Roberto Macedo
Em Brasília, na Esplanada dos Ministérios, alguns prédios já revelam dificuldades de ostentar em suas fachadas o nome dos ministérios e das secretarias que acomodam, ao mesmo tempo que elevadores outrora privativos estão cada vez mais coletivos.
Há políticos e cidadãos que acreditam que o grande número de repartições governamentais significa uma ampliação do serviço a ser executado. Mas não é assim. Conversando sobre o assunto com meu amigo José Franklin, ele me lembrou da "Lei de Parkinson". Ela veio à tona em 1957 no livro com idêntico título escrito por C. Northcote Parkinson, e traduzido para o português por Silveira Sampaio, um médico que na época se notabilizou como jornalista, dramaturgo e responsável pelo primeiro "talk show" da televisão brasileira.
A "lei" diz que "o trabalho aumenta de modo a preencher o tempo disponível para completá-lo". Hoje, há uma versão que se aplica a computadores: "Os dados se expandem de modo a preencher o espaço existente para arquivá-los."
Parkinson desenvolveu sua "lei" baseando-se particularmente na experiência do Serviço Civil da Grã-Bretanha. Uma de suas observações foi a de que a decadência do Império Britânico ocorreu paralelamente à ampliação do número de funcionários que tratavam das questões coloniais. Relatou também "... a descoberta, num determinado setor de operações militares, de que o número de soldados mortos varia inversamente ao número de generais do lado contrário".
A "lei" baseia-se na percepção de que muitas vezes é pequena ou nenhuma a relação entre o trabalho a ser feito e a quantidade de pessoas a executá-lo, particularmente as tarefas com papéis. Mas o que governaria, então, por exemplo, a elevação do número dos funcionários de um governo? Parkinson aponta duas causas: "1) Um chefe... está sempre disposto a aumentar o número de seus subordinados, desde que não sejam seus rivais. 2) Os chefes... inventam trabalho uns para os outros."
No caso da chefia exercida pelo presidente da República, tem sido irresistível a tentação de criar ministérios e secretarias para acomodar a tal "cota pessoal" e as resultantes de acordos políticos. Em princípio, os ministros não são rivais do presidente, mas a experiência, atualíssima, mostra que também podem fornecer munição a oposicionistas. Uma razão é que, mesmo se mantida constante a probabilidade de uma escolha errada, com o maior número de "auxiliares" diretos o número de equívocos tende a aumentar. Ademais, basta uma primeira reunião para surgirem idéias e parcerias que aumentam o trabalho de todos, mas freqüentemente sem levar a nada.
Em 1957 o livro listou o Brasil com 11 ministros. Quase meio século depois esse número está em 30, mesmo caindo 10% no contexto de uma reforma também anunciada como precursora de um "choque de gestão". Para se credenciar a tanto um autêntico corte deveria ser de pelo menos 30%, o que também se sustenta na argumentação de Parkinson.
Na lista do livro, com um número de ministérios acima de 30 figuravam Checoslováquia, Iugoslávia e URSS. Todos os países no topo dessa lista eram comunistas e totalitários. Parkinson não sobreviveu para constatar os desastres de vários tipos a que muitos desses países foram levados (inclusive os três citados), e certamente uma reedição de seu livro poderia apresentá-los como evidência de sua "lei". Isso além de constatar que o Brasil seguiu pelo caminho errado, apostando nos seus 30 ministros e similares.
Parkinson trata também do limite de ineficiência de um ministério. As decisões do grupo emergem de reuniões, e ele conclui que com mais de 20 participantes elas se deterioram nos seus resultados. Para chegar a esse número utiliza uma fórmula.
Nela, um ministério reunido tem um número de membros acima do qual seu trabalho fica prejudicado. Entre outros fatores, esse número depende, diretamente, da média do número de presentes às reuniões e sua idade média; inversamente, da paciência do presidente, conforme medida por uma tabela apropriada (com mais paciência, as reuniões se alongam), e do número de anos decorridos desde a formação do ministério (aparentemente, com o envelhecimento do governo as coisas se complicam).
Olhando o Ministério Lula e pensando na sua eficiência em face das lições de Parkinson, sua deficiência básica está no exagerado número de membros, agravada pelo fato de que apreciam comparecer às reuniões. Não sei como está a idade média, mas a paciência do presidente deve ter caído de uns tempos para cá, o que seria um fator positivo a encurtar as reuniões. Como outro fator negativo, o governo está entrando no fim de mandato e sonha com um outro do mesmo modelo.
Ou seja, em que pese um ou outro fator positivo, na avaliação de Parkinson o número de ministros do governo Lula (30) está 50% acima do limite que marca a ineficiência (20).
Analisado numa outra linguagem, mas com idênticos fundamentos, o organograma do governo peca por ter muitos quadradinhos em cima, milhares em baixo (os tais cargos de confiança), e por estar mal amarrado nas linhas que os ligam – quando ligam –, de cima para baixo e um lado para outro.
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