Bancos financiaram PT e foram ajudados por fundos
Flávia Oliveira
As duas instituições financeiras que, no primeiro ano do governo Lula, emprestaram R$ 5,4 milhões ao Partido dos Trabalhadores (PT) foram contempladas com R$ 458,4 milhões em aplicações financeiras de dois dos maiores fundos de pensão de estatais federais do país. A Petros, dos funcionários da Petrobras, destinou no ano passado R$ 95,02 milhões a fundos de investimento em direitos creditórios (os FIDCs, espécie de títulos que têm como garantia pagamentos a receber por empréstimos concedidos) dos bancos BMG e Rural. Já a Fundação Real Grandeza, dos servidores de Furnas, aplicou, no mesmo período, R$ 363,4 milhões em títulos (CDBs e RDBs) e FIDCs dos mesmos bancos.
As operações, embora não sejam ilegais, sugerem favorecimento aos dois bancos por razões políticas. É o governo que escolhe os presidentes e diretores das estatais e de seus fundos de previdência complementar, bem como os membros dos conselhos deliberativo (responsável pelas decisões estratégicas) e fiscal (que aprova as contas). As fundações estão entre os mais poderosos investidores institucionais do Brasil.
A Petros, por exemplo, administra R$ 24,986 bilhões em ativos — é a segunda maior do mercado, atrás apenas da Previ, do Banco do Brasil, que soma R$ 70,332 bilhões em investimentos e é líder na América Latina.
Em 2003, PT teve os empréstimos
No escândalo do mensalão — no qual o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) acusa o PT de pagar R$ 30 mil por mês a deputados aliados para votarem projetos de interesse do governo — as investigações já comprovaram operações suspeitas entre o partido do presidente da República e os bancos Rural e BMG. Nos primeiros meses de 2003, o PT tomou empréstimos de R$ 3 milhões no Rural e de R$ 2,4 milhões no BMG. Ambos os financiamentos foram assinados por Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, e José Genoino, ex-presidente nacional do partido, e tiveram como avalista o publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza.
As aplicações dos fundos de pensão nos dois bancos constam das demonstrações financeiras da Petros e da Real Grandeza em 2004. Um ano antes, a fundação da Petrobras não tinha sequer um centavo em FIDCs — foi em 2003 que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) regulamentou a criação desses fundos. No primeiro trimestre de 2004, a Petros declarou ter em sua carteira de renda fixa R$ 5,021 milhões em FIDCs do Banco Rural. No fim do ano, as aplicações chegavam a R$ 23,808 milhões no Rural e a R$ 71,211 milhões no BMG. À Caixa Econômica Federal foram destinados apenas R$ 3,806 milhões.
BMG cresceu nos últimos anos
Outros R$ 10,653 milhões foram aplicados pela Petros num FIDC da Bancoop. Trata-se de uma cooperativa habitacional criada, em 1996, pelo Sindicato dos Bancários de São Paulo, Osasco e Região. Desde então, já lançou 55 empreendimentos, num total de quase dez mil imóveis, dos quais 5.132 já entregues. No ano passado, a Bancoop transformou parte dos pagamentos que terá a receber pelos financiamentos habitacionais num fundo de R$ 60 milhões, administrado pela corretora Planner. A Bancoop tem como presidente o sindicalista João Vaccari Neto, diretor-executivo do Sindicato dos Bancários e secretário de Relações Internacionais da CUT.
Aplicações sem sinal de fraude
Na Real Grandeza, as aplicações se dividem entre certificados e recibos de depósitos bancários (CDBs e RDBs) do Banco Rural e do BMG: ao todo, R$ 150,3 milhões e R$ 100,1 milhões, respectivamente. Além disso, a fundação aplicou R$ 113 milhões em FIDCs do BMG. As aplicações não têm qualquer sinal de irregularidade e não parecem oferecer risco às carteiras das fundações.
A própria regulamentação da CVM obriga que os FIDCs sejam submetidos à avaliação de risco antes de serem ofertadas aos investidores institucionais — eles não podem ser adquiridos por pessoas físicas. O principal atrativo desses fundos é a rentabilidade superior à dos títulos públicos federais. Um executivo do mercado estima que o rendimento desses papéis supere em 5% ao ano a variação dos Certificados de Depósito Interfinanceiro (CDI), a taxa de empréstimo entre bancos que é a base do ganho dos títulos de renda fixa. Mas outro analista chama a atenção para a preferência que as duas fundações deram para bancos médios, em detrimento de instituições de grande porte.
O Banco Rural, na sexta-feira, teve sua classificação de risco rebaixada pela agência Fitch Ratings, em razão de seu envolvimento com a crise política. Segundo nota da Fitch, "a captação e a liquidez do Rural já haviam sofrido forte pressão de novembro de 2004 a fevereiro de 2005, em função da crise de liquidez deflagrada pela intervenção do Banco Central no Banco Santos S.A". Continua a nota: "Desde então, o Rural tem intensificado a readequação de suas atividades, em função da maior suscetibilidade às oscilações da economia e a eventos".
O BMG — cujo presidente, Ricardo Annes Guimarães, ocupa o mesmo cargo no Atlético Mineiro — cresceu fortemente nos últimos anos, de carona nos financiamentos concedidos a funcionários públicos, aposentados e pensionistas com desconto em folha de pagamento. São estes créditos que vão formar os FIDCs. Na operação, a instituição transforma em títulos os pagamentos dos empréstimos que tem a receber e os vende a um investidor por um prazo determinado. Assim, o dinheiro volta rapidamente ao banco, que pode emprestá-lo novamente, realimentando as operações.
Rural e BMG: investimentos são regulares
O BMG e o Banco Rural alegaram respeito ao sigilo bancário para não se pronunciar sobre as operações com os fundos de pensão da Petrobras e de Furnas. Por meio da assessoria de imprensa, o BMG disse apenas que as aplicações "são regulares e compatíveis". Já o Rural informou que "os recursos oriundos de investidores institucionais representam apenas 13% da carteira de depósitos a prazo". O banco afirma, em nota, que "a análise da carteira, que está protegida pelo sigilo bancário, prova que não há qualquer favorecimento político" à instituição.
A Fundação Real Grandeza disse apenas que suas demonstrações financeiras são públicas. A Petros, por sua vez, negou que haja favorecimento ou concentração de investimentos nas instituições. Também por escrito, a fundação afirmou que "os FIDCs estão dentro da política de investimentos da Petros, cuja estratégia básica é diversificar a carteira de ativos, mitigando o risco e otimizando a rentabilidade".
Desde janeiro de 2004, a Petros já aprovou 11 FIDCs. Os fundos do Banco Rural e da Bancoop têm rating AA (baixo risco para longo prazo). O FIDC do BMG tem classificação AAA (também de baixo risco para longo prazo e grau de investimento). As três aplicações, informou a fundação, representam 0,46% de seu patrimônio total.
Em 30 de junho de 2005, as cotas dos dois fundos geridos pelo BMG valiam R$ 78,1 milhões; as do Rural, R$ 24,5 milhões; e as da Bancoop, R$ 11,5 milhões.
Roupa suja lavada no balanço
Desde o primeiro ano do governo petista, o Conselho Fiscal vem acumulando divergências com a administração e o Conselho Deliberativo da Petros. A situação chegou ao ápice em março deste ano, quando Paulo Teixeira Brandão usou seu voto de minerva como presidente do Conselho Fiscal para publicar o parecer desaprovando as demonstrações contábeis do fundo.
A decisão foi acompanhada pelo conselheiro Carlos Augusto Espinheira, que junto com Brandão é representante dos participantes (funcionários e beneficiários). O relatório anual da Petros traz em separado o voto de aprovação dos conselheiros Alexandre Aparecido de Barros e Rogério Gonçalves Mattos, que representam as patrocinadoras (Petrobras e subsidiárias) e, portanto, foram indicados pelo governo.
No parecer em que decide pela desaprovação dos números, o Conselho Fiscal chama a atenção para "o valor excessivo do Fundo Administrativo", de R$ 631 milhões. Os signatários alegam que a operação da Petros não exige tanto dinheiro e que parte dos recursos poderia ser usada para reduzir o déficit atuarial, de R$ 5,217 bilhões no fim de 2004.
Argumenta ainda que a administração foi ineficiente por não cobrar da Petrobras recursos devidos à Petros nem recorrer à Justiça para recompor perdas monetárias com planos econômicos.
Alega também que "mudança significativa de premissas atuariais, pelo terceiro ano consecutivo, com destaque nos dois últimos para a da tábua de mortalidade, provocou o desequilíbrio técnico da entidade". Para amparar a argumentação, Brandão encomendou uma análise à ACP Atuarial. No documento de 87 páginas, o atuário Antonio Carlos Pereira Cabral e o contador Augusto César das Chagas Pires afirmam que os dois estudos encomendados pela Petros à CLM Consultoria Atuarial e à Globalprev têm resultados contraditórios sobre a necessidade de mudança nas tábuas de mortalidade. O relatório afirma que foram adotadas metodologias que "não são apropriadas para análise de decisão quando à mudança de tábuas".
A Globalprev é a consultoria que pertence a ex-sócios e funciona numa casa que pertenceu ao ministro Luiz Gushiken, da Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica (Secom). Na semana passada, a Petros rompeu um contrato que mantinha com a consultoria. A Previ, dos funcionários do Banco do Brasil, fez o mesmo. Em junho de 2003, a Associação Nacional dos Servidores da Previdência Social (Anasps) solicitou ao então titular da pasta, ministro Ricardo Berzoini, explicações sobre a possível contratação irregular da CLM pelo ministério para elaboração de um estudo sobre a reforma do setor.
A Petros informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que sua avaliação atuarial foi assinada pela STEA - Serviços Técnicos de Estatística de Atuária, que avalia o fundo desde a sua criação. Disse ainda que, apesar da divisão no Conselho Fiscal, suas contas foram aprovadas no Conselho Deliberativo por cinco votos a dois.
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