O GLOBO
Ontem foi mais um dia da grande tormenta: dia de ouvir o duelo aguardado entre os dois protagonistas da mais estarrecedora novela política que o país já viu. O deputado José Dirceu usou a palavra certa: tragédia. Mas ele usa um reducionismo. Acha que a tragédia se abateu sobre o Partido dos Trabalhadores. Foi sobre o país. O mercado segue outra lógica e achou que ontem era dia de comemorar. Temia que o deputado José Dirceu fosse afundar atirando. Quando entendeu que isso não aconteceria, o dólar caiu e a bolsa subiu.
O mercado tem a seguinte interpretação dos fatos: enquanto o presidente e o ministro da Fazenda não forem atingidos, estará preservada a política econômica. Sendo assim, é hora de comemorar o bom momento mundial. O mundo cresce puxado pela China e os juros estão baixos na maioria dos países — com aquela extravagante exceção que todos os leitores conhecem. Neste momento, o capital não vê os óbvios perigos que assombram os outros mortais. Calcula, inclusive, que a crise está perto do fim. Pessoas de visão normal não enxergam ainda luz no fim da tormenta.
O presidente, que o mercado acha preservado, continua errando diariamente. Curioso é que ele foi aquele mesmo presidente que um dia fez a insensata declaração de que não cometeria erros, como se divino fosse. Ontem, soltou mais uma farpa contra a imprensa. Na segunda-feira, fez parte de uma patética visita aos taxistas de Brasília. Em seguida fez pior: recebeu um grupo do "Sindicato" dos Aposentados e a eles entregou algumas das explicações que deve ao país. Afirmou que não há nada que o atinja, disse que Delúbio afundou o partido e outras considerações que deveriam constar da conversa sincera que o presidente ainda deve ao país como um todo. Os atos do presidente não seguem lógica alguma: por que se negar a uma entrevista decente, ou a um pronunciamento franco e conversar apenas com os aposentados que foram ao seu gabinete? A comunicação do presidente da República é um barco à deriva.
O deputado José Dirceu, na sua fala inicial — nem humilde, nem arrogante, mas no tom adequado — passou algumas informações nas entrelinhas. Ainda que tenha dito nada saber sobre o que se passou no PT e ele mesmo classificar os fatos como "tragédia", disse que Delúbio era vítima de campanha. Ora, ou bem ele é autor da tragédia que vitima o partido ao qual o deputado dedicou 25 anos de sua vida, ou ele é uma vítima de campanha. Faltou dizer quem comandava a suposta campanha.
Em determinado momento, disse: "Considero isso uma cassação política." Podia-se entender disso que ele já se considera cassado? Em outro, lembrou que era deputado licenciado, portanto não pode ter quebrado o decoro, indicando que brigará também no Supremo por seu mandato. Seu pior argumento desde o começo dessa briga é tentar transformar um caso escabroso de corrupção em um processo político. "Por que estou sendo julgado? Pelo que represento na História do país, na esquerda, no PT e na campanha do presidente." Isso é balela. Ele é inteligente demais para se abrigar nessa casamata toda furada. Seu melhor argumento em defesa é sua vida pública, sua história, as diferenças entre a sua biografia e a do seu principal algoz. Roberto Jefferson aproveitou as câmeras para mais um show. Não falava para o Congresso, não falava para os seus pares, não falava nem para o depoente. Olhava para as câmeras, fazia todo os gestos teatrais de sempre e usou, de novo, o truque de liberar mais uma denúncia da sua lista inesgotável.
Para o mercado financeiro, o que houve ontem foi o começo do fim da crise:
— O mercado entendeu como a saída do último bode da sala. Depois disso, não há mais nada muito importante para acontecer, por isso acho que nesta quarta-feira o mercado vai estar ainda melhor — disse Nathan Blanche, diretor da Tendências.
O economista José Márcio Camargo, também da Tendências, acha que a economia tem agüentado a crise por estar com excelentes fundamentos, construídos ao longo das últimas décadas:
— As privatizações e a abertura explicam grande parte do sucesso atual. Sem privatização, a Vale não estaria exportando hoje US$ 8 bilhões. Com a abertura, o agribusiness pode importar máquinas que aumentaram a produtividade. Hoje o setor produz um saldo comercial positivo de US$ 27 bilhões. Se não fosse a crise política, estaríamos numa conjuntura muito melhor, com queda maior de risco- país — avaliou.
O Brasil vive realidades paralelas e, diariamente, quem está na fronteira dos dois mundos reconhece essa divisão irreconciliável. Na economia, ontem John Snow, do lado do ministro Palocci, era só elogios ao Brasil e à política econômica; o dólar caía, a bolsa subia e as análises do mercado eram de alívio. Enquanto isso, na cena política se via mais um dia da grande tormenta que se abateu sobre o país por desastrados atos cometidos por integrantes do governo Lula e dirigentes do Partido dos Trabalhadores. Certos juízes de José Dirceu que estavam ontem na Comissão de Ética têm passado tão duvidoso que é preciso fazer um esforço para não concluir o dia desacreditando das instituições brasileiras.
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Arquivo do blog
-
▼
2005
(4606)
-
▼
agosto
(563)
- Gabeira crava um marco na crônica da crise
- Editorial de O Estado de S Paulo Pizza no PT
- BLOG 31 e 30 AGOSTO
- DORA KRAMER Inconveniência continuada
- Editorial de A Folha de S Paulo ESPETÁCULO DA PARA...
