Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, novembro 09, 2006

Clóvis Rossi - De vassouras e fracassos



Folha de S. Paulo
9/11/2006

No fim de 1980, a Folha escalou-me para ser correspondente em Buenos Aires. O câmbio local era igual ao de hoje no Brasil: moeda supervalorizada, dólar baratíssimo, a rigor a única coisa barata na Argentina.
Fomos comprar trivialidades para completar a casa. Vassoura, por exemplo. Compramos no supermercado da esquina, não em uma Daslu qualquer da vida. Olhei a etiqueta: "Made in USA". Pensei: país que importa vassoura está condenado ao fracasso. Acertei, não por inteligente, mas pelo óbvio.
Lembrei-me da vassoura de Buenos Aires ao ler a análise do Iedi (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial) sobre o mau resultado da indústria no mês de setembro.
Diz: "A excessiva valorização do câmbio, que já vinha afetando fortemente e de forma inequívoca setores como têxtil, vestuário, calçados e madeira, estaria agora atingindo também outros segmentos, retraindo ainda mais profundamente a taxa de crescimento global da indústria. Se, de fato, a queda de 4,5% da produção de bens de consumo duráveis (em relação ao mês anterior, descontados os efeitos sazonais) estiver relacionada ao esmorecimento das exportações apurado em setembro e à concorrência das importações incentivadas pelo valor da moeda nacional, maiores cuidados na política cambial tornar-se-ão agora absolutamente urgentes".
O que não entendo é como o óbvio demora tanto para entrar na pauta, em especial na das autoridades. É evidente que a manutenção de uma moeda sobrevalorizada afeta a produção local.
Podemos não estar importando vassouras, porque somos sempre menos exuberantes do que os argentinos (no fracasso como no sucesso). Mas podemos estar importando um "suave fracasso", para usar expressão do embaixador Rubens Ricupero.

Arquivo do blog