o globo
Nas negociações para que o PMDB assumisse o compromisso de apoiar o governo neste momento de crise, um dos argumentos mais dramáticos foi apresentado pelo ex-presidente José Sarney, hoje um dos políticos mais próximos ao presidente Lula. Em uma reunião com políticos peemedebistas, Sarney externou seu temor de que, sem apoio institucional no Congresso, o presidente Lula se veja sem saída política e adira ao chamamento de parte do PT e dos "movimentos sociais" para dar uma guinada "chavista" em seu governo.
As tentações para que o presidente Lula assuma uma posição mais agressiva diante da crise política, aceitando a tese de conspiração da direita contra seu governo popular, estão se materializando à sua frente.
O tesoureiro do PT, Delúbio Soares, um dos principais acusados de montar um grande esquema de corrupção dentro do governo federal, chorou na posse do Sindicato dos Trabalhadores em Educação, logo ele, que é funcionário fantasma da Secretaria de Educação do Estado. E acenou com a ameaça de um impeachment de Lula, que estaria sendo montado por um esquema "da direita".
Tudo está armado para uma grande manifestação da esquerda latino-americano em apoio ao governo brasileiro hoje à noite, quando o presidente Lula é o convidado de honra do XII Encontro do Foro de São Paulo, que começou ontem no Parlatino, na capital paulista. O tema central do encontro será "A integração dos povos e nações da América Latina", segundo o site do PT, seu principal organizador, "em uma perspectiva progressista e de esquerda". A conferência introdutória será feita pelo assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, sob o título: "Os processos de integração na América Latina: uma visão da esquerda".
O Foro de São Paulo está comemorando 15 anos de fundação, criado por iniciativa do PT, que convocou partidos da América Latina e Caribe para debater "a nova conjuntura internacional pós-queda do Muro de Berlim e as conseqüências da implantação de políticas neoliberais pela maioria dos governos da região". Em julho de 1990, houve o primeiro encontro, que reuniu em São Paulo 48 partidos e organizações "que representavam diversas experiências e matrizes político-ideológicas de todo o continente latino-americano e Caribe". A Venezuela de Hugo Chávez e Cuba de Fidel Castro são dos principais incentivadores do Foro.
O problema é que, entre os membros do Foro de São Paulo, há partidos políticos de vários matizes da esquerda, mas há também organizações guerrilheiras como as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farcs), ou a Unidade Revolucionária Nacional Guatemalteca (UNRG), consideradas terroristas por outros países, acusadas de tráfico de drogas e outras atividades criminosas.
Na campanha de 2002, o então candidato Lula minimizou a importância do Foro de São Paulo, que hoje abriga mais de cem partidos políticos e organizações de esquerda da América Latina, tratando-o como um fórum de debates de idéias, sem poder decisório. Eleito, Lula mandou seu então futuro chefe da Casa Civil, José Dirceu, à Colômbia, onde ele deu a garantia ao presidente Uribe de que o governo eleito não teria relações institucionais com as Farcs, ao contrário do PT.
No entanto, há quem veja nas deliberações do Foro de São Paulo não simples elucubrações de partidos políticos, mas verdadeiras orientações para uma política conjunta da esquerda no continente. Nesse XII Encontro, por exemplo, segundo o site do PT, "serão realizadas oficinas de discussão, com o objetivo de permitir a contribuição dos diversos movimentos sociais ao tema central e, dessa maneira, fomentar agendas convergentes dos partidos políticos e movimentos sociais, nesta conjuntura tão especial por que passa a América Latina".
Diz o documento do Partido dos Trabalhadores que "em vários países latino-americanos ocorrem mudanças importantes promovidas por governos que foram eleitos com o protagonismo ou o apoio de partidos membros do FSP. Argentina, Brasil, Chile, Cuba, Panamá, República Dominicana, Venezuela e Uruguai têm governos nacionais que colocam em prática políticas que discutimos ao longo destes 15 anos. Em outros países, há expressivas representações da esquerda no poder local e legislativo de todos os âmbitos e, principalmente, na luta das oposições aos governos conservadores da América Latina".
Segundo o secretário internacional do PT, Paulo Ferreira "a condição política de, pela primeira vez, a esquerda governar importantes países da América Latina, deverá ser o objeto fundamental do 12 encontro do Foro". Na sua análise, o Foro de São Paulo foi muito importante para que se chegasse aos resultados atuais: "Neste período foram feitos grandes debates estratégicos, estabelecendo um projeto de qualidade propositivo para o desenvolvimento da América Latina".
O Foro de São Paulo, portanto, de entidade quase fantasma na campanha presidencial onde o "Lulinha Paz e Amor" criado por Duda Mendonça tomou lugar do operário de esquerda, voltou a ser uma entidade merecedora de todas as glórias.
Entrevista:O Estado inteligente
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