O Globo |
1/3/2007 |
No mesmo dia em que recebeu a notícia de que o crescimento do PIB brasileiro no ano passado ficou em 2,9%, o presidente Lula deu duas declarações que demonstram, na melhor das hipóteses, como vive em outro mundo, desconectado da realidade. Ou, para quem já tiver perdido de vez a paciência ou a esperança, as declarações podem indicar que Lula investe cada vez mais na demagogia barata, certo de que supera todos os problemas apenas "no gogó", como nos bons tempos de sindicalista. Sobre o PIB, o presidente disse que ele era maior do que os críticos previam, mas menor do que gostaria. A primeira parte do comentário presidencial é pura esperteza, pois as previsões dos analistas variavam entre 2,7% e 2,8%, o que, convenhamos, não é muito diferente do índice oficial de 2,9%. O relatório "Perspectivas Econômicas Globais de 2007", divulgado pelo Banco Mundial (Bird), por exemplo, previa que o Brasil cresceria 2,8% em 2006. No mesmo dia, Lula falou em Pernambuco sobre a violência, com aquela visão paralisante que predomina no seu governo. Segundo ele, "o mal já está feito", não há solução a curto prazo, e voltou a culpar as políticas econômicas de governos anteriores ao seu. Essa culpabilização da sociedade, da qual ele se exclui como se ainda não tivesse chegado ao poder para aplicar as políticas públicas corretas, faz com que todo o governo trabalhe sem a necessária visão imediata para enfrentar o problema da segurança, ao mesmo tempo que não há qualquer projeto de longo prazo em curso, a não ser políticas assistencialistas que mascaram os verdadeiros problemas. Mas essa análise presidencial embute outra questão mais grave: ele terminou seu primeiro mandato com resultados econômicos comparáveis aos dos antecessores, igualmente sofríveis. Com o agravante de que a situação econômica mundial estava, até a crise das bolsa de Xangai, no melhor dos mundos. No período do primeiro mandato de Lula, o PIB brasileiro cresceu 2,65% ao ano em média, enquanto a economia da América Latina cresceu, no mesmo período, a uma média de 4% ao ano, e o crescimento mundial foi de 4,8% ao ano. Mesmo que, com objetivos puramente eleitoreiros, o presidente Lula recuse comparações com outros países, dizendo que o país tem que se comparar consigo mesmo, ele sabe que, num mundo globalizado, é impossível não se comparar, pois a competição internacional é intensa. Além do mais, por enquanto, a comparação com seus antecessores não traz vantagens a Lula em termos de crescimento econômico, que é, no final, o objetivo de qualquer política econômica. A crise na bolsa de Xangai, assim como serviu para o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, chamar a atenção para a volatilidade do mercado internacional, justificando a cautela do BC no processo de redução da taxa de juros, servirá também para justificar nosso pequeno crescimento. O que já era uma retórica oficial, passará a ser agora uma certeza. A economia chinesa cresce a taxas exuberantes porque esconde diversas anormalidades, sem falar na diferença entre produzir crescimento econômico saudável dentro de uma democracia, respeitando os direitos humanos, o meio ambiente e a competição do mercado. O mesmo governo que declarou a China uma "economia de mercado", vê no seu processo de crescimento econômico os defeitos que realmente tem, por ser originário de uma ditadura. Mas o fato é que estamos perdendo a corrida para a economia mundial, ficando cada vez mais defasados. Nos oito anos do governo Fernando Henrique Cardoso, o mundo cresceu 3,6%, enquanto nós crescemos 2,3%. Nos primeiros quatro anos, de 1995 a 1998, a média de crescimento foi de 2,57%, com taxas anuais de 4,22%, 2,66%, 3,27% e 0,13%. No segundo mandato, de 1999-2002, a média de crescimento foi mais baixa ainda: 2,09%, com taxas anuais de 0,79%, 4,36%, 1,31% e 1,93%. A diferença entre nós e o mundo, que estava em 1,3% quando Lula assumiu seu primeiro mandato, em 2002, aumentou ao final de seus primeiros quatro anos para 2,1%. Os números ficam piores se considerarmos que, de 1995 a 2002, o mundo passou por turbulências econômicas violentas, com as crises no México, na Ásia, na Rússia, na Argentina, a crise dos atentados aos Estados Unidos em 2001, e a perspectiva de ascensão de Lula ao poder em 2002, que levou pânico ao mercado internacional. Em comparação, os anos Lula foram talvez os melhores dos últimos tempos, em termos de estabilidade e crescimento mundiais, pelo menos até o momento. É claro que o presidente Lula tem mais quatro anos para reverter essa situação e, se conseguir, como vem prometendo, fazer o país crescer a uma média de 5% ao ano, terminará seu mandato com um crescimento médio de cerca de 3,8%, o que colocaria o país de volta ao trilho dos Bric"s. Mas não há nada que indique que essa média de crescimento será atingida. O estudo da Goldman Sachs, divulgado em 2003, diz que o Brasil precisa manter um crescimento médio de 3,6% nos próximos anos para se transformar na quinta maior economia do mundo em 2050, juntamente com Índia, China e Rússia. Nada que já não tenhamos feito: nos últimos 50 anos, o crescimento médio do Brasil foi de 5,3%, mesmo tendo caído nos últimos 20 anos para pouco mais de 2%. Por isso, em termos teóricos, o Brasil não precisa crescer a taxas chinesas para manter a expectativa de ser uma potência mundial. Mas certamente precisa crescer mais, e de maneira sustentável, coisa que não vem conseguindo nos últimos 25 anos. |
Entrevista:O Estado inteligente
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