Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, julho 08, 2005
O ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ RUMO A 2006
Idéia, que é discutida por Palocci e Thomaz Bastos, inclui pacto de cassações para que Lula chegue ileso ao fim do mandato
Governo e PSDB negociam fim da reeleição
folha de s paulo
ELIANE CANTANHÊDE
COLUNISTA DA FOLHA
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Diante do agravamento da crise política e do cenário de incertezas, setores da oposição e do governo conversam sobre a possibilidade de acelerar a tramitação de emendas constitucionais acabando com a reeleição em todos os níveis -para presidente, governadores e prefeitos. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estaria, assim, fora da disputa em 2006.
Em troca, setores do PSDB e do PFL buscariam assegurar a discussão em torno de projetos com o carimbo de "interesse nacional" e a conclusão do mandato de Lula em caso de agravamento ainda maior da crise, cenário que o próprio governo não descarta. O grande temor do empresariado e dos caciques oposicionistas é a ascensão do vice José Alencar.
A oposição se dispõe até a discutir uma lista de parlamentares que possam ser cassados num grande acordo político com o governo. E pede uma cabeça importante, a do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, petista que reassumiu o mandato de deputado federal por São Paulo.
Obstáculos: Lula reage mal à idéia, e Dirceu dá sinais de que lutará até o fim pelo mandato.
Nesse contexto, há dificuldade para prosperar um acerto tão ambicioso, mas, no mínimo, foi aberto um canal de conversações para a hipótese de a crise chegar a um patamar de gravidade que leve Lula e o PT a tratar objetivamente da idéia oposicionista.
As iniciativas mais concretas para acabar com a reeleição partiram do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, criador da idéia em 1997, e dos senadores Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Tasso Jereissati (PSDB-CE). Do lado do governo e do PT, participaram de algumas conversas o ministro Márcio Thomaz Bastos (Justiça) e o deputado Sigmaringa Seixas (PT-DF), um ex-tucano.
A intenção é manter as investigações de corrupção, mas distender o ambiente político e garantir condições de governabilidade a Lula durante o ano e meio que resta a seu mandato.
Importantes governistas simpatizam com a idéia, mas o Lula reage com irritação. Considera que o fim da reeleição seria um atestado de óbito de seu governo.
Apesar das crescentes denúncias de um esquema liderado pelo PT para usar verbas públicas para pagar o suposto "mensalão" para deputados, setores do PSDB e do PFL concordam nos bastidores com a necessidade de um "cordão de isolamento" para que elas não atinjam a figura do presidente.
Ao ser lançado publicamente por FHC, o fim da reeleição não se resumia a uma visão pessoal, a um impulso ou a uma provocação oposicionista, como se pensou. Ao contrário, ela vem sendo abordada, por exemplo, com Thomaz Bastos, que já se encontrou com FHC (PSDB), jantou com ACM e almoçou com Dirceu.
Numa outra ponta, o ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) capitaliza politicamente a estabilidade da economia e tenta discutir uma agenda comum com empresários e parlamentares do governo e da oposição. Na terça-feira, já se reuniu longamente com eles em torno da proposta do "déficit zero" feita pelo deputado e ex-ministro Delfim Netto (PP-SP).
O risco Alencar
Há uma consciência generalizada do tamanho da crise, agravada pela linha sucessória de Lula. Há um temor claro no empresariado e na classe política de que o vice-presidente Alencar, do PL, possa assumir e pôr em risco a única área que se mantém estável em meio à turbulência: a economia.
Alencar, empresário bem-sucedido e neófito em política, é considerado voluntarista e tem uma espécie de bandeira única contra os juros. Teme-se que possa tentar ajustes com canetadas. E o segundo na sucessão é o presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), hipótese nem considerada.
Nem na oposição e muito menos no governo se vislumbra no horizonte a queda de Lula, mas todos esses dados da realidade e a constitucionalidade estão sendo olhados atentamente por todos os lados que têm capacidade de decisão e responsabilidade política.
