O efeito benéfico da crise
A crise degola apaniguados e, por
ora, restabelece o triunfo do mérito
Julia Duailibi
Herminio Oliveira/ABR |
A BIOGRAFIA É O QUE CONTA O economista Marcos Lisboa, que assumiu o IRB, e o fôlder de VEJA: capacidade acima de paixões políticas |
Na semana passada, o governo Lula mandou para casa mais dois graduados servidores públicos. Luiz Eduardo Franco de Abreu e Edson Monteiro ocupavam, respectivamente, as vice-presidências de Finanças e Varejo do Banco do Brasil. Foram afastados dos cargos sob a suspeita de beneficiar o PT na concessão de um empréstimo de 20,6 milhões de reais sem exigir avalista. Até agora, excluindo-se a dança das cadeiras na Esplanada dos Ministérios, a navalha da corrupção já degolou doze funcionários de alto escalão do governo. Aninhados em cargos tão cobiçados como ministérios, todos foram indicados exclusivamente por causa de seus vínculos com partidos da base aliada do governo. Eis aí uma boa notícia, ofuscada pelos holofotes da crise: a capacidade técnica, e não a filiação partidária, foi o dado decisivo para que os novos indicados tomassem posse.
De uma maneira geral, quem está assumindo as funções dos demitidos são funcionários de carreira das próprias estatais, gente com formação técnica e um histórico de décadas de trabalho nas instituições onde agora passam a exercer posto de comando. Para o lugar dos dois executivos demitidos do Banco do Brasil, por exemplo, foram escolhidos servidores com longa ficha de serviços prestados ao banco. O novo vice-presidente de Finanças, Aldo Luiz Mendes, é doutor em economia e trabalha no banco há 25 anos. Já o economista Antônio Francisco de Lima Neto, que assumiu a vice-presidência de Varejo, tem 26 anos de casa. O presidente interino dos Correios, Janio Cezar Luiz Pohren, é servidor público há mais de vinte anos. Dos outros nove cargos de segundo e terceiro escalão que passaram por mudanças na BR Distribuidora, Eletronuclear, Eletronorte, Embratur, IRB e Furnas, oito estão nas mãos de gente das próprias estatais ou vizinhanças. A única exceção é o economista Marcos Lisboa, ex-secretário de Política Econômica. É uma exceção de respeito. Escalado para moralizar o IRB pelo ministro Antonio Palocci, da Fazenda, Lisboa é conhecido pelo currículo invejável e pela ausência de paixões partidárias. Sua função é higienizar o covil no qual Roberto Jefferson e seus apaniguados transformaram a estatal.
Num regime presidencialista de coalizão, como o brasileiro, é inimaginável que o governo, qualquer governo, consiga cumprir minimamente suas funções sem distribuir nacos de poder entre os partidos aliados. O problema está no método e na abundância. Cargos públicos com orçamentos maiores que muitos ministérios são loteados com total ausência de critérios. Basta que o ungido tenha um padrinho político poderoso. Essas vagas também são ofertadas em excesso. Existem no Brasil cerca de 25.000 cargos de confiança. Desse total, 1.000 cargos entram na barganha principal – e cinqüenta deles, como mostrou VEJA na edição passada, são disputados a unha pelos políticos, devido à generosidade de recursos com que lidam. Há quem busque apenas dividendos eleitorais. Mas há quem acredite que só vale a pena indicar um aliado para um cargo público se for para fazer caixa para o padrinho e para o partido. Se o governo continuar a faxina, trocando os compromissados apenas com suas legendas e seus caciques por técnicos competentes, a crise já terá servido para alguma coisa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário