Se continuar, pânico nas finanças afetaria "economia real", ao contrário das crises dos 90, avalia economista |
"QUANDO SE leva a história em consideração, não há como não ficar muito apreensivo com a atual falta de consciência e de preocupação com o risco", dizia Alan Greenspan na segunda-feira que precedeu a "síndrome da China". Na terça, o mundo do dinheiro acordou para o risco, talvez de maneira irracional e exagerada, mas nem por isso menos perigosa.
"Não acho que a Bolsa chinesa tenha gerado a turbulência. Nem que houve mudança nos fundamentos da economia mundial. Houve mudança de humor, sem causa precisa. O mundo navegava um mar tranqüilo demais, sem grandes riscos aparentes, em que diminuía gradativamente a volatilidade dos preços na maioria dos mercados de ativos", avalia Joel Bogdanski, consultor de análise econômica do Itaú.
A temeridade dos mercados provocou a montagem de "enormes posições de "carry trade" [tomar empréstimo a juro baixo e em moeda mais estável para aplicar em ativos de risco], levando a alavancagem de diversos agentes à beira dos limites da sanidade financeira".
"De repente, o humor vira por qualquer motivo. Pode ser o aumento do juro no Japão, problemas nas companhias de "subprime mortgage" [empresas de crédito imobiliário para clientes de risco nos EUA], a contabilidade ruim das grandes empresas de mortgage [de títulos imobiliários] Fannie Mae e Freddie Mac, a possível desaceleração mais forte dos EUA. Qualquer coisa vale, mas nenhuma realmente importa."
Mais importante, diz o economista, foi a variação dos preços de ativos financeiros, o que fez com que os índices técnicos de exposição a risco explodissem. A maior exposição a risco induz investidores a modificarem suas aplicações (vendendo e comprando ativos), o que leva a nova rodada de volatilidade (variação excessiva de preços), mais exposição a risco e novas alterações nos investimentos -e assim por diante.
"Já vimos esse filme em maio de 2006. Para cobrir perdas em mercados pouco líqüidos, zeram-se posições em mercados líquidos, o que provoca desastres em todos os lados. Pode até parecer irracional e estúpido, mas é assim mesmo que acontece", diz Bogdanski. "Nos momentos de pânico, "quem sair antes perde menos" é o lema que prevalece."
A especulação saiu do controle, dado o excesso de liqüidez e de confiança nos mercados?
Bogdanski acha que não há informações confiáveis para avaliar se há bolha nas operações de "hedge funds" e de "private equity". Mas considera que "o "carry trade" está tão entronizado nos mercados que a reversão dessas operações poderá levar muito tempo. Demorou anos para montar; não dá para desmontar em dias. Pode levar muitas semanas. Como também é possível que o pânico cesse muito antes".
O que mudou em relação às crises de 1997 a 2001? "Agora há turbulência em meio à calmaria de fundamentos. Em 1997, o Sudeste Asiático, que tinha "investment grade", quebrou, gerando crise. Em 2000 furou a bolha das pontocom, gerando crise. Em 2001, a economia americana afundou, gerando crise. A alteração dos fundamentos levava a turbulências. Hoje, é o contrário: as turbulências é que podem resultar na alteração dos fundamentos".