Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 16, 2005

VEJA Dólares do PT: se a cueca falasse

"Por razões de Estado"

Foi essa a frase que o irmão de
Genoíno teria usado para pedir
a um advogado que assumisse
os dólares da cueca


Juliana Linhares, de Fortaleza, e André Rizek

J. F. Diorio/AE
OMERTÁ
Adalberto Vieira da Silva, o homem da cueca: solto depois de seis dias preso na PF, não deu nem um pio até agora


Há pelo menos um petista mentiroso nessa história. Na semana passada, o deputado estadual José Nobre Guimarães (PT-CE), irmão do ex-presidente do PT José Genoíno, veio a público para dizer que nada tinha a ver com os 100.000 dólares que a Polícia Federal encontrou escondidos sob a cueca de seu assessor, José Adalberto Vieira da Silva. Afirmou que nem mesmo sabia que o assessor havia viajado para São Paulo, onde foi preso no último dia 8, com mais 200.000 reais em uma sacola. Em sua defesa, Guimarães sugeriu que o dinheiro encontrado pela polícia se destinava a engordar um negócio particular de seu assessor. Exibiu um documento indicando que Adalberto e um outro funcionário de seu gabinete haviam recentemente aberto uma empresa de locação de carros em Fortaleza. E apresentou o tal outro funcionário: José Vicente Ferreira, que confirmou a existência do negócio e declarou que Adalberto havia lhe dito que conseguiria o dinheiro para o empreendimento com um advogado chamado Kennedy Moura. O advogado, fundador do PT no Ceará e até três meses atrás membro da executiva do partido no estado, vem a ser um velho amigo do deputado Guimarães. Foi a primeira pessoa para quem Adalberto ligou depois de ser preso. E começa aí o embate de versões entre os petistas. Moura desmentiu a versão apresentada pelo amigo Guimarães – de que teria prometido colocar dinheiro no negócio de Adalberto – e afirmou que o deputado lhe pediu que assumisse a responsabilidade pelo dinheiro encontrado pela polícia. "Ele disse que o pedido era em nome de razões de Estado" (veja entrevista).

Moura, segundo declara, foi indicado pessoalmente pelo presidente Lula para ocupar uma diretoria no Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs) em 2003. Diz que, na ocasião, preferiu aceitar o convite para ser chefe de gabinete do petista e economista Roberto Smith, indicado pelo deputado Guimarães para presidir o Banco do Nordeste. Em dezembro de 2004, Moura foi acusado de intermediar um contrato, feito sem licitação, entre a empresa Cobra Tecnologia e o Banco do Nordeste. O contrato, no valor de 130 milhões de reais, teve oito dos nove itens rejeitados pelo Tribunal de Contas da União. Moura pediu exoneração do cargo, mas, no lugar da demissão, ganhou uma promoção. Tornou-se assessor especial do Banco do Nordeste em Brasília.


Jarbas Oliveira/AE
NÃO É COMIGO
O deputado Guimarães, irmão do ex-presidente do PT José Genoíno: cueca? Que cueca?

Desde o estouro do episódio já batizado de "Cuecagate", seu principal protagonista permanece mudo. Adalberto, o assessor flagrado com a dinheirama, diz que só fala em juízo. O problema é que a Justiça entendeu que o fato de ele carregar dinheiro escondido não configura, em si, um crime. A decisão da Justiça resultou na soltura do assessor, na última quarta-feira, e num entrave para as investigações. A polícia agora tem de encontrar provas de que a origem das notas é ilícita. Só assim o inquérito poderá virar um processo judicial que possibilite que Adalberto seja denunciado e, assim, obrigado a falar em juízo. Depois de ser libertado da carceragem da PF em São Paulo, onde permaneceu por seis dias, Adalberto hospedou-se na casa de um de seus advogados, José Roberto Leal de Carvalho. Um dos mais famosos e caros criminalistas do Brasil, Leal de Carvalho defende, entre outros clientes, Paulo Maluf, ex-prefeito de São Paulo. Para poder pagar um profissional desse naipe, deve haver mais cuecas com dólares por aí.

Até o momento, investigações feitas pela Polícia Federal apontam para uma possibilidade: a de que Kennedy Moura mente quando diz não ter nenhum envolvimento com o dinheiro que o assessor do deputado Guimarães tentou embarcar para Fortaleza. O Banco do Nordeste, para o qual o advogado trabalhava, é uma instituição pública federal que atua nos estados do Nordeste, no norte de Minas Gerais e no Espírito Santo. Tem agências também em São Paulo e no Rio. Seu objetivo é apoiar iniciativas privadas que promovam o desenvolvimento regional. O Ministério Público do Ceará tem indícios de que Moura, de seu posto em Brasília, tinha o poder de comandar uma rede nacional de superintendentes do banco que liberava, a título de empréstimo, vultosas somas para empresários de diversos estados do país, em especial de São Paulo. A PF tem conhecimento de pelo menos um superintendente do Banco do Nordeste em São Paulo, supostamente ligado a Moura, que foi demitido sob acusação de fraude. O procurador Márcio Torres, responsável pelas investigações sobre o caso no Ministério Público Federal do Ceará, diz que o principal interesse do MP é saber se esses empréstimos eram mesmo concedidos. Há suspeitas de que eles poderiam ser apenas uma forma de "lavar" um dinheiro que voltaria mais tarde para as mãos de quem os teria liberado. A julgar por esse raciocínio, Adalberto teria agido como "mula" da operação.

Na quinta-feira, véspera de sua prisão, Adalberto esteve no escritório particular de José de Freitas, diretor administrativo do Grupo Cavan, da área da construção civil, em São Paulo. Freitas prestou depoimento à polícia e suas explicações sobre o motivo do encontro com Adalberto foram consideradas pouco convincentes pelos investigadores. Em entrevista a VEJA, Moura negou conhecer Freitas, mas revelou ter estado em São Paulo dois dias antes da prisão de Adalberto. Diz ter vindo visitar um escritório de advocacia. "Retornei para Brasília na mesma noite e jantei com o deputado Guimarães." A se confirmar a hipótese da polícia, sobre o envolvimento de Moura no esquema, o próximo passo da investigação será descobrir se ele agia em benefício próprio ou sob o comando de um esquema maior, ligado ao partido ao qual declara orgulhosamente pertencer há 25 anos.

 

"LULA ME INDICOU PARA O GOVERNO"

Jarbas Oliveira
CUECA JUSTA
O advogado Moura: "Guimarães pediu para que eu assumisse o dinheiro"


POR QUE ADALBERTO LIGOU PARA O SENHOR QUANDO FOI PRESO?
Porque sou advogado e porque somos muitíssimo amigos. Quando eu e minha esposa rompemos, ele serviu de cupido para a reconciliação.

QUANDO O SENHOR CONTOU AO DEPUTADO GUIMARÃES DA PRISÃO, O QUE ELE DISSE?
Perguntou: "Ele falou alguma coisa?". Respondi: "Não". Ele disse: "Graças a Deus".

VOCÊS VOLTARAM A SE FALAR?
No sábado, depois da prisão do Adalberto, Guimarães ligou e pediu que eu fosse imediatamente para São Paulo. "Agora, por razões de Estado", disse ele.

COMO FOI O ENCONTRO?
Foi no hotel Parthenon. Ele pediu que eu dissesse em público que o dinheiro era meu, "em nome de razões de Estado". Outras pessoas ouviram o pedido. Eu me neguei.

O SENHOR TEM RELAÇÕES COM O PRESIDENTE LULA?
Antes de eu ir para o banco, o presidente Lula havia articulado para eu assumir uma diretoria no Dnocs. Nós nos conhecemos há mais de 25 anos.

QUANTAS VEZES O SENHOR JÁ ESTEVE COM ELE?
Muitas, não saberia dizer o número exato.

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