Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 23, 2005

Uma máquina de gastar dinheiro chamada PT



 

Valor Econômico, sexta-feira, 22 de julho de 2005.


Parece genuína a surpresa da Executiva Nacional do PT com a auditoria interna feita no partido, que constatou uma dívida de R$ 39 milhões, aí não computados os juros nem os empréstimos que o ex-tesoureiro Delúbio Soares alega ter tomado do empresário Marcos Valério. Esse total seria apenas da dívida escriturada, sem contar o caixa 2 que Delúbio confessa ter operado. E sem contar dívidas de diretórios estaduais e municipais, estimadas extra-oficialmente em R$ 60 milhões, que podem elevar seu rombo legal para quase R$ 100 milhões. Isso é 31 vezes o que o partido devia em 2002, após a eleição presidencial. Em dezembro daquele ano, o PT tinha débitos de R$ 3,13 milhões e, destes, só R$ 950 mil eram dívidas bancárias e R$ 757,05 mil, débitos de campanha.

A dívida que a direção partidária não reconhece é a que constituiria o caixa 2 confessado pelo ex-tesoureiro. O rastreamento das contas do PT nacional e de duas das empresas de Marcos Valério levam esses números a proporções inacreditáveis. A SMP&B e a Grafitti Participações tomaram empréstimos do Banco Rural e do BMG no valor de R$ 93,41 milhões, em valores corrigidos até dezembro último. O dinheiro foi repassado ao caixa 2 do PT entre fevereiro de 2003 e abril de 2004, segundo o jornal "O Estado de S. Paulo". Somente um dos empréstimos, de R$ 12 milhões, foi quitado.

Como não é crível que um banco concentre empréstimos dessa magnitude em duas empresas, e tampouco que um partido político tenha capacidade de captação legal suficiente para ressarci-las dessas obrigações, não é razoável supor que o dinheiro foi emprestado para ser pago. De qualquer forma, a soma do caixa 1 e do caixa 2 chega à inimaginável cifra de R$ 220 milhões. A ela, acresça-se a excepcional arrecadação legal do PT. Somente no ano passado, o partido recebeu nada menos do que R$ 25 milhões do Fundo Partidário.

Delúbio, em seu depoimento à CPMI, na quarta-feira, disse que a renda legal do partido, em 2004, atingiu R$ 45 milhões. Em 2003, foi de cerca de R$ 37 milhões. Somando grosseiramente as dívidas legais e não-legais e as receitas, desde o início de 2003, e descontando o rombo que o partido tinha em dezembro do ano anterior e o empréstimo de R$ 12 milhões que foi quitado, conclui-se que o PT consumiu, desde a posse de Lula, no mínimo R$ 260 milhões. São esses números que, por enquanto, expressam a necessidade de caixa de um partido político que, até pouco tempo, tinha as campanhas mais pobres do país e tradição de militância e trabalho voluntário. Eles só podem aumentar, na medida em que são abertas outras contas bancárias de Marcos Valério.

Os escândalos envolvendo o empresário Marcos Valério e o ex-tesoureiro do partido parecem ter destampado a caixa preta da direção partidária do PT, nas mãos do chamado Campo Majoritário e, dentro dessa facção, um assunto de poucos dirigentes. As reações da Executiva recomposta após a saída dos três dirigentes mais envolvidos - aliás, os três integrantes do mesmo Campo Majoritário de José Dirceu - confirmam que houve um estreitamento das decisões de poder do partido. O caixa do PT era, efetivamente, uma caixa preta. Isso não exime, contudo, os que assumiram agora o partido com a promessa - até agora, cumprida - de tornar transparente a máquina de fazer dinheiro e campanhas políticas que se tornou o PT.

Houve omissão dos grupos alijados do poder. Alguns deles se contentaram com cargos no governo e a esperança de impor uma política setorial à esquerda do ministro Antonio Palocci, como é o caso daqueles ligados historicamente à luta pela reforma agrária. Outros se intimidaram com o uso da Comissão de Ética para expulsar dissidentes. E outros - inclusive integrantes do Campo Majoritário que hoje se horrorizam a cada número levantado - ocuparam cargos públicos e deram carta branca a um reduzido número de pessoas para tratar de dinheiro, relação do governo com aliados venais e distribuição de cargos, sem a preocupação de exercer algum controle sobre a atuação desse grupo no submundo da política.

Se hoje todos eles expressam convicção de que esse não é apenas um problema do PT, mas da política brasileira, deveriam no passado ter se desdobrado em cuidados quando o partido passou a transitar nesses becos escuros. Também houve omissão dos candidatos que receberam dinheiro em espécie, pagaram fornecedores de campanha por debaixo do pano e consideraram que estavam limpos pelo simples fato de não saberem a origem dos recursos. Ninguém é ingênuo a ponto de achar que o que se transporta em malas tem origem legal.

 

 

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