Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, junho 17, 2008

Tango sem ritmo



EDITORIAL
O Globo
17/6/2008

Entre greves de ruralistas, bloqueio de estradas por caminhoneiros e cacerolazos da classe média, a Argentina volta a uma situação de grande fragilidade econômica e de tensão social, causadas por políticas econômicas equivocadas e pela intransigência da presidente Cristina Kirchner. Completou cem dias ontem o conflito entre o governo e os ruralistas, iniciado após a decisão das autoridades de elevar de 35% para 47% o imposto de retenção sobre a exportação de grãos, com o objetivo de arrecadar fundos e comprar dólares, mantendo o peso desvalorizado e o subsídio a programas sociais típicos do populismo peronista.

Os ruralistas suspenderam a venda e a exportação de grãos e os caminhoneiros bloquearam rodovias em protesto contra o aumento dos combustíveis. O país vive uma crise de desabastecimento de alimentos, remédios e combustíveis. O governo se mantém irredutível e sábado mandou a polícia levantar à força um bloqueio de caminhoneiros. Dezenove pessoas foram presas, o que desencadeou novas manifestações contra Cristina Kirchner. Com isso, os ruralistas decidiram iniciar sua quarta paralisação, até quarta-feira. Mesmo dia escolhido pelos Kirchner para uma manifestação em Buenos Aires dos setores peronistas aliados, em desagravo ao governo.

O conflito leva a Argentina a uma virtual paralisia de suas atividades econômicas mais tradicionais. Há uma sensação de impotência em relação à capacidade das autoridades de alcançar acordos mínimos para superar as divergências e cresce o temor de que a situação fuja ao controle. A popularidade da presidente despencou 36 pontos percentuais em quatro meses, para 20%. A de seu marido, e presidente do Partido Justicialista (peronista), caiu de 49% para 33%. Já há uma corrida ao dólar que lembra a crise de 2001/2002 - calcula-se que os argentinos tenham comprado US$8 bilhões na tentativa de se proteger contra um eventual agravamento da situação econômico-financeira.

O governo gastou US$25 bilhões em subsídios e sua política econômica estimula a inflação, cujo índice é fortemente maquiado. O resultado é a insegurança generalizada, que afugenta ainda mais os investidores e agrava os problemas de infra-estrutura, como a oferta insuficiente de energia - o país está sujeito a apagões. Surgem teorias conspiratórias, como a que acusa o ex-presidente Eduardo Duhalde de liderar um "golpe de Estado econômico" contra Cristina. Com isso, o país vizinho corre o risco de entrar novamente num perigoso ciclo autoritário, típico do peronismo.

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