Entrevista:O Estado inteligente

sábado, março 24, 2007

Roberto Pompeu de Toledo


Dois encontros,
um só sentimento

José Dirceu com Delúbio, Lula com Collor: o
amor que se esconde, o amor que se revela

Delúbio Soares compareceu, na semana passada, à festa de aniversário de José Dirceu. Não vá dizer o leitor ou a leitora que não sabe quem é. É o "nosso Delúbio", como disse uma vez o presidente Lula; aquele tesoureiro do PT dos dias de glória do dinheiro farto e fluido para os amigos inscritos no bolsa-mensalão. Mas, se o (a) leitor(a) se esqueceu, não é de estranhar. Nosso Delúbio, desde aqueles dias que abalaram a república lulista, optou pelo sumiço. Gostaria de ser invisível. Daí a surpresa de sua aparição na festa. Ele mesmo afirmava mas, ao mesmo tempo, negava que estivesse ali, de carne e osso. "Prazer, meu nome é Marcelo", dizia aos repórteres que se aproximavam, segundo noticiou a coluna de Mônica Bergamo na Folha de S.Paulo.

Dirceu convidou 2.000 pessoas para a comemoração de seus 61 anos, realizada num badalado bar de São Paulo. Se Delúbio compareceu, é porque foi convidado. Impossível imaginar que ali estivesse na qualidade de penetra, ainda mais em se tratando de pessoa que não sai assim à toa de sua toca. E, no entanto, deu-se uma coisa assombrosa: os dois mal se cumprimentaram. Delúbio, de cabelos longos e desalinhados, a barba grisalha de sempre, camisa azul com dois botões abertos, paletó de couro e lata de cerveja na mão, já era visto desde as 21h30, muito à vontade, no local. Só às 23h40, porém, segundo noticiário da Folha, ele e Dirceu trocaram um "cumprimento rápido". O relato da repórter Clarissa Oliveira, de O Estado de S. Paulo, é ainda mais intrigante. Contou ela que alguns convidados se aproximavam de Delúbio e, efusivos, bradavam: "Você por aqui, nem acredito!". A certa altura, calhou de ele ficar bem perto de Dirceu, mas... "os dois não se olharam nem se cumprimentaram". A Folha notou que assessores de Dirceu, discretamente, afastavam Delúbio, para que os dois não fossem fotografados juntos.

A situação é mais do que esquisita. Um amigo convida o outro para seu aniversário. O outro vai. E os dois mal se olham! A esquisitice aumenta quando se tem em mente a resposta de Delúbio, quando lhe perguntaram que presente trouxera para o aniversariante. "Trouxe um abraço", disse. Ora, que abraço???!!! Vai ver que... Sim, é a única conclusão razoável, levando-se em conta que Delúbio é na verdade um herói petista, ele que aceitou calado os companheiros lhe imputarem todas as culpas. A única conclusão razoável é que houve, sim, um grande, sentido abraço – talvez na cozinha, talvez à entrada da toalete, ao abrigo dos olhares dos repórteres e de outras testemunhas. Mal se viram a sós, e estreitaram-se um ao outro, emocionados, talvez uma lágrima a rolar na face de um, o soluço a estremecer o peito do outro. A relação entre eles é de amantes clandestinos.

• • •

O novel senador Fernando Collor de Mello visitou o presidente Lula, na semana passada. Acompanhava a bancada do PTB no Senado. Lula com Collor! Eis um encontro que seria mais compreensível se, como o de Delúbio e Dirceu, se desenrolasse na clandestinidade. Não. Os fotógrafos foram convidados a registrá-lo. Os dois posaram sorridentes, sentados à mesa redonda do gabinete de Lula no Planalto, um mero 1 metro ou 2 entre um e outro, no meio deles o vice-presidente José Alencar. Fernando Collor – se o leitor ou a leitora se esqueceu também delle – é aquelle que, na memorável campanha eleitoral de 1989, pagou uma antiga namorada de Lula para aparecer na TV e não só revelar o que até então permanecia desconhecido do grande público – que Lula teve com ela uma filha – como denunciar que Lula lhe oferecera dinheiro para abortar a criança, e de quebra aproveitar a ocasião para dizer que Lula, nos tempos de namoro, se revelara um racista impenitente, a dizer continuamente que não suportava negros. Lula, até por razões pessoais, foi um dos chefes da campanha que tirou Collor da Presidência da República. A lógica fazia supor que, no dia em que viessem a se encontrar, um avançaria na goela do outro.

Não. Só amabilidades. "Encontrei uma pessoa por quem tenho respeito e admiro pelo trabalho que vem realizando", disse Collor, ao deixar o encontro. Sim: elle respeita e admira o outro! Contou que Lula o recebeu com um abraço – o abraço que, em público, Dirceu negou a Delúbio. Collor, o ilusionista de sempre, agora posa de injustiçado, como se as denúncias do irmão, os feitos de PC Farias, as extorsões, o caixa dois, a Operação Uruguai, as mentiras, tudo não passasse de uma alucinação coletiva do povo brasileiro. Lula, o neo-ilusionista, age como se o "nosso Delúbio", Marcos Valério, os "recursos não contabilizados", os dólares na cueca, as mentiras, tudo não tivesse passado de uma segunda alucinação. É triste, para Lula, mas, na verdade, não... A esta altura não é surpresa que não tenham saído sopapos no encontro com Collor. Antes, soa normal o clima de amor e concórdia. Foi como o enlace de dois corações que, enfim, assumem o sentimento que os une.

Arquivo do blog