que a Casa da Moeda tenha entrado no jogo sujo das barganhas.

Não é por outra razão que o comportamento dos funcionários da respeitável repartição é regido por rigoroso Código de Ética que, entre outras normas, prescreve o seguinte:

''2.4 - Avaliar, cuidadosamente, situações que possam caracterizar conflito de interesse e os da empresa, evitando condutas que possam trazer prejuízos tangíveis e intangíveis, ou que possam ser confundidas com a defesa de interesses pessoais'';

''3.15 - Envolver-se em atividades particulares que interfiram no tempo a ser dedicado à empresa''.

Com a palavra, a comissão encarregada de aplicar as regras do referido código.

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