Enquanto ruidosos atos confessados em depoimentos e entrevistas enxovalham indelevelmente a imagem do Partido dos Trabalhadores, números e documentos obtidos pelas investigações têm ajudado a desvendar os rastros de movimentações escabrosas, capazes de revelar os piores costumes políticos nacionais. Que o PT exibisse ''qualidades'' comuns a outras legendas no abuso de tais práticas já não restavam dúvidas, conforme admitiu há poucos dias o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Os dados expostos esta semana, contudo, escancaram um partido especialmente capaz de garantir dividendos suspeitíssimos a alguns de seus personagens mais relevantes. Da cascata de dinheiro jorrado da conta bancária da DNA Propaganda e SMP&B Comunicações na agência do Banco Rural, no Brasília Shopping, beneficiaram-se parlamentares do PT e de outras siglas aliadas do Palácio do Planalto - em tese receptáculos imorais de milhões de reais emprestados de um odioso caixa 2 de campanhas eleitorais.
Dos nomes exibidos, a luzente presença do deputado João Paulo Cunha (PT-SP) revela-se a mais pedagógica frente aos ensinamentos emitidos por um PT sequioso de poder. Segundo os documentos obtidos pela CPI dos Correios, a mulher do ex-presidente da Câmara, Márcia Regina Cunha, sacou R$ 50 mil do Banco Rural. João Paulo Cunha e colegas petistas (dentre os quais está, por exemplo, o líder do partido na Câmara, Paulo Rocha), retiraram a sua parte no empréstimo de R$ 39 milhões das empresas de Marcos Valério ao PT. Alguns dos beneficiários receberam para votar com o governo (imersos no ''mensalão''), outros para quitar dívidas de campanha ou custear a próxima. Tanto faz. Pouca importa para uma nau comandada por insensatos.
É preferível chamar de insensatez para não incomodar os leitores de bem. Sobretudo quando se constata que a data do saque da mulher de João Paulo Cunha coincide com o período em que a SMP&B disputava a licitação - que viria a vencer - para a cota de publicidade da Câmara. Somas vultosas estavam em jogo nos contratos fechados entre o deputado e a empresa de Valério. Acrescentem-se informações adicionais a eventuais - e sempre convenientes - lapsos de memória. Em setembro de 2004, o presidente da Câmara ainda sonhava com a chance de permanecer no cargo mais dois anos. Convinha-lhe, portanto, estreitar vínculos com parlamentares de todas as bancadas. Para um candidato à reeleição, voto de deputado não tem preço. Em tese. Coube ao Jornal do Brasil avisar que tem preço, sim. Naquele mês, o JB informou que numerosos integrantes da base governista recebiam mesadas para aprovar projetos considerados relevantes pelo governo. A sordidez foi escancarada oito meses depois pelo deputado Roberto Jefferson.
João Paulo Cunha sempre soube que muitos parlamentares trocam voto por dinheiro. Anos antes, ele próprio afirmara que a emenda da reeleição presidencial, proposta pelo governo Fernando Henrique, fora aprovada graças a essa prática inaceitável. Alojado no poder, o eloqüente orador emudeceu. Promoveu uma sindicância encerrada 40 minutos depois de aberta. Evitou investigações sérias e responsáveis. Hoje incluído na lista dos beneficiados dos recursos originados das empresas de Marcos Valério, é hora de o deputado fazer parte do desfile de depoentes da CPI destinada a esclarecer bandalheiras federais. Não convence a tentativa petista de debitar os malfeitos do partido à ação inconseqüente e isolada de um punhado de dirigentes burocratas. Malabarismos se revelarão inúteis.
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