Quando um deputado que de maneira alguma pode ser considerado um campeão da moral e dos bons costumes políticos diz para os seus pares no Congresso Nacional que "todos são iguais" e ninguém se mostra capaz de contrastar o argumento, tem-se a real dimensão da crise política brasileira.
Dimensão que talvez se perca na cacofonia das investigações, no acúmulo de denúncias, depoimentos e manobras de personagens pequenos, desses que se movem nos bastidores do teatro sombrio do financiamento de campanhas. Mas quem lê os jornais e as revistas e acompanha pela TV as diferentes sessões de investigação só pode concluir que a crise é extremamente grave.
Grave porque não diz respeito apenas a casos esporádicos, mas a uma ampla rede de irregularidades e desvios que "sempre foi assim", como afirmou Jefferson, o parlamentar que confessa crimes e, não obstante, atua como uma espécie de corregedor-geral da pátria, a indicar quem fica ou sai do governo.
Grave também porque a cúpula do PT, partido que se apresentava como defensor da ética e da moralidade, desertou de seus compromissos históricos e parece empenhada apenas em demonstrar a tese de Jefferson: petistas querem estender as investigações ao governo do PSDB não em nome da moralidade pública, mas, sim, para reafirmar que todos são iguais e que tudo sempre foi assim.
Tem-se a sensação de que a situação brasileira vai chegando a um ponto semelhante ao que propiciou, na Itália, no início na década de 90, a instauração da Operação Mãos Limpas, uma devassa que levou à condenação de inúmeros políticos e funcionários por corrupção.
Diante da gravidade dos indícios, vão se tornando intoleráveis as tergiversações, as negativas ensaiadamente enfáticas de dirigentes petistas e as tentativas -condenadas ao fracasso- de preservar aqueles que já deveriam ter sido afastados.
Aparentemente hesitante e desorientado, o presidente da República, que há seis meses anunciava um ano de 2005 com "céu de brigadeiro", enfrenta dificuldades crescentes para vencer as turbulências que abalam seu governo e afetam a sua própria imagem pessoal. A reeleição que se afigurava relativamente tranqüila já é posta em questão até mesmo por colaboradores íntimos de Lula.
Se é verdade que a boa avaliação do primeiro mandatário vinha resistindo às denúncias acerca do "mensalão", tudo indica que seu prestígio político vai agora se deteriorando. A tendência é o desgaste do governo se ampliar na classe média urbana, setor com mais acesso à informação, e posteriormente se manifestar em outras camadas sociais.
Sem conseguir que o PT traduza em atos as suas investidas retóricas contra a corrupção, vivendo uma relação crítica com a direção da legenda e sem contar com a mesma rede de apoio de outros tempos, o presidente Lula depende cada vez mais do ministro da Fazenda, Antonio Palocci Filho, e da sorte que as investigações lhe reservam.
Entrevista:O Estado inteligente
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