Ler jornal não tem sido exatamente uma alegria nos últimos tempos, pelo contrário. Tudo é deprimente, a começar pelo fato de que está cada vez mais difícil distinguir o que é política e o que é polícia no noticiário. Em vez dos grandes temas que deveriam nos preocupar, como educação ou saúde, tome Zé Dirceu, Delúbio, Marcos Valério... Um elenco de quinta, em que cada personagem é pior do que o anterior, mais safado, mais cínico, mais grotesco.
Mas é preciso reconhecer que, apesar da podridão geral, pelo menos para algumas coisas boas a crise serve. A primeira, e mais evidente, é mudar o PT e, quem sabe, mudar a mentalidade petista. Confrontado com o fato inegável de que não é o dono da moral e da ética, pode ser que, daqui para a frente, o partido deixe de ser tão arrogante e autoritário.
Também é possível que, descobrindo que seus dirigentes são políticos iguaizinhos aos demais, os petistas passem a ser mais tolerantes com o pensamento alheio, e mais desconfiados em relação a si próprios. Não acredito, sinceramente, que isso venha a acontecer, embora torça para que aconteça: uma mudança assim faria bem a todo mundo.
Outro aspecto positivo da crise é revelar à nação a verdadeira natureza dos seus representantes. Zé Dirceu nunca enganou os que tinham olhos para ver — e, sobretudo, para ler. Não faltam sinais na sua biografia indicando uma pessoa nefasta. Se o resultado de todo este imbróglio for única e exclusivamente o seu afastamento do poder, já estaremos no lucro.
Mas nada como os holofotes da TV Senado em tempos interessantes para nos mostrar quem são, de fato, os políticos que achávamos que conhecíamos. Acredito que os vídeos mostrando os piores momentos de cada um servirão lindamente ao longo dos anos a seus adversários; e acho que, neste fogo cruzado, muito poucos vão se salvar.
Nas próximas eleições vamos ter repeteco de todo o festival de baixarias, de Jorge Bittar (quem diria!) espezinhando a secretária a Arthur Virgílio xingando o presidente. Afinal, uma coisa é o que se diz numa mesa de botequim ou num fórum da internet, e outra, bem diferente, é o que se diz, ou se deveria dizer, na tribuna do Senado. Por pior que seja o presidente, há um simbolismo no cargo que não pode ser desrespeitado nas altas esferas — ainda que o próprio presidente seja o primeiro a fazê-lo. Se um senador da república não se dá ao respeito e não entende este princípio básico, o que se pode esperar dele?!
Mas há mais coisas boas nisso tudo que aí está. Ao escancarar a maneira como se financiam campanhas e jogar no ventilador as cifras monumentais da corrupção, o deputado Roberto Jefferson prestou um grande serviço ao país. Que corrupção existe no Brasil desde sempre todos nós já sabíamos; o que ignorávamos é como acontecia, por quais desvãos se infiltrava, de que gavetas saía.
De repente, o país está tendo uma Aula Magna sobre o assunto, dada por um de seus principais expoentes.
Não é pouco não.
Ficamos todos mais espertos, mais atentos, mais desconfiados.
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Este poderia até ser o primeiro passo para um grande processo de moralização do país; mas, infelizmente, a crise revelou também que há um enorme vazio no governo — lá, exatamente, de onde deveria partir o principal exemplo.
Lula pode ser um sucesso na França, mas até hoje não descobriu que o papel de um presidente não é rodar o mundo numa nuvem de glória, e sim, se preciso for, pisar na lama para tirar o país do atoleiro.
Com exceção do caso da Gamecorp, que não podia ignorar por estar dentro da sua própria casa, acho que ele de fato não sabia o que estava acontecendo. Ou, por outra: sabia, mas fazendo não saber, exatamente como tanta gente faz na vida amorosa —- sem ter noção, portanto, da real extensão do estrago.
A verdade é que, enquanto a gente faz de conta que ignora, não precisa tomar providências; mas, por outro lado, fica a reboque dos fatos e refém de suposições que nem sempre refletem a realidade. Posição cômoda, mas extremamente perigosa: uma mulher fiel que desconfia que está sendo traída mas prefere não tomar conhecimento da traição corre o risco de só descobrir a verdade quando pegar Aids do marido —- e aí já é tarde.
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O que nos resta é torcer para que, com o susto, Lula ponha os pés no chão, tome uma atitude e comece a governar o país como prometeu fazer, e não como "rotineiramente" se fazia. E que todos nós, agora devidamente alertados, passemos a exigir mais clareza, mais serviço e menos lero lero daqueles que, afinal, são nossos funcionários.
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