"Guizo no gato"
O fim da reeleição tiraria o componente eleitoral da crise, já que a sucessão está marcada para outubro do próximo ano. Um problema ainda não acertado, porém, é quem "poria o guizo no gato". Ou seja: quem teria proximidade e ascendência suficiente sobre Lula para lhe falar das conversas. Para a oposição, o homem talhado para isso é Thomaz Bastos.
Conforme a Folha apurou, o presidente está deprimido e irritado, tem noção de que a situação é grave, mas ressalta os acertos na economia e tenta uma reforma ministerial para agregar votos no Congresso, convencido de que a onda de denúncias vai durar no máximo até o próximo recesso do Congresso, em quatro meses .
Quanto à outra contrapartida: o próprio José Dirceu sabe que está entregue à própria sorte. De volta à Câmara, ele é um dos alvos da CPI dos Correios e da CPI dos Bingos, que já decidiu ouvir seu ex-braço direito na Casa Civil, Waldomiro Diniz. Estão previstas de 10 a 15 cassações.
O governo não quer "entregar a cabeça de Dirceu na bandeja", mas sabe que, se os acontecimentos e as denúncias se precipitarem, ele poderá ficar cada vez mais vulnerável. Seria o último biombo entre os escândalos e o próprio presidente.
Em diferentes conversas, Dirceu disse que está preparado para "o que der e vier". Lembrou sua vida de líder estudantil, de asilado político, de clandestino durante a ditadura militar (1964-1985) e de deputado e ministro, para concluir que já recomeçou sua vida inúmeras vezes. Teria condições, psicológicas, de recomeçá-la mais uma vez. Sobreviveria, enfim.
Bornhausen fora
Do lado da oposição, a maior resistência a uma negociação política para acabar com a reeleição e garantir governabilidade de Lula parte da cúpula formal do PFL, à frente o seu presidente, senador Jorge Bornhausen (SC).
"Não quero acordo. Não tenho nenhuma barganha para fazer com esse governo e já mandei dizer que não vou conversar. Seria uma conversa inútil", disse.
Ainda segundo Bornhausen, que é seguido pelos senadores José Agripino Maia (RN) e José Jorge (PE), ao PFL só interessa um caminho: "Que Lula cumpra o seu mandato até o fim, preste contas na campanha presidencial de 2006 e seja julgado nas urnas. Para nós, isso é suficiente".
Com a retirada de Lula da eleição, o PT teria que promover uma série de debates internos, uma espécie de catarse, para chegar a uma candidatura.
O nome mais provável é o de Palocci, único pé do tripé lulista que tem passado imune e ao largo da atual onda de denúncias. Dirceu caiu, e o ministro Luiz Gushiken (Comunicação de Governo) está sob intenso tiroteio por conta de sua antiga empresa de assessoria na área de previdência privada e de fundos de pensão.
O risco, porém, é que Palocci entre automaticamente na linha de tiro, caso se vislumbre sua candidatura. Ele foi prefeito de Ribeirão Preto e, vira e mexe, oposicionistas perguntam em tom de provocação: "E o Buratti?"
Rogério Buratti foi o homem forte de Palocci na prefeitura e acabou demitido ao ser flagrado em suposta negociação escusa com uma empreiteira. Buratti, porém, continuou trabalhando com petistas em outras cidades.
O tabuleiro tucano para 2006 também pode ser mexido. Com Lula considerado praticamente imbatível, havia um acordo tácito de que o candidato seria o governador Geraldo Alckmin (SP). Com Lula fora, os tucanos crêem em FHC forte no páreo e relatam que o prefeito de São Paulo, José Serra, "só pensa nisso".
Alckmin é tido como o que reúne melhores condições políticas, pois tem mais apoios no partido. Serra, o que tem maior trunfo eleitoral, pois é o tucano mais forte nas pesquisas.
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