Entrevista:O Estado inteligente

domingo, setembro 02, 2007

ETA PROVINCIANISMO !!!!!!!!!


Mônica Bergamo

@ - bergamo@folhasp.com.br

Rafael Andrade/Folha Imagem



O repórter Paulo Sampaio se hospeda, incógnito, no hotel Fasano do Rio, para ver como a grife-símbolo do luxo paulistano desembarcou seu "way of life" na praia de Ipanema

Champanhe na areia

"É preciso ser a Daiane dos Santos para sair dessa piscina do Philippe Starck. Dá um trabalho!", exclama um socialite, aos escorregões, na cobertura da recém-inaugurada versão carioca do hotel Fasano. A piscina é propositalmente torta, meio oblíqua em relação ao enquadramento do deck, e tem como detalhe remissivo do luxo dois grandes arcos-escultura de aço. Um deles é o corrimão da escada de azulejos, desprezada pelo socialite, que prefere usar a borda da piscina para subir .

 

Sob o céu límpido da sexta-feira, 24, dia incrivelmente ensolarado, cerca de duas dezenas de hóspedes se refestelam tomando soft drinks em espreguiçadeiras. Situado no endereço mais nobre do Brasil, a avenida Vieira Souto, em Ipanema, o hotel não possui uma fachada ostensiva. Diferentemente do Copacabana Palace, que tem 150 suítes, o Fasano conta com apenas 10 -92 quartos ao todo.
 

Em sua primeira semana de funcionamento, o Fasano está cheio de personalidades. A maioria são paulistas que foram para o festão de 50 anos do empresário Eleazar de Carvalho, comemorado no sábado, 25, com "meio PIB nacional". Circulam na pérgula Eliana Tranchesi e Donata Meirelles, da Daslu e, só de passagem, Lily Marinho e Roberto Irineu, das Organizações Globo.
 

Contratado para organizar a festa de Eleazar, o decorador paulista José Antônio de Castro Bernardes chega de SP "cansado" na sexta-feira. Desce para o restaurante para relaxar - mas não consegue mesa. Depois de duas horas bebericando no bar, ele resolve jantar fora. "Imagina isso! Mas o Rogério é um gentleman. Corretíssimo. No dia seguinte, foi atrás do Zé na praia, com uma peça de presunto cru e champanhe, para se desculpar", diz um hóspede. Foi quase assim. Segundo o decorador, Fasano o alcançou na areia com "dois garçons, uma garrafa de champanhe e taças com um refrescador. Simpático, né?". Muito.
 

O restaurante Al Mare é mesmo concorridíssimo. Reservas para o jantar estão esgotadas. Mas, como falta um espelho no quarto reservado pela Folha (no lugar há apenas uma instalação elétrica com a fiação exposta), a recepção se desdobra para compensar. E encaixa o repórter numa mesa. Um dos gerentes, gentilíssimo, propõe a mudança de quarto. No caminho, no hall do andar, mostra a cadeira Big Mamma, gorda, listrada, com seios estilizados como espaldar.
 

Três homens da manutenção sobem ao novo quarto para tentar resolver um problema na pia do banheiro, da qual nunca sai água quente. A pia é uma bandeja de louça encimada por um platô quadrado de metal, de onde a água despenca em cascata. Muito rasa, leva o hóspede a maldizer Philippe Starck toda vez que, ao tentar lavar as mãos, acaba com a camisa inteiramente respingada.
 

No dia seguinte, na piscina, dois hóspedes paulistas de Moema, que estão no Rio "para fazer um gastronômico", contam que o jantar da véspera, no restaurante de Claude Troisgros, no Jardim Botânico, "foi péssimo". "O garçom fez uma propaganda incrível de um coelho, depois voltou dizendo que não tinha coelho. Aí pedimos pato, veio frio, e o vinho, quente. O pessoal aqui no Rio é muito mal treinado, impressionante", diz Eder, 38. Pagaram caro? "Talvez para o padrão deles (cariocas). R$ 46,00 um prato. Você acha caro?".
 

