Entrevista:O Estado inteligente

sábado, fevereiro 03, 2007

O novo centro da jogatina mundial

A nova capital do jogo

Macau, na China, já fatura mais do que Las Vegas
e se torna centro de corrupção e lavagem de dinheiro


Julia Duailibi

Jiji Press/AFP

Kim Jong-Nam: filho do ditador da Coréia do Norte é jogador assíduo


Credita-se aos chineses a invenção do primeiro jogo de azar. O keno, uma espécie de bingo surgido em 200 a.C., espalhou-se como vírus durante a unificação dos diversos grupos étnicos que acabaram formando a nação chinesa. Ao longo dos séculos, sucessivas dinastias tentaram conter à força (até com a pena de morte) a prática de jogos de azar – vista como um passatempo imoral com base nos princípios abstratos do pensador chinês Confúcio (551-479 a.C.). Proibições e liberações se alternaram até a revolução comunista, em 1949, quando o controle sobre os jogos atingiu o seu ápice. Desde que Portugal devolveu Macau à China, em 1999, após quatro séculos de domínio colonial, os chineses retomaram sua inclinação histórica ao jogo. Com uma voracidade espantosa. O território formado por uma península e duas pequenas ilhas acaba de destronar a americana Las Vegas em faturamento. Os cassinos de Macau movimentaram 7 bilhões de dólares em 2006, superando a receita de 6,6 bilhões de reais, estimada por analistas, com o jogo em Las Vegas. A manter-se o ritmo atual de crescimento, a receita com cassinos de Macau será, já em 2010, o dobro da de Las Vegas. No ano passado, 22 milhões de turistas visitaram o local – para se ter uma idéia, o Brasil, com suas praias, recebeu menos de 6 milhões.

Vários fatores explicam esse fenômeno. Por ser o único lugar da China onde cassinos estão autorizados a funcionar, Macau surfa sozinha na expansão do socialismo de mercado chinês. Mais da metade de seus apostadores é formada por endinheirados da China continental e de Hong Kong. Com o sucesso vieram problemas. Há dois anos, o governo chinês fez uma força-tarefa para prender integrantes do Partido Comunista que jogam com dinheiro de corrupção. Suspeita-se até que alguns cassinos são usados para lavar dinheiro de propina: mesas de bacará forjariam a vitória de burocratas para justificar o incremento de seus patrimônios. Um dos bancos macaenses é acusado pelos Estados Unidos de lavar dinheiro para o governo do ditador norte-coreano Kim Jong-II. Na semana passada, a mídia asiática noticiou que Kim Jong-Nam, um dos filhos do ditador e apostador assíduo, mora há três anos em Macau.

A montanha de investimentos mudou a paisagem de Macau. Como o espaço era exíguo, a solução foi aterrar 10 quilômetros quadrados de mar, ampliando o território de Macau para 28 quilômetros quadrados. Sob administração portuguesa, os cassinos da região tinham mobiliário gasto, decoração de bambu e serviam o chá como a principal bebida. Eles deram lugar a néon, plumas e shows com dançarinas em trajes mínimos – entre elas, um número crescente de brasileiras. Sete novos cassinos foram abertos em 2006. Um deles, o Sands, carrega o título de o maior do mundo. O grupo MGM abrirá um cassino, assim como Richard Branson, do Virgin Group, que investirá 3 bilhões de dólares em um complexo com a marca da sua empresa. Neste ano será inaugurado o Venetian, um investimento de 2 bilhões de dólares que, além do cassino, terá 3.000 suítes, 350 lojas e quarenta restaurantes. Tudo permeado por canais e gôndolas, imitando Veneza. Gosto duvidoso? Pode até ser, mas não dos chineses. "Estamos copiando o sucesso que tivemos em Las Vegas e trazendo para Macau", disse a paulista Victoria Fuh, 29, uma das diretoras de vendas do grupo.

O apostador chinês tem suas particularidades. A maior parte dos freqüentadores de Las Vegas prefere máquinas caça-níqueis, nas quais se gasta pouco, a jogos de cartas. Já os chineses jogam pesado: as mesas macauenses movimentam sete vezes mais. Os jogos estouraram em Macau a partir de 2002, quando terminou o monopólio de exploração de cassinos que durou quarenta anos e que pertencia ao magnata Stanley Ho, de Hong Kong. Um dos homens mais ricos do mundo, Ho ainda domina o jogo, mas sua influência tem sido diluída pelo dinheiro americano. Por enquanto, os turistas brasileiros não precisam de visto para ir a Macau, basta apresentar o passaporte. Mas o visto será exigido caso se deseje ir a outros lugares da China. É sempre bom lembrar que, apesar dos quatro séculos de colonização portuguesa, é difícil encontrar em Macau alguém fluente na língua de Camões.

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