Coisas da Política |
Jornal do Brasil |
12/7/2005 |
O brilho da indignação no olhar contrastava poderosamente com o rosto banhado em lágrimas. A voz embargada tornava ainda mais impressionante a oratória guerreira. O traje denunciava a elegância casual de quem não tivera tempo a perder com roupas, nem cabeça para pensar em combinações refinadas. Os cabelos cuidadosamente desalinhados lembravam viúvas forçadas a simular angústias irreais. Foi essa a fantasia usada pela comissão de frente do PT escalada, em janeiro de 2002, para abrilhantar o cortejo fúnebre de Celso Daniel. Não era uma morte qualquer. Ele fora jantar em São Paulo em companhia de um suposto amigo, o ex-assessor e empresário Sérgio Gomes da Silva, vulgo "Sombra", também ligado ao PT. Ao voltar do restaurante, segundo o relato do parceiro, bandidos interceptaram o carro (blindado) e seqüestraram Celso Daniel. (Pouparam "Sombra", que sobreviveu para contar uma história muito mal contada.) Horas depois, o corpo do prefeito, assassinado a tiros, foi encontrado numa estrada de terra da Grande São Paulo. As pesquisas eleitorais da época mostravam Lula bem no retrato, mas os Altos Companheiros também sonhavam com a espetacular multiplicação da bancada no Congresso. Não seria má idéia transformar em palanque aquele caixão de primeira. O depoimento de "Sombra", que já merecia ficar sob suspeição só pelo apelido, parecia tão verossímil quanto as desculpas da turma das malas e mensalões. Mas a comissão de frente do PT não estava interessada em enxergar contradições no samba-enredo. Queria entrar logo na avenida e levantar a arquibancada no gogó. A turma toda caprichou no refrão puxado pelos companheiros José Dirceu, Aloízio Mercadante e Luiz Eduardo Greenhalgh, já designado pelo PT para acompanhar o caso como advogado do povo. O tema do enredo garantia que Celso Daniel fora assassinado por motivos políticos. Panfletos atribuídos a uma misteriosa organização ultradireitista haviam prometido a execução de dirigentes petistas. Como o governo FH reagira com indiferença às denúncias dos ameaçados, os carrascos resolveram agir. E chegara a vez de Celso Daniel. Em pouco tempo, a polícia paulista prendeu um bando de delinqüentes que admitiu a autoria do crime. O governo tucano de Geraldo Alckmin deu o caso por encerrado. Estranhamente, o PT gostou do desfecho e endossou a tese do crime comum. Ambos se esqueceram do Ministério Público, que continuou a investigar a história. Esqueceram-se também da família de Celso Daniel, que rechaçou a conclusão apressada. Logo emergiram evidências de que o crime tivera motivações políticas, sim. Só que os bandidos eram ligados ao próprio PT. Empresários da área de transportes e pelo menos um secretário municipal haviam forjado o embrião do que o Brasil vai contemplando agora, em escala extraordinariamente ampliada, com as investigações em torno do mensalão. Praticando extorsões ou desviando dinheiro público, a quadrilha infiltrada na administração de Santo André supria campanhas do PT. Desde o começo do governo Lula, Altos Companheiros que trocaram preces por imprecações improcedentes no dia do enterro do prefeito tratam de assassiná-lo novamente, impedindo que as investigações avancem. No primeiro fim de semana de julho, afundou rapidamente no pântano da corrupção federal o escabroso conteúdo de conversas telefônicas entre "Sombra", hoje o principal suspeito de mandante do assassinato, Gilberto Carvalho, secretário particular de Lula, e Greenhalgh. As gravações, feitas por solicitação do Ministério Público, pilharam o trio em tratativas destinadas a enterrar de vez a história. É o que mostrará a coluna de quinta-feira. O país não vai permitir o segundo assassinato de Celso Daniel. |
Entrevista:O Estado inteligente
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terça-feira, julho 12, 2005
Augusto Nunes - A segunda morte de Celso Daniel
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