Perto das 18h, no fim da tarde morna de sábado, amigos de Fasano tomam drinks na pérgula ao lado da piscina, quando alguém sai da sauna gritando: "Rogério! Vem ver isso! O banco da sauna desabou!". Fasano vai até a porta, tira os óculos. Faz um gesto de desalento. A sauna é interditada.
 

No jantar, o empresário Oskar Metsavaht, dono da grife Osklen, espera alguns amigos no bar do restaurante. Explica que Rogério Fasano fez pelo Rio o mesmo que ele, Oskar, fez por SP. "Eu ensinei o (faz aspas com os dedos) "way of life" dos cariocas para os paulistas, e o Rogério trouxe o estilo sofisticado de SP para Ipanema, que hoje, internacionalmente, é o "new luxury". Para a cidade, é AF/ DF (antes do Fasano e depois)." Oskar diz que, quando Mick Jagger veio ao Brasil, não havia "um lugar decente para levá-lo". Agora, DF, já tem.
 

Rogério Fasano entra pelo salão do restaurante apressadamente, faz um gesto qualquer para um garçom e se ocupa com o celular. Ele já detectou a presença da reportagem e se oferece para falar. Conta que procurou fazer um hotel que tivesse a ver com o "espírito despojado" dos cariocas e com os anos 50 e 60, "a época áurea do Rio". Diz que vai ter show no bar do hotel mais tarde.
 

O bar se chama Londra (Londres em italiano), é decorado com sofás pretos, cortinas nas paredes e capas de LPs clássicos de rock e pop, como "Thick as a Brick", do grupo Jethro Tull, e Yes, David Bowie, Madonna, Rod Stewart. Quem recebe, na porta, é Clarice, uma negra de 1,83m, voz macia e sorriso encantador. Ela informa que o cantor Michael Franti "é um californiano ativista político que canta descalço e que vai na linha do Jack Johnson [surfista havaiano que canta baixinho]".
 

No salão cheio, os despojados tomam champanhe enquanto o ativista descalço canta "Shalom, shalom, konichiawa, move to the rythm, don't panic. I say yé, yé, yé", com um turbante na cabeça, jeans, camisa preta, os antebraços inteiramente tatuados de fora. Franti conta histórias que tocam os corações dos jet-setters, como sua conversa na favela com uma "menininha de 4 anos que levou um tiro aqui ó" (ele levanta o pé, mostra a canela). Pede para todo mundo levantar as mãos, bater palmas e cantar pela paz na Terra. "Tell me that somebody stops the war, baby...tell me lies. I say yé, yé, yé." Todo mundo canta: "Yé, yé, yé...", levantando os braços com cuidado para não entornar a Veuve Clicquot da taça. O paulista Marcelo Loureiro, 40, que promove o festival beneficente "Power to the Peaceful", do qual o californiano descalço é a estrela, conta suas peripécias com o cantor no Complexo do Alemão. "O Franti entrou na favela como um Zé Ninguém, descalço, e saiu ovacionado", diz Loureiro. Ele é amigo de infância de Luciano Huck. Diz que se orgulha de preferir a companhia de Júnior, do grupo AfroReggae, à de "Álvaro Garnero e Rico Mansur na "Caras'". "Meu, ou a elite acorda, ou não vai ter futuro no Brasil. Ou eu tento, ou vou morar na Califórnia", diz.
 

Entre os milionários do fundão da sala, rola um déficit de atenção: eles viram as costas e começam a conversar. Na frente, onde estão Luciano Huck e Angélica, um time pede silêncio. "Shshshshs!". No fim, Angélica diz que gostou muito: "E olha que eu não tenho gostado de muita coisa ultimamente!".
 

Último dia, check out: "O sr. nos desculpe qualquer transtorno, espero que nos dê o prazer de muitas outras visitas", repetem os rapazes da recepção. Os sofisticados que pagaram de R$ 945 a R$ 5.250 a diária ouvem as desculpas meio entediados, respondendo qualquer coisa, obviamente prontos para voltar sempre.

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