- CLÓVIS ROSSI Os crimes e os "severinos"
- FERNANDO RODRIGUES A ajuda de Severino
- Aviso de gringo PAULO RABELLO DE CASTRO
- LUÍS NASSIF Um banco latino-americano
- Zuenir Ventura Prevendo o passado
- Merval Pereira Tucanos se bicam
- Miriam Leitão :Aos mais céticos
- Lucia Hippolito :Encreca na Câmara
- Villas Boas:Fraco é o golpismo
- Os escravos morais estão inquietos Por Reinaldo Az...
- FRASE DO DIA BLOG NOBLAT
- Opinião BLOG Cesar Maia
- Afinal, o PT é bom ou não é bom para a democracia?...
- Lucia Hippolito :Enquanto isso no PT...
- O que resta a Lula Por Reinaldo Azevedo
- DORA KRAMER Um olhar estrangeiro
- CLÓVIS ROSSI Saiam já daí, indecorosos
- ELIANE CANTANHÊDE Sem escapatória
- LUÍS NASSIF Os sofismas do aumento do superávit
- Greenspan é responsável por bolha imobiliária PAUL...
- JANIO DE FREITAS Cabeças não respondem
- ESCÂNDALO DO "MENSALÃO"/ ACORDÃO OU CASTIGO?
- Miriam Leitão :Câmbio e clima
- Luiz Garcia ‘Le cafard du président’
- Arnaldo Jabor A verdade está nua berrando na rua
- Merval Pereira Corte eleitoral
- Entrevista: Marco Maciel à ZERO HORA
- Editorial de O Estado de S Paulo Para compreender ...
- VINICIUS TORRES FREIRE O fracasso dos intelectuais
- FERNANDO RODRIGUES A falsa reforma avança
- Por que não haverá crise econômica LUIZ CARLOS BRE...
- Farra de gratificações cria salários de até R$ 40 mil
- Planalto usa cargos em fundos e estatais para prem...
- Para presidente do Conselho de Ética, "tese do men...
- Lucia Hippolito :Sem desfecho à vista
- Mario Sergio Conti O indivíduo na história: José D...
- Entrevista: Rogério Buratti "Não sou o único culpado"
- Editorial de A Folha de S Paulo CORRUPÇÃO ENRAIZADA
- Editorial de A Folha de S Paulo DELAÇÃO PREMIADA
- CLÓVIS ROSSI Omissão também é crime
- ELIANECANTANHÊDE Neo-PT
- E agora? HELIO JAGUARIBE
- Recompor os sonhos CRISTOVAM BUARQUE
- FERREIRA GULLAR Ailusão do poder
- LUÍS NASSIF Uma nova realidade nascendo
- JANIO DE FREITAS A guerra dos guarda-costas
- JOSIAS DE SOUZA Super-Receitacomeça a exibir os s...
- Lula virou um "fantasma", diz Skidmore
- DORA KRAMER De vontades e possibilidades
- Editorial de O Estado de S Paulo Lavagem de dinheiro
- A telecracia brasileiraGaudêncio Torquato
- Para superar a crisepolítica Paulo Renato Souza
- Incentivo injustificado POR Mailson daNóbrega
- Lúcia Hippolito : O sagrado direito de mudar de idéia
- JOÃO UBALDO RIBEIRO : Impressões ingênuas
- ENTREVISTA - Fernando Henrique Cardoso, ex-preside...
- Mario Sergio Conti O fim furreca do PT e o fim da ...
- Entrevista: Olavo de Carvalho : ''Não há salvador ...
- Mãos Limpas também no Brasil
- Editorial do JB Trilhas incertas-fundos de pensão
- AUGUSTO NUNES :É assim o Brasil dos desvalidos
- Miriam Leitão :Subverdades
- Zuenir Ventura Assombrações de agosto
- Merval Pereira Operação abafa
- A competição das CPIs
- Editorial de O Estado de S Paulo Paciência, paciên...
- DORA KRAMER Panorama visto do palácio
- FERNANDO GABEIRA:Um elefante morto na sala
- You are no Jack Kennedy! GESNER OLIVEIRA
- FERNANDO RODRIGUES Roteiro do caos
- Editorial de A Folha de S Paulo PALOCCI E OS MERCADOS
- Diogo Mainardi O bom de blog
- Campanha eleitoral brasileira: um cancro político
- O Planalto só tem energia para cuidar do escândalo
- Buratti confirma propina na prefeitura de Palocci
- Entrevista: Peter Lindert
- Tales Alvarenga Velhinhas de Taubaté
- André Petry Nós, o vexame mundial
- Roberto Pompeu de Toledo Huummm... Uau! Chi... Eur...
- Lula e a “renúncia” de Jango Por Reinaldo Azevedo
- Sergio Bermudes O Rei fraco
- Villas-Bôas Corrêa O amargurado adeus à reeleição
- AUGUSTO NUNES : O Brasil quer ouvir a cafetina
- Zuenir Ventura
- Miriam Leitão :Tensão e melhora
- Merval Pereira Agonia pública
- DORA KRAMER Ombro a ombro
- SOCORRO, O PROFESSOR DULCI SUMIU!
- CLÓVIS ROSSI Dar posse a Lula
- ELIANE CANTANHÊDE :O passado e o futuro
- LUÍS NASSIF CPIs e quarteladas
- O sistema de metas de inflação LUIZ CARLOS MENDONÇ...
- Lucia Hippolito:Amor bandido
- A Velhinha de Taubaté é Chico Buarque Por Reinaldo...
- Política externa: megalomania e fracasso por Jeffe...
-
▼
agosto
(563)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA
Nenhum comentário:
Postar um comentário