Depois de passar quatro anos reclamando da política cambial do governo de que faz parte, o ministro do Desenvolvimento, Luiz Furlan, jogou a tolha. Reconheceu, com indisfarçada resignação, que não há o que fazer para segurar o dólar.
Mais ainda, confessou que nos últimos dois anos apostou em que as exportações derrapariam. “No entanto, os setores se adaptaram” - reconheceu.
O ministro parece ter entendido que, neste ano, o superávit comercial será provavelmente ainda mais alto do que os US$ 46,1 bilhões obtidos no ano passado. E, se fizer as contas, vai verificar que, mesmo crescendo a 27,8% por ano, as importações só vão se encontrar com as exportações (que crescem a 17,4%) dentro de seis anos - desde que essas velocidades de avanço se mantenham. Enfim, o câmbio adverso não impede o excelente desempenho das exportações nem prejudica excessivamente a indústria, já que “os setores se adaptaram”.
Furlan anunciou que três setores industriais, os que mais apanharam do dólar barato demais, vão receber reforço de blindagem para melhorar sua competitividade. São eles: indústria têxtil, de calçados e de móveis. Serão agraciados com um aumento da Tarifa Externa Comum (TEC), que hoje é de 20% (no caso dos têxteis e dos calçados) e de 18% (no dos móveis), para 35%. Ou seja, o similar importado vai ficar mais caro porque pagará adicional alfandegário.
Mas, ninguém se iluda, esse adicional é como aumentar em um palmo o muro da escola por onde escapam os gazeteiros. Não vai barrar a entrada dos produtos asiáticos, que estão chegando substancialmente mais baratos do que os similares produzidos aqui. E esse aumento da TEC não devolve as faixas de mercado externo que os asiáticos estão comendo da indústria brasileira. Lá fora é que conta; não aqui dentro.
Além disso, o aumento da TEC é uma solução ineficaz para o problema errado. O problema de fundo não é cambial; é falta de competitividade, que o câmbio desfavorável só está agravando.
Mas, afinal, como diagnosticar esse vazamento? Ele tem duas faces, uma fiscal e outra que decorre da falta de negociação comercial.
O problema fiscal, fartamente conhecido, é a impressionante propensão do governo a gastar demais. Porque gasta demais, a dívida é enorme e os juros, também. Também porque gasta demais, a carga tributária esfola o contribuinte e esvazia o investimento. Investimento fraco hoje é produção raquítica amanhã e é, também, uma infra-estrutura precária, que aumenta o custo de produção das empresas, encarece o produto, tira ferrão comercial das empresas e assim vai.
A outra face é a falta de dinamismo nas negociações comerciais do Brasil. Para exportar é preciso acesso preferencial aos mercados que realmente contam: Estados Unidos, Europa e Japão. Mas nessa área as coisas não andam. O governo Lula orgulha-se de ter boicotado a Alca, projeto de liberação comercial nas Américas. As negociações com a União Européia estão emperradas e as da Rodada Doha, também. No Mercosul, supostamente uma área de livre-comércio, todos os dias as exportações enfrentam barreiras novas.
Os setores se adaptam, ministro, mas é preciso derrubar o custo Brasil antes que o excesso de adaptação mate setor por setor.