O Estado de S. Paulo |
9/3/2007 |
De um lado, a negligência do governo George W. Bush em relação à América Latina; de outro, a diligência do governo Luiz Inácio da Silva nas homenagens a Hugo Chávez - incluindo a mais recente da inclusão ao Mercosul -, conseguiram fazer do presidente da Venezuela quase um protagonista de um espetáculo para o qual nem sequer foi convidado. Com tanta coisa para ser discutida, tantos negócios para serem tocados, a temática do meio ambiente na mesa e o desenvolvimento de projetos de alternativas energéticas em jogo, o assunto mais chamativo da passagem de Bush por cinco países da América Latina é passadista: o antiamericanismo e a escalada do populismo na região. Abstraindo-se a qualidade do ocupante do cargo, trata-se da visita do chefe da nação mais poderosa do mundo. O tema do “yankee go home”, convenhamos, há muito já deveria estar fora de qualquer debate internacional razoavelmente contemporâneo. A despeito do evidente anacronismo, Chávez assume o centro, mesmo quando sua participação se resume à patética atuação de um presidente da República que abandona seus afazeres para ir a um outro país (no caso, a Argentina) fazer performance em manifestação de protesto contra o visitante da vizinhança. O venezuelano recebe papel de destaque quando deveria ser apenas uma figura lateral de uma realidade que não comporta esse tipo de hostilidade e muito menos a aceitação do protagonismo de um projeto de ditador, governante datado, com prazo de validade, fadado a integrar o arquivo morto da História mais dia menos dia, quando as circunstâncias da normalidade se impuserem. Uma opção seria ignorar essa parte da agenda e valorizar só a outra parte, a que interessa mesmo porque remete ao futuro e diz respeito a relações que podem vir a produzir benefício aos povos. Mas a indiferença não resolve. Entre outros motivos porque tardia. Agora resta consertar o malfeito, olhando para a frente. Na estada do presidente americano no Brasil há uma clara divergência de intenções que se traduz nos discursos de parte a parte. Ao governo brasileiro interessa falar de comércio e pesquisa, e ao governo dos Estados Unidos apetece fazer política. O Brasil quer investimento e parceria. Os americanos também, mas numa dimensão muito mais reduzida. A urgência de Bush é com o retoque de sua imagem. Precisa entrar na pauta do meio ambiente, solene e erroneamente desprezada por ele, agradar ao eleitorado americano de origem hispânica, mostrar interesse pelo gênero humano - principalmente a parcela onde grassa o mal-estar social - e se aproximar de governantes que não têm tempo a perder com agendas de anos ( uns 50, no mínimo) passados. É óbvio que Lula e Bush não devem tratar diretamente do tema do antiamericanismo. Os assuntos oficialmente à mesa serão os relativos à economia. Mas o pano de fundo do temor reverente, ou da reverência pura e simples, fica posto nas manifestações dos governos. Os artigos e declarações produzidos por representantes do governo americano tinham conotação política, sendo várias bastante explícitas. Isto, é claro, dá margem a reações como o pueril protesto patrocinado pelos argentinos e enseja a necessidade da negativa, ainda que formal, do governo brasileiro sobre a manutenção das relações amistosas com o venezuelano. O governo brasileiro não poderia dizer nada diferente do que está dizendo, que a recepção a George Bush não implica distância de Chávez. Melhor seria se não implicasse também a imposição da malfadada figura como ectoplasma em acontecimento cujo significado objetivo vai muito além do inexistente perigo de “chavenização” de países que têm mais a fazer em prol dos seus respectivos avanços políticos, sociais e econômicos. Tropicalismo Determinados exageros nas demonstrações de repúdio à presença do presidente dos Estados Unidos, agora, remetem a exacerbações produzidas quando da visita de Bill Clinton ao Brasil, em 1997, quando não havia muito contra o que protestar. Antes de Clinton chegar, a chama do antiimperialismo foi mantida acesa por dias a fio com uma discussão sobre os alegados excessos na segurança do presidente dos Estados Unidos. Na ocasião, de sambista na quadra da escola a deputado na tribuna do Congresso, todo mundo deu palpite. A revolta era tão generalizada com a segurança (tida como afronta à soberania nacional), que algumas autoridades chegaram a se declarar ofendidas com a exigência de passarem pelo controle eletrônico de metais no Itamaraty. O xis Segundo a expectativa dos governadores que tinham alguma expectativa, a reunião de terça-feira com o presidente Lula foi boa porque “sinalizou” disposição do governo federal de colaborar com o desafogo financeiro dos Estados. Mas, sobre o essencial, quem resumiu a questão numa frase foi o governador de São Paulo, José Serra: “É preciso ver se haverá passos concretos”. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, março 09, 2007
Dora Kramer - Negligência e diligência
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