Entrevista:O Estado inteligente

sábado, fevereiro 03, 2007

Chávez assume poder total

Poderes de ditador
para Hugo Chávez

Ditadura em Caracas acelera a inexorável marcha
de certos países vizinhos rumo à irrelevância mundial


Diogo Schelp

Fernando Llano/AFP
Manifestação de apoio a Chávez durante a votação, em praça pública, da lei que lhe deu superpoderes

VEJA TAMBÉM
Exclusivo on-line
Perguntas e Respostas: o terceiro mandato de Chávez

Ermächtigungsgesetz. Eis o significado literal, em português, desse termo alemão: "lei habilitante". Trata-se de uma autorização dada pelo Poder Legislativo para que o governante aprove leis sem a necessidade de consultar os parlamentares. Em 1933, esse mecanismo foi usado por Adolf Hitler para dar início à construção da ditadura nazista na Alemanha. Na semana passada, a Assembléia Nacional da Venezuela, reunida em praça pública em clima carnavalesco, concedeu ao presidente Hugo Chávez os benefícios da Ermächtigungsgesetz. A lei habilitante amplia a concentração de poder nas mãos de Chávez, dando-lhe total liberdade durante dezoito meses para fazer o que quiser em onze áreas do governo – desde a decisão sobre como gastar o dinheiro público até o direito de mobilizar as Forças Armadas, sob seu comando, a qualquer instante e por qualquer pretexto.

O direito de governar por decreto pode servir também de salvaguarda para o presidente no caso de uma crise econômica. Sua popularidade está intimamente ligada a uma economia aquecida, sustentada pelos lucros da exportação de petróleo. O valor do barril está em queda há meses, e, se faltar dinheiro para bancar sua política assistencialista, talvez ele precise recorrer à força para conter a insatisfação popular. De imediato, Chávez quer usar os poderes para reformar a Constituição – aquela mesma que ele escreveu sob medida para controlar todas as instituições republicanas. O objetivo principal é acrescentar o direito de ser reeleito quantas vezes quiser. A segunda modificação permitirá que ele leve adiante o plano de nacionalizar as empresas de petróleo, eletricidade e telefonia. Recém-empossado de superpoderes, Chávez marcou para o próximo 1º de maio a estatização de todas as instalações petrolíferas do Rio Orinoco. As empresas americanas, francesas, norueguesas e inglesas que atualmente operam na região terão de engolir uma participação minoritária nas refinarias.

AP

SAÚDE DE FIDEL? PERGUNTE AO CORONEL
A cena acima registra a visita que Hugo Chávez fez a Fidel Castro, na segunda-feira passada. No vídeo, Fidel parece debilitado e fala com dificuldade. Qual é o verdadeiro estado de saúde do ditador cubano? Não há uma só palavra oficial a respeito. Até os cubanos estranham que o presidente venezuelano seja o único autorizado a falar sobre a saúde do velho tirano – sempre, evidentemente, com grande otimismo.

A aprovação de poderes ditatoriais para Hugo Chávez é um novo passo na lenta e inexorável marcha de alguns de nossos vizinhos rumo à irrelevância política e econômica no cenário mundial. Na semana passada, uma multidão convocada por Rafael Correa, o presidente do Equador, invadiu o Congresso Nacional, em Quito, para obrigar os deputados a aprovar a realização de um referendo que decidirá pela reformulação ou não da Constituição. Os deputados, expulsos aos gritos de "ratos" e ameaçados de espancamento, escaparam pela porta dos fundos. O presidente equatoriano repete, assim, a estratégia de Chávez de refazer as leis para acumular poder e, paulatinamente, eliminar a oposição. Correa, cujo partido não tem nenhum deputado eleito, assumiu o governo há menos de um mês e já acusa a oposição de querer derrubá-lo e de "estar contra o povo".

O que Chávez e Correa estão fazendo, em estágios diferentes, é usar os instrumentos da democracia para destruir o princípio da separação entre os poderes – ou seja, a própria democracia. A separação dos poderes é o conceito sobre o qual se ergueu o edifício da democracia moderna. Foi formulado pela primeira vez de maneira organizada por um pensador francês, o barão de Montesquieu, em 1748. A divisão do poder do Estado em três instituições – encarregadas, respectivamente, de legislar, julgar e executar – só funciona quando cada uma delas tem independência e os mecanismos para fiscalizar as outras duas. Numa democracia, a política do Executivo precisa da aprovação do Legislativo. Por sua vez, as leis produzidas por deputados e senadores podem ser vetadas pelo presidente, dentro de certas circunstâncias. Cabe ao Judiciário avaliar se a lei é válida ou entra em conflito com a Constituição, a lei básica do Estado. Dessa forma, tenta-se impedir abusos e arbitrariedades. Essa independência entre as instituições democráticas deixou de existir na Venezuela. "Ao matar o contraditório e o equilíbrio de poderes do sistema político venezuelano, Chávez criou uma ditadura", diz o sociólogo Francisco Weffort, do Instituto de Estudos Políticos e Sociais, do Rio de Janeiro. Na Alemanha de Hitler, menos de três meses depois da aprovação da lei habilitante, todos os sindicatos, organizações da sociedade civil e partidos políticos, exceto o nazista, foram abolidos. A história é boa mestra.

Arquivo do blog