A recente edição do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) remete a uma pergunta recorrente: é possível crescer sem reconstruir as infra-estruturas do País? Dificilmente se alcançará o crescimento sem a recuperação, a modernização e a ampliação das infra-estruturas de telecomunicações, energia, transportes e saneamento. É imperioso resgatar o papel das infra-estruturas como fator de sustentação de um novo ciclo de desenvolvimento. Estudos recentes identificam graves estrangulamentos causados por gargalos nos portos, estradas, telecomunicações, bem como por desequilíbrios na matriz energética. Nos anos 80, o enfraquecimento do processo decisório governamental, a erosão na capacidade de financiamento com recursos fiscais e a degradação da gestão pública foram as causas primordiais da crise que atingiu os diversos segmentos das infra-estruturas.
O esgotamento do processo de substituição de importações e a estabilidade monetária geraram condições de transição para uma industrialização tecnologicamente mais avançada e com níveis mais elevados de produtividade. Este novo ciclo exige a ampliação do mercado interno e maior integração internacional, portanto, um grande esforço na busca da competitividade na indústria, na agricultura e nos serviços. Todavia, as deficiências das infra-estruturas atingem duramente esta transição, ao afetar os custos da produção e o poder de competição das exportações. Duas décadas de recessão e desorganização da economia causaram: 1) a deterioração das instalações fixas; 2) o declínio na qualidade dos serviços; 3) o colapso do suporte de financiamento público; e 4) a esgarçadura da base institucional, com a perda da capacidade de planejamento governamental e de formulação de políticas de longo prazo. Tornou-se necessário, assim, redefinir o papel do Estado e implementar novos mecanismos e parcerias para financiamento.
Uma questão decorre da primeira: até que ponto as infra-estruturas são função do Estado e co-responsabilidade do mercado? Apesar da queda drástica nos montantes de investimentos para restauração e expansão das infra-estruturas, houve, em meados dos anos 90, alguns importantes avanços institucionais. Foi criado um suporte legal que favoreceu os setores de energia elétrica, telecomunicações e modais de transportes, no que se refere às concessões de serviços públicos e disciplinamento das licitações. O referencial da União foi imediatamente seguido e adaptado por muitos Estados. Com esta base legal, abriu-se caminho para a implementação das concessões de longo prazo para exploração privada dos serviços públicos.
Um grande avanço institucional, em decorrência, foi a implantação das agências reguladoras para controle e fiscalização dos contratos de concessão. Avançou-se, também, com a promulgação da Lei de Responsabilidade Fiscal, que limitou as despesas com pessoal e impediu a transferência de parcelas do contrato para serem pagas no exercício seguinte, sem disponibilidade de caixa. As mudanças culminaram com a recém-promulgada Lei das Parcerias Público-Privadas (PPPs), que favorece a retomada do desenvolvimento econômico com maior justiça social. No entanto, mesmo considerada a tendência de maior participação do setor privado nos investimentos e na operação das infra-estruturas, num país com vasta extensão territorial, os desequilíbrios interpessoais e inter-regionais da renda e as enormes carências acumuladas historicamente, será sempre importante a presença governamental. Mas é inegável que o avanço conseguido com o processo de concessões deteve, em parte, a deterioração das instalações fixas e equipamentos das infra-estruturas.
Todo esse arcabouço institucional representa, sem dúvida, uma importante base de sustentação no sentido de atrair o capital privado para empreendimentos que eram exclusivos do governo. Mas, dada a tradição brasileira de quebra de contratos e mudanças arbitrárias das regras estabelecidas, o avanço poderá ser pouco efetivo para atrair grandes volumes de capital privado para apoio ao PAC. As PPPs, por exemplo, poderão vir a ser um mecanismo para pequenos investimentos, com curtos períodos de maturação e baixo risco. Se não houver garantias e um ambiente de estabilidade nas regras da regulação, poderão ficar de fora os grandes investimentos necessários para suprir as gigantescas carências nas infra-estruturas. PPPs e concessões exigem uma firme ação reguladora por parte de organizações públicas independentes.