Entrevista:O Estado inteligente

sábado, agosto 20, 2005

Editorial de A Folha de S Paulo A VEZ DE PALOCCI

 As declarações do advogado Rogério Buratti de que o ministro Antonio Palocci Filho, na época em que era prefeito de Ribeirão Preto, recebia propina de R$ 50 mil mensais da empresa de coleta de lixo Leão & Leão trouxe para o centro da crise política um personagem até aqui cuidadosamente "blindado".
Segundo Buratti, ex-assessor de Palocci e ex-diretor da empresa, as mesadas eram transferidas pela prefeitura ao ex-tesoureiro do PT Delúbio Soares. O depoente disse ainda que, quando prefeito, Palocci teria participado de uma licitação fraudulenta para beneficiar a Leão & Leão e que esquemas semelhantes existiam em outras cidades.
Obviamente Palocci não pode ser condenado sem acusações formais e direito de defesa. Até prova em contrário, é inocente. O problema, no entanto, não é simplesmente jurídico. Há em jogo implicações políticas. E, diante dos antecedentes do escândalo de corrupção, as negativas do ministro podem não ser suficientes para preservar sua credibilidade -hipótese em que a própria gestão econômica ficaria sob ameaça.
É fato que a economia brasileira, embora longe de apresentar resultados brilhantes, passa por um momento positivo, para o qual tem contribuído a conjuntura internacional especialmente favorável. E essa é uma das explicações para o fato de os mercados reagirem de maneira relativamente tranqüila à crise política. Quando o ministro da Fazenda, porém, se vê compelido a prestar muitos esclarecimentos, esse processo tende a se tornar mais sujeito a nervosismos e volatilidades.
Esta Folha tem reconhecido as conquistas, mas formulado críticas sistemáticas à política econômica, por considerá-la conformista e conservadora em demasia. Com efeito, só mesmo interesses rentistas e o rebaixamento das expectativas, em razão do desempenho medíocre do PIB nos últimos anos, podem explicar avaliações entusiasmadas acerca da atual equipe econômica.
Embora o Brasil no ano passado tenha crescido 4,9% -um número que pode parecer muito positivo diante da média de 2,4% dos últimos dez anos-, tratou-se de uma expansão claramente inferior à registrada pelos países emergentes. Além da China, da Índia e da Rússia, também Argentina, Venezuela, Uruguai, Chile e Cingapura -para citar alguns- fecharam o ano de 2004 com crescimento superior ao do Brasil.
Neste ano, a expansão continua bem aquém da verificada em economias equivalentes. Como já se comentou neste espaço, relatório anual do BIS (sigla em inglês para Bank for International Settlements, o banco central dos bancos centrais) projetava, no mês passado, que, em média, os países emergentes deverão crescer 6,3%. Para o Brasil, em contraste, a estimativa era de 3,6%.
Não há dúvida de que, diante das propostas de ruptura acenadas por setores de esquerda do PT, a decisão do governo de respeitar contratos foi preferível. Isso não significa, porém, que não fosse possível desenvolver uma política mais eficaz no estímulo ao crescimento, mais propícia à redução da concentração de renda e menos submissa à lógica financista.
Talvez o enfraquecimento do ministro da Fazenda leve a tentativas de mudança da linha econômica. Nas atuais condições políticas, no entanto, isso provavelmente geraria novas incertezas e tenderia a agravar a crise. Mesmo na eventualidade de uma troca de ministro, o mais sensato seria evitar uma drástica inversão de sinal.

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