folha de s paulo
Pode-se criticar ou não o caráter espetacular da ação da Polícia Federal no caso Daslu. Mas todos os sinais indicam efetivamente a montagem de uma quadrilha para dupla sonegação de impostos.
A primeira sonegação era no subfaturamento das importações. Um produto de 100 entrava no país por 10. O Imposto de Importação incidia sobre 10. Digamos que fosse de 100%. Em vez de pagar 100, pagam-se apenas 10.
Aí a empresa importadora revendia para a Daslu por 125. Se o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) fosse de 25%, a empresa ficava devedora de 25 de imposto. E a Daslu ficava credora desses 25, compensando na hora de pagar o seu ICMS.
Digamos que revendesse o produto por 150. Ficava devendo 37,5 de ICMS, mas compensava com os 25 que a importadora supostamente pagou, pagando apenas 12,5 de impostos. Aí, a importadora -fantasma- fechava e não recolhia os impostos devidos. Ou seja, a Daslu se apropriava de uma compensação que não foi paga.
No exemplo mencionado, se fosse uma operação normal, a Daslu teria pago 100 de Imposto de Importação, mais 50 de ICMS. No total, seriam 150. Com a dupla sonegação, pagava apenas 22,5 (10 de imposto de importação, mais 12,5 de ICMS). Ou seja, era um processo graúdo e sistemático de sonegação.
Não é apenas ela quem fazia isso. Há sinais de que alguns templos do povão praticavam o mesmo processo.
O déficit nominal zero
Há algo estranho na insistência do deputado Antonio Delfim Netto com o déficit nominal zero. Não que não tenha lógica. O alarido em torno do tema obrigará, em um momento qualquer do futuro, a um amplo pacto nacional em torno do aumento da eficiência nos gastos públicos e da redução dos juros.
Mas o deputado não é um cabeça de planilha. Pelo contrário, é dos maiores economistas brasileiros, com conhecimento amplo de macroeconomia, história, hábitos políticos e empresariais brasileiros. Eventualmente recorre a sofismas, menos agora do que antes, quando cometia maldades deliciosamente sofisticadas -como a de sugerir ao então presidente Itamar Franco o uso das reservas cambiais para investimentos.
Mas, nesse episódio do déficit nominal zero, no entanto, recorre a argumentos aos quais decididamente não acredita. Como essa história de que existe desperdício nos gastos de saúde por conta das facilidades criadas pela vinculação orçamentária. Ele sabe que não é isso. Há escassez de recursos, até por conta da falta de gestão. Mas a redução de recursos não irá, em hipótese nenhuma, fazer a gestão nascer automaticamente. Pelo contrário, poderá provocar uma desarticulação maior do setor, tão grande que impeça um trabalho efetivo de melhoria -como ocorreu em outros momentos de apagões sociais.
Pode ser que o deputado esteja angustiado com a situação política, ansioso por criar fatos positivos. Deve-se discutir decididamente a melhoria da gestão e a profissionalização da área pública.
Mas a insistência no déficit nominal zero não é o caminho.
Entrevista:O Estado inteligente
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