Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 09, 2005

AUGUSTO NUNES :O ministro grita em silêncio

no mínimo
09.07.2005 |  Luiz Gushiken não tem a idade que o ministro aparenta. Envelheceu na estrada, como atesta o bom perfil publicado em dezembro de 2004, na revista "IstoÉ", pelo jornalista Luiz Cláudio Cunha. O filho de imigrantes japoneses nascido em Oswaldo Cruz, cidade de 20 mil habitantes a quase 600 quilômetros de São Paulo, tem 55 anos. O chefe da poderosa Secom parece um sessentão. Os cabelos curtos e as barbas longas ficaram nevados antes da hora por terem percorrido caminhos sempre acidentados, às vezes penosos demais.

"Ele é um sobrevivente", diz Elizabeth, mãe de seus três filhos. É mesmo. Para chegar ao coração do poder, lembrou Luiz Cláudio Cunha, "Gushiken resistiu a dois tipos de câncer, uma septicemia, dois choques anafiláticos, um enfarte, dois acidentes de carro, duas greves nacionais de bancários, quatro prisões no DOPS e quatro campanhas presidenciais do PT (as três primeiras fracassadas)". Não é pouca coisa. E não é tudo.

Genuíno remanescente da geração de 68, foi comunista, ligou-se a uma ramificação do trotskismo chamada "Liberdade e Luta" (a intrigante Libelu), militou na movimento estudantil durante o curso de Filosofia que não terminou, ganhou notoriedade como dirigente do sindicato dos bancários e participou das grandes greves que forjaram o núcleo fundador do PT. Trocou Trótski por Lula, elegeu-se deputado e ampliou no Legislativo a fama de briguento.

A cabeça política de Gushiken sempre conviveu em harmonia com a alma inclinada ao misticismo – e igualmente inquieta. Ao ancorar no mais cobiçado endereço do Brasil, já encontrara um porto supostamente seguro na vertente religiosa denominada bahá'i, surgida em 1844 na antiga Pérsia (hoje o Irã dos aiatolás), que não tem dogmas, rituais ou sacerdotes. Mas a rota mística incluíra escalas no budismo, na seita rosacruz e no zen-budismo. Tremenda viagem.

Na última etapa da caminhada rumo ao Planalto, consumou-se a fusão do político e do místico. Então se forjou o Gushiken que a Era Lula apresentou ao Brasil. Imóvel, lembra um velho sábio chinês. Em ação, exibe o estilo dos mestres em marciais de filmes classe B: a tranqüilidade aparente camufla o lutador agressivo, prático e perigoso. Gosta do poder. E sabe exercê-lo com a serenidade sem culpas de quem já está no céu.

Nomeado ministro-chefe da Secretaria de Comunicação e Gestão Estratégica do Governo (cargo que depois acumularia com o comando do Ministério do Otimismo, que ele próprio inventou), Gushiken passou a administrar pessoalmente as verbas publicitárias penduradas nos galhos da frondosa árvore federal. Ministérios, empresas e bancos estatais, secretarias com status ministerial – nada escapa ao controle do vigilante Alto Companheiro. Ele indica a agência deve ser contratada. Ele escolhe os veículos que merecem o dinheiro dos anúncios e campanhas.

Além dos critérios óbvios, outros quesitos interferem nessas decisões. A editora de um cunhado do ministro, por exemplo, vem prosperando com publicações que, raquíticas demais para submeter tiragens às medições do IVC, são contempladas por incontáveis páginas publicitárias de órgãos do governo. Gushiken, hoje avesso a entrevistas, limita-se a murmurar que não tem nada a ver com isso.

Agora se descobriu que uma empresa de assessoria pertencente ao ministro até 2002, quando deixou a sociedade completada por dois amigos, teve a receita várias vezes multiplicada nos últimos dois anos, graças a contratos celebrados com bilionários fundos de pensão. No início da Era Lula, quando foi repartido o butim federal, Gushiken influenciou com gula e gana a indicação de diretores dos fundos. Deve ter sido por gratidão que todos encomendaram trabalhos à empresa hospedada atualmente na casa em Indaiatuba onde Gushiken morou até virar pai da pátria.

É um caso de sucesso suficientemente impressionante para ilustrar a tese do Ministério do Otimismo: o melhor do Brasil é o brasileiro, não desiste nunca. Mesmo com a saída do dono, os sócios restantes não desistiram. Estão ricos.

Gushiken se recusa a tocar no assunto. Talvez recupere a antiga loquacidade se acabar incluído no listão de convidados das CPIs.

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