Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, março 14, 2007

Celso Ming - A bolha mete medo




O Estado de S. Paulo
14/3/2007

Os mercados tiveram ontem mais um dia daqueles. A Bolsa de Nova York arriou quase 2%, uma enormidade para os padrões de lá.

O espantalho da hora é o segmento subprime do mercado hipotecário americano, faixa de crédito imobiliário destinada a mutuários com duvidosa ficha cadastral. É um crédito de risco, mais caro e propenso ao calote. São ativos de mais de US$ 1 trilhão.

Há alguns anos vem tomando corpo a tal bolha imobiliária. O crédito farto de 2002 até agora provocou uma onda de construções e de alta dos imóveis. Os mais valorizados serviram de garantia para novos empréstimos hipotecários, muitos deles canalizados para o consumo.

Desde dezembro pipocam no mercado americano dificuldades financeiras de companhias hipotecárias que enfrentam inadimplência com clientes incapazes de honrar suas prestações mensais. Nesta semana, a New Century Financial Corporation, a segunda maior companhia de crédito hipotecário à faixa subprime nos Estados Unidos, reconheceu que não consegue honrar seus compromissos junto à rede bancária. A Accredited Home Lenders anunciou que está renegociando seu passivo.

A questão de fundo já foi analisada nesta coluna. É a enorme liquidez que persiste nos mercados financeiros globais. Nos últimos cinco anos, os bancos centrais dos países ricos bombaram dinheiro vivo nos mercados porque tiveram pouca inflação a combater. Ela ficou baixa por duas razões. Primeira, pelo efeito China, que empurrou para o consumo mercadorias cada vez mais baratas. E, segunda, pelo largo uso de Tecnologia da Informação, que derrubou mundo afora os custos de produção. Assim, a inflação rastejante pediu juros baixos (dinheiro à vontade).

Enfim, há mais dinheiro do que ativos seguros em que aplicá-lo. Os bancos centrais dos países emergentes passaram a juntar reservas e a aplicar as sobras do seu mercado de câmbio em títulos dos Tesouro dos países ricos. Só a China tem mais de US$ 1 trilhão, enquanto a dívida líquida dos Estados Unidos é de US$ 4,4 trilhões. Ou seja, passaram a faltar ativos de grande segurança (triple A) para a vasta demanda. Esta é a principal razão pela qual os juros de longo prazo estão se arrastando ao redor dos 4,5% ao ano enquanto a inflação americana está acima dos 2,0% ao ano.

A baixa oferta de ativos de primeira linha e o baixo retorno propiciado vai atirando os investidores ao risco, onde se multiplicam as surpresas, como as que agora surgem na área dos subprime.

Há quem fareje ajustes telúricos da economia mundial, com derrubada das cotações do dólar (em relação às outras moedas e ao ouro), das bolsas e tal. O problema é que não há para onde ir. Queda do dólar significaria abandono das posições em dólares. Mas, se o capital financeiro sair do dólar, para onde irá? Paradoxalmente, à toda corrida para a segurança, é no dólar que se refugia.

Essas turbulências são recorrentes e seguirão assim. Até que os mercados se acostumem com as condições que estão aí.


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