O que vem se passando com dolorosa freqüência em matéria de criminalidade e violência urbana no Brasil já deixou há muito tempo de ser um mero problema de segurança pública.
Trata-se de um problema de estágio civilizatório. Estamos todos regredindo à barbárie. Cada vez que um crime horrendo nos choca, nos violenta, nos martiriza, as pessoas de bem sentem vontade de matar o bandido, de também arrastar seu corpo pelas ruas, de fazê-lo em picadinhos.
As pessoas de bem são tragadas pela barbárie e regridem um pouco mais a cada dia. Em suma, não são apenas os bandidos que são bárbaros. Nós também caminhamos a passos acelerados em direção à barbárie.
É chocante, mas nem um pouco surpreendente. É o resultado esperado do persistente processo de “desconstituição” do Estado, que vem acontecendo, e não é de hoje, no Brasil, e particularmente nas megalópoles como Rio e São Paulo.
Há séculos, o que se conhece como Estado Moderno vem se constituindo a partir da extensão da soberania sobre vastos aspectos da vida das nações.
Assim, a soberania sobre o território consolida-se gradativamente a partir da presença do poder público ocupando todos os pontos do país.
Outro elemento constitutivo importante é o monopólio do uso legítimo da força, ou seja, grupos privados deixam de reprimir e oprimir sob motivações igualmente privadas e se subordinam às forças do Estado, que passa assim, a deter o monopólio do uso legítimo da violência.
Um terceiro e relevante aspecto constitutivo do Estado Moderno diz respeito à justiça, que também passa a ser exercida pelo Estado, na medida em que a lei subordina tudo e todos, e a única ordem jurídica reconhecida é aquela vinculada ao Estado. Não há mais justiça privada, mas aquela patrocinada e exercida pelos órgãos do Estado.
Muito bem. Se estes três elementos são importantes fatores constitutivos do Estado Moderno, é perfeitamente possível classificar o processo por que passa o Brasil como de “desconstituição” do Estado.
Senão, vejamos. A soberania sobre o território já foi ferida de morte, porque há vastos territórios onde o poder público não consegue penetrar. E por poder público entenda-se o agente de saúde, a ambulância, o caminhão de lixo, o carro de bombeiros, o recenseador do IBGE, o carteiro etc., não apenas a polícia.
Na maioria das vezes, estes agentes do Estado só conseguem ter acesso a certos locais depois de solicitar permissão ao “protetor” do lugar, em geral um traficante. Pois o poder público simplesmente abandonou essas áreas e marginalizou suas populações, praticamente empurrando-as para os braços do crime organizado.
Já o monopólio sobre o uso legítimo da força tem sido sistematicamente desrespeitado por ricos, classe média e pobres, indiferentemente.
Os ricos contratam seguranças particulares (mas não conseguem evitar os seqüestros), a classe média contrata seguranças para suas ruas e condomínios (porém não consegue evitar os assaltos), e agora os pobres começaram a receber a “proteção” de milícias, grupos de policiais e ex-policiais, que expulsam os traficantes de comunidades carentes e passam a extorquir a população local.
Isto tudo porque a polícia (isto é, o Estado) não protege ninguém.
Finalmente, a justiça tem sido igualmente privatizada, subtraindo soberania ao poder público. A justiça privada (dos traficantes, das elites, das milícias, da polícia) é sumária e rápida.
Espancamentos, assassinatos, ajustes de contas, tortura, “queimas de arquivo” freqüentam corriqueiramente as páginas dos jornais.
Tudo isso acontece sob as barbas do governo, à luz do dia. A reação das autoridades varia entre a resignação, a indignação hipócrita e a total indiferença.
Enquanto isto, a população que paga seus impostos em dia e dá um duro danado para criar seus filhos fica desamparada, órfã, sem uma palavra de conforto e de esperança.
Entrevista:O Estado inteligente
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