Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, março 09, 2007

Luiz Garcia - Uma rapidinha




O Globo
9/3/2007

O que veio George Bush fazer nesta rápida excursão à América do Sul? A pauta oficial fala em conversa com o presidente Lula sobre comércio exterior e combustíveis (etanol em vez de gasolina); também comércio exterior com o Uruguai; combate ao tráfico de drogas com a Colômbia; imigração e segurança com México e Guatemala.

Tudo vapt-vupt demais para avanços importantes - e nada que não poderia ser discutido, ou já não esteja sendo, no nível das chancelarias. Mas o avião presidencial não decola à toa: a viagem rapidinha é, como todo mundo sabe, uma manobra diplomática para minar o prestígio do venezuelano Hugo Chávez no Hemisfério. Como outras atividades rapidinhas, é provável que mais valha pela expectativa do que pela realização.

Mas certamente há razão para a preocupação dos EUA. A demagogia de Chávez continua fazendo sucesso em países ignorados pela diplomacia americana. Ou seja, os que recebem menos ajuda financeira de Washington e - não sei se a expressão já foi usada no contexto das relações diplomáticas, mas parece adequada - menos cafunés da Casa Branca. (A palavra significa, literalmente, "o ato de coçar levemente a cabeça de alguém para fazê-lo adormecer". É surpreendente que não tenha sido usada até hoje para descrever políticas de países ricos em relação aos seus primos pobres.)

Batendo perfil contra perfil, não é fácil escolher um namorado ideal entre Bush e Chávez. Exceto, claro, para o Itamaraty, na sua estratégia atual, marcada por uma rígida postura ideológica caduca, coisa de Terceiro Mundo. Ou seja, do tempo da Guerra Fria, quando homens da estatura de um Nehru buscaram, com bravo empenho e escasso sucesso, abrir um caminho independente em relação aos Estados Unidos e a hoje falecida e pouco pranteada União Soviética.

Seria recomendável, para quem considera a opção entre Bush e Chávez uma espécie de escolha de Sofia, pensar a longo prazo. Homens públicos, inevitavelmente, e em muitos e muitos casos graças a Deus, sempre saem de cena.

Hugo Chávez não tem sucessor à vista: sua força é inteiramente pessoal, aparentemente intransferível - e depende exclusivamente do dinheiro do petróleo venezuelano. Bush tem data marcada para sair de cena e, com ele (pelo menos por oito anos), a visão de mundo da ala direita do Partido Republicano.

Para qualquer chancelaria sul-americana que conheça um pouco de História, é absoluta irresponsabilidade definir o chavismo como desejável estratégia de curto ou longo prazo. Idem, confiar cegamente que uma administração do Partido Democrata em Washington, embora mais tranqüilizadora para o planeta, será mamão com açúcar para os interesses brasileiros.

Com tudo isso em mente, parece prudente concluir que as 24 horas de Bush pouco significam. Não merecem oba-oba nos discursos nem o infantilismo da queima de bandeiras americanas nas ruas.

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