Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, março 21, 2007

Sem soluções à vista para os apagões aéreos


Editorial
Valor Econômico
21/3/2007

Não é a primeira vez que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva determina a apuração "imediata e rigorosa" de problemas que tornaram torturantes as viagens de avião no país, nem será a última. Há pelo menos seis meses panes sucessivas tiram do ar centenas de vôos e atrasam centenas de outros, sem que providências tenham sido tomadas e as falhas, corrigidas. Não se conhece um diagnóstico claro dos apagões aéreos, nem há um planejamento racional de ações para resolvê-los. O caos virou quase uma rotina.

A solução para a crise aérea pode demorar ainda mais, pois há várias denúncias de corrupção pousando no Tribunal de Contas da União que envolvem a Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária (Infraero). O apagão aéreo já se politizou no mau sentido da palavra. Busca-se menos uma saída para uma grave crise do que ganhar pontos desgastando adversários. A oposição, capitaneada pelos tucanos e pelo PFL, tenta criar uma CPI para o tema, após ter recolhido o número de assinaturas suficientes com a ajuda da própria base governista, desarticulada como sempre. Os governistas tentam impedir a criação e o conflito fatalmente irá parar no STF, como muitos outros. Mais uma vez há muito jogo para a platéia. A oposição bloqueou investidas para se apurar o acidente no metrô paulista e nas CPIs que tiveram peso político decisivo, como a dos Sanguessugas, dos Correios e dos Bingos, mostrou-se sempre disposta a retirar-se de campo assim que as denúncias apontavam também em sua direção.

Há vários fatos relacionados à pane dos aeroportos. A infra-estrutura tornou-se inadequada dado o crescimento da demanda por serviços - uma situação comum nos portos e nas estradas. A Infraero dispôs de verbas para reformas nos principais aeroportos do país, mas o TCU, em relatório preliminar, apontou irregularidades nas obras de 8 deles - como Congonhas e Guarulhos, dois dos maiores -, segundo "O Estado de S. Paulo" (20 de março). Há as suspeitas de sempre nos casos de fraudes: pagamentos antes da conclusão dos serviços, subcontratação das mesmas empresas para vários tipos de trabalho, escolha de companhias legalmente inabilitadas, uso de material inadequado em obras e suborno de fiscais. As denúncias precisam ser apuradas com determinação e rapidez, e é possível que uma CPI não seja o melhor caminho para isso. Mas como o governo está aparentemente empenhado em que nada seja investigado, a batalha da oposição é para criá-la e dar visibilidade às investigações, o que é tática legítima, desde que seja para valer.

A corrupção em terra, porém, não é suficiente para impedir os aviões de irem ao ar. As panes no sistema Cindacta-1 de Brasília repetem-se com freqüência assustadora. As chances de novas tragédias aumentaram com as falhas do sistema de tráfego aéreo e nenhuma explicação clara e convincente para isso foi apresentada até agora. Uns dizem que o sistema foi modernizado e que tem servidores de reserva confiáveis. Os controladores de vôo dizem que nenhuma dessas afirmações é verdadeira. Corporativismo e burocracia se unem nesta hora para tentar provar que, se não existem causas, não existe o problema.

A esses até agora insondáveis mistérios da tecnologia soma-se a verdadeira explosão da demanda por transporte aéreo e o congestionamento dos principais aeroportos. A competição entre as empresas aéreas tornou acessíveis as passagens de avião, ampliou o número de usuários, mas a oferta não cresceu proporcionalmente. Até agora se sentem os efeitos da crise da Varig, cujos serviços não foram inteiramente repostos pelas empresas concorrentes. A prática do overbooking é constante e as companhias parecem ter se preparado para uma guerra de marketing pra a venda de passagens e menos - muito menos - para o atendimento aos clientes em situações de exceção. A percepção é de que os preços caíram, mas a perda de qualidade dos serviços oferecidos foi atroz.

Os prejuízos para a economia e para os clientes das empresas aéreas têm sido elevados. Se é preciso que uma CPI seja criada para que os responsáveis por um setor considerado de segurança nacional comecem a agir para atacar os apagões aéreos, que ela seja criada. Em países civilizados, bastariam seriedade, competência e dedicação.

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