Luiz Garcia - Café, leite, açúcar |
O Globo |
17/11/2006 |
Na história política do Brasil a expressão "café-com-leite" lembra algumas décadas, no começo do século passado, de relativa tranqüilidade política e muita safadeza. Os paulistas do café e os mineiros do leite revezavam-se polidamente no poder. Era um tempo de eleições contaminadas por votos de cabresto e urnas fraudadas. O país vivia principalmente da agricultura, dominada pelos coronéis. De industrialização e políticas sociais, pouco se falava, muito menos se fazia. E o Brasil só começou a entrar no século XX depois da Revolução de 1930 e da ditadura do Estado Novo. Vai daí que para se falar hoje em dia numa volta do "café-com-leite" é preciso esquecer quase tudo que a expressão já significou: vale apenas para registrar o alto peso político dos colégios eleitorais de Minas e São Paulo, ambos nas mãos do PSDB. Se Aécio Neves fizer uma segunda administração tão bem-sucedida quanto a primeira, e se José Serra for tão bom governador como foi ministro da Saúde, é difícil imaginar um cenário que não leve à mudança de um dos dois para o Palácio Alvorada, daqui a quatro anos. A não ser, claro, que o PT opere a façanha de transformar em carruagens as abóboras malcheirosas que plantou e colheu no primeiro mandato de Lula. Do lado da oposição, o PSDB vai gerenciar uma situação que não deixa de ter algum perigo: qualquer partido com um pré-candidato bem cotado para vencer costuma ter pela frente dias mais tranqüilos do que aquele que conta com dois. A vez será de Aécio, porque estará terminando o segundo mandato de governador? Ou de Serra, por ser o mais velho? Claro que isso não passa de especulação obviamente prematura; essa é a sina das especulações em geral. Mesmo assim, já interessa ao cidadão fluminense saber como o novo governo do seu estado, entregue ao peemedebista Sérgio Cabral Filho, vai gerenciar suas relações políticas e administrativas com São Paulo e Minas. Numa nova versão, purificada e positiva, a política do café-com-leite pode perfeitamente transformar-se em, digamos, café-com-leite-e-açúcar. Minas, São Paulo e Estado do Rio (como a gente o chamava em velhos tempos) têm óbvias razões para trocarem figurinhas em áreas como política fiscal e segurança pública. (Os três mosqueteiros, a propósito, deverão ser quatro - como eram os de Alexandre Dumas - com a inclusão do peemedebista reeleito Paulo Hartung, do Espírito Santo, mais um caso de boa gestão premiada nas urnas. Hartung pode ensinar ao colega fluminense como administrar boas relações com o PSDB. Ele entende disso.) Por tudo que tem dito e anunciado até agora, Sérgio parece ter a intenção de comandar um governo que represente o oposto do que foi o desastre administrativo produzido pelo estilo Garotinho de manusear o poder. Essa disposição, se confirmada com nitidez desde os primeiros momentos, poderá bastar para que a nova administração seja levada a sério pelos vizinhos importantes. E também pelo pessoal de casa, profundamente interessado e preocupado. Pelo menos, num começo de conversa. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, novembro 17, 2006
Luiz Garcia - Café, leite, açúcar
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