Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, fevereiro 06, 2007

Celso Ming - Pibfagia




O Estado de S. Paulo
6/2/2007

Alguns setores estão preocupados com pibfagia. Um pedaço do PIB brasileiro estaria sendo “comido” pelas importações, que empurram para o consumidor produto fabricado lá fora em vez de produto nacional que, afinal, dá emprego, salário e poder de compra.

Seguindo essa linha de raciocínio, duas coisas estariam erradas na política econômica: a preferência dada ao produto importado e o câmbio “fora do lugar”, a causa do problema. Esse raciocínio puxa outro: o forte aumento das importações tornou-se uma trava ao crescimento.

O pressuposto é o de que a excessiva valorização do real (diante do dólar) está tirando competitividade da indústria brasileira. Como, em conseqüência do câmbio valorizado, o produto importado chega a preços mais baixos do que os que a indústria brasileira pode praticar (pelo custo Brasil mais alto), segue-se que as importações ganham volume e, assim, concorrem para dar emprego e negócios não aqui, mas lá fora.

Antes, uma ressalva. Há meses o Banco Central está passando o recado de que o consumo cresce substancialmente mais do que a produção. Importações (e estoques) estão suprindo parte crescente da demanda interna. Essas afirmações têm sido respaldadas pelas Contas Nacionais (estatísticas do PIB) medidas pelo IBGE. Não constituem novidade.

Ontem, em entrevista publicada pelo jornal Valor, o ex-presidente do Banco Central Afonso Celso Pastore advertiu que a conclusão de que as importações estão passando rasteira na produção é um equívoco porque mistura o lado da demanda com o da oferta. Do ponto de vista técnico, é como, numa série de operações de empréstimo, confundir dívida com crédito.

Se o comércio exterior está contribuindo menos para a renda, é preciso ver que outros componentes da demanda (consumo do governo, consumo das famílias e investimento) estão contribuindo mais. Aumentaram os investimentos e o consumo das famílias - aponta Pastore. E isso está mostrado no gráfico, cujos números serão atualizados no dia 28, quando o IBGE divulgará os dados do PIB do quarto trimestre de 2006.

O crescimento mais forte das importações está produzindo (como sempre faz) um punhado de desvantagens. Mais importações implicam menos produção nacional, menos emprego, menos salário. Mas, como tudo na vida, também têm seu lado bom: ajudam a derrubar a inflação, apressam a queda dos juros, propiciam maior incorporação de tecnologia e aumento dos investimentos (importação de bens de capital).

Apenas um parênteses. Importações crescendo mais rapidamente do que as exportações não significa que o superávit comercial esteja indo pro ralo, como gente apressada vem sugerindo. Longe disso. As exportações dos últimos 12 meses (até janeiro) alcançaram US$ 139,2 bilhões, 49% mais altas do que as importações. Ainda que as importações sigam crescendo bem mais do que as importações (26,4% e 17,2%, respectivamente), em poucos anos os dois números se encontrarão e vão zerar o atual superávit comercial. Fecham-se os parênteses.

Do ponto de vista cambial, mais importações produzem uma conseqüência ainda mais importante: concorrem para aumentar a procura por moeda estrangeira. Não fosse esse aumento das importações, substancialmente mais dólares sobrariam no mercado e as cotações teriam caído ainda mais.

Tanto isso é verdade que, uma das providências que melhor concorreriam para estancar a valorização do real diante do dólar seria um aumento ainda mais significativo das importações. Ou seja, se o câmbio está errado - e não vamos discutir nesse mérito -, mais errado estaria se as importações não estivessem crescendo bem mais do que as exportações.

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