o globo'
Tatiana Farah*
Fundador do PT, o jurista Hélio Bicudo, 83 anos, está decepcionado com seu partido e com o governo Lula. Acha que os petistas como ele, que já levantaram a bandeira da ética na política, podem ser confundidos com qualquer um que "passou a mão" no dinheiro público. Para Bicudo, "o Brasil está à deriva" e as novas composições do governo não são promissoras. O jurista integrou uma comissão de sindicância no PT, em 1997, para apurar outro escândalo, o caso Cepem, que envolveu Roberto Teixeira, empresário e compadre de Lula. O processo foi arquivado, mas o autor das denúncias, Paulo de Tarso Venceslau, acabou expulso do PT. Bicudo falou ao GLOBO antes de embarcar para Portugal de férias.
Em 2002 o senhor disse, sobre a aliança com o PL, que, para ir ao céu, Lula não precisava passar pelo inferno. É o inferno?
HÉLIO BICUDO: Não havia motivo para o PT se aliar a um partido conservador. A esquerda é incompatível com a direita. Lula poderia prescindir da aliança com o PL. E vem a história da governabilidade: "Se você não tem maioria, você não tem governabilidade". Não é verdade. A Constituição dá instrumentos, como o veto e as medidas provisórias, que garantem governabilidade. Você tem a opinião pública, que o presidente usa para pressionar o Congresso a tomar atitudes.
Mesmo com vetos, MPs, maioria no Congresso e, agora, suspeita de mensalão, o governo não aprovou as reformas. O que houve?
BICUDO: Este é o grande equívoco de perseguir um estilo de fazer política que já está ultrapassado. Quais foram os grandes projetos aprovados pelo governo Lula? A Previdência está empacada. A reforma tributária idem. Ele fez uma reforma maquiada do Judiciário, que, muito ao contrário de aperfeiçoá-lo, o distanciou mais ainda do povo.
O senhor está satisfeito com o governo?
BICUDO: Não. Eu estou frustrado em minhas expectativas do que seria um governo do PT. Eu jamais poderia imaginar o que está ocorrendo hoje no processo político.
O senhor está mais desapontado como petista do que como cidadão?
BICUDO: Sim. Porque se você defendia as bandeiras éticas do PT, você na rua é apontado como qualquer um que passou a mão no dinheiro público.
O senhor acha que eles "passaram a mão" em dinheiro?
BICUDO: Isso é uma coisa que está sendo apurada. Eu não adiantaria o meu juízo. Na opinião pública, é o que passa.
O senhor é amigo do José Genoino?
BICUDO: Sou.
O senhor acredita que ele seja inocente?
BICUDO: Nessas coisas não adianta a gente acreditar ou deixar de acreditar.
O senhor acha que seja possível Genoino assinar um documento sem ter visto?
BICUDO: O Fernando Henrique também assinou.
O senhor já tinha ouvido falar em Marcos Valério?
BICUDO: Não. Eu ouvi falar dele agora, com essas denúncias.
O senhor acha promíscua a relação de Valério com o PT?
BICUDO: Eu acho que pelo menos não é ética.
Delúbio pode ser comparado ao PC Farias?
BICUDO: Não, não. Porque, indo mais longe, você ia querer comparar Lula a Collor e isso é incomparável. Collor demonstrou que se entregou e entregou o país à corrupção. Não é o caso do presidente Lula.
Lula pode sofrer um processo de impeachment?
BICUDO: Esta é uma pergunta difícil, pois não estou nas apurações. Mas até este instante ele está sendo preservado até pelos próprios denunciantes.
As medidas que Lula tem tomado, como o afastamento de José Dirceu e o pacote anticorrupção, são eficazes?
BICUDO: O pacote é uma coisa que se fala, se fala e não se faz. Essas atuações da PF, muitas delas ilegais, não levam a nada. Uma luta contra a corrupção se faz no dia-a-dia da administração pública. Aqui no Brasil vigora a mais profunda impunidade. A impunidade é a regra.
O que aconteceu com o PT?
BICUDO: Os dirigentes do PT, em busca da governabilidade, não souberam aproveitar o instante da eleição do Lula para dar uma reviravolta no sistema de compra de voto, de compra de parlamentares, que é a tradição da política brasileira desde o tempo da República Velha.
Hoje o PT é um partido igual a qualquer outro?
BICUDO: Não. Ainda há forças no PT que buscam a realização de uma política em que a ética seja o fundamento maior. Agora, em vez de aproveitar o momento para dar uma reviravolta, mantém-se o mesmo sistema. O presidente perde o poder que ele realmente deveria ter. O governo perde a governabilidade. A atuação do governo junto ao Parlamento não leva a dizer que, hoje, estejamos sendo governados. O Brasil está à deriva.
O senhor ainda é petista?
BICUDO: Sim, e vou continuar sendo.
Qual a saída para Lula?
BICUDO: Governar com minoria.
Que nomes seriam capazes de unir o partido?
BICUDO: Tem muitas pessoas que são militantes do PT que foram e estão sendo ignoradas pelo PT. Há nomes: Antonio Candido, Marilena Chauí, Paul Singer.
O PT confundiu o que era governo e o que era partido?
BICUDO: Eu acho que, assumindo o governo, o PT quis demonstrar que, enquanto partido, seria capaz de governar o país e daí houve o... Bem, eu não diria o aparelhamento do governo. O PT, nessa ânsia de governabilidade, buscou o modo tradicional. Todos os partidos brasileiros fazem desse modo. Eu não concordo com isso.
O que mais decepciona o senhor: o PT ou o governo?
BICUDO: O governo.
Lula havia lhe prometido uma embaixada, o que não ocorreu. O senhor ficou magoado?
BICUDO: Não fiquei magoado. Não preciso disso para minha realização pessoal. Mas realmente conversamos sobre isso. Se eu tivesse feito essa promessa, eu a teria cumprido.
* Especial para O GLOBO
"Em vez de aproveitar para uma reviravolta, mantém-se o mesmo sistema. E o presidente perde o poder que realmente deveria ter"
Entrevista:O Estado inteligente
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