Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, março 07, 2007

Celso Ming - Virada de jogo




O Estado de S. Paulo
7/3/2007

Depois de cinco dias sob o domínio do medo, os aplicadores tiraram ontem a cabeça da toca e voltaram a beliscar o risco.

A principal observação que se pode fazer desta semana de turbulência é a de que o investidor convencional ainda não sabe como operar num ambiente de farta liquidez mundial.

É crescente a certeza de que os bancos centrais estão combatendo a inflação errada. Continuam aferrados às medições que levam em conta o consumo básico das famílias. Mas o cestão de varejo não inclui alocações cada vez mais importantes, especialmente a compra de ativos que as famílias de classe média estão fazendo, ou diretamente ou por meio de fundos de pensão.

Os preços desses ativos estão subindo mais do que os artigos de varejo. Como estão fora dos cálculos convencionais, os bancos centrais vão despejando dinheiro nos mercados por meio da política de juros, porque os índices de preços seguem aparentando controle da inflação.

Há uma nítida desproporção entre essa fartura e a disponibilidade de ativos seguros para investir. A enorme procura é a principal razão pela qual os títulos do Tesouro dos Estados Unidos, os mais seguros, vêm pagando uma remuneração achatada, de não mais do que 4,5% a 5,0% ao ano. O retorno fraco nesse segmento confiável (triple A) empurra os aplicadores para o risco.

Essa é a principal razão pela qual se formam bolhas nas áreas de commodities, imóveis e certas bolsas de valores. Nessas condições, logo chega o momento em que o aplicador se dá conta de que está exposto demais ao risco e corre para a porta de saída.

A probabilidade de que ocorra um tranco sério na economia mundial parece baixa. Ontem, o ex-presidente do Fed, o eterno grilo falante Alan Greenspan, entendeu que devia avisar que, pelos cálculos dele, a probabilidade de que esteja em curso uma recessão na economia americana é de apenas 33%. Isso sugere que não há razões para contar como certo o temido pouso forçado (hard landing) da economia mundial.

Também não há razão para temer queda no crescimento da China. O primeiro-ministro Wen Jiabao anunciou que a meta de avanço do PIB para este ano foi rebaixada para 8%. Todos os anos autoridades chinesas têm-se comprometido com desacelerações desse tipo, mas elas não se confirmam. E, mesmo que consigam o objetivo, um crescimento de 8% seria, ainda assim, uma enormidade. Ninguém espere por queda nas encomendas ao resto do mundo e encolhimento do sistema produtivo em conseqüência dessa eventual redução.

Esses dias de aversão ao risco provocaram três movimentos benéficos: (1) desmontaram operações de financiamento (carry trade) feitas a juros baixíssimos na Ásia e, nessas condições, eliminaram focos de instabilidade; (2) parecem ter servido de ocasião para reforçar os controles na Bolsa de Xangai; e (3), em certa medida, devolveram aos aplicadores a noção do risco.

Não se pode dar como certo o fim das turbulências. Os investidores continuam sem traquejo para operar em ambiente de farta liquidez. Os mercados terão de conviver com alta volatilidade.

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