Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, julho 19, 2005

Editorial de A Folha de S Paulo Lula VERDADES E MENTIRAS

 As recentes declarações do publicitário Marcos Valério e do ex-tesoureiro petista Delúbio Soares, bem como a entrevista que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva concedeu em Paris, estão sendo recebidas por analistas e políticos de oposição como o que de fato são: peças de uma linha de defesa orquestrada com vistas a circunscrever o escândalo de corrupção envolvendo membros do governo e de seu partido a um crime eleitoral.
Segundo a versão, sem conhecimento do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, e do presidente da República, o então tesoureiro e o publicitário teriam montado um esquema de movimentação de recursos não-contabilizados -o famigerado caixa dois- para saldar dívidas e financiar a campanha do PT e de seus aliados no pleito municipal do ano passado. Valério teria levantado empréstimos na rede bancária e os recursos teriam sido distribuídos segundo indicações feitas pela cúpula do partido a Delúbio Soares.
A história já recebeu o apelido de "Operação Paraguai", por suas aparentes falsificações e por lembrar a "Operação Uruguai" -a farsa com a qual o ex-presidente Fernando Collor de Mello procurou justificar a origem de dinheiro suspeito.
Com efeito, a versão do ex-tesoureiro de que o PT trabalhou com caixa dois não foi suficiente para dissipar as dúvidas. Uma série de questões, algumas antigas e outras novas, está no ar a exigir o aprofundamento das investigações.
O que, afinal, foi oferecido ao prestativo publicitário Marcos Valério em troca de tão vultosos empréstimos? Apenas a perspectiva, como declarou o ex-tesoureiro, de que as agências de sua propriedade pudessem participar da campanha eleitoral de 2006? É possível acreditar que cardeais petistas ignorassem a operação? Qual a relação dos empréstimos com o loteamento dos Correios e do Instituto de Resseguros do Brasil (IRB)? Os fundos de pensão não teriam tido nenhum papel nesse nebuloso processo arrecadatório? Como assegurar que ao menos parte do dinheiro paralelo não se destinava ao negado esquema do "mensalão"?
Embora a história contada por Delúbio Soares e Marcos Valério apresente inconsistências e lacunas, o fato é que o PT e o próprio presidente da República confessaram um crime eleitoral ao admitir o uso de dinheiro de caixa dois em campanhas. É preciso que o partido responda pelas irregularidades cometidas.
Ao mesmo tempo, apesar de estarrecedor e patético, o comentário feito por Lula acerca da utilização de recursos não-escriturados por sua agremiação, dando conta de que "o PT fez o que é feito no Brasil sistematicamente", tem um fundo de verdade e não deveria ser ignorado.
Ou será que os demais partidos, entre os quais o PMDB, o PFL e o PSDB, poderiam resistir a um exame mais detalhado dos recursos que utilizam em suas diversas campanhas? Caso sim, seria uma excelente notícia, pois tranqüilizaria a sociedade e evitaria que a opinião pública viesse a suspeitar indevidamente que o país perdeu uma oposição "bravateira" para ganhar uma hipócrita.
Há, também, evidências de que o publicitário já atuava nos bastidores da política nacional muito antes de o PT ter conquistado o governo federal. Seria útil que os responsáveis pelos inquéritos pudessem estabelecer desde quando, com quem e como agia o "operador" mineiro. O fato de que as denúncias e as investigações digam respeito ao atual governo e ao PT não significa que outras eventuais ilicitudes levantadas no curso das apurações devam ser relevadas